Equipe de Trump mostra-se inábil para afastar suspeita de conluio

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
DE NOVA YORK

Em seu depoimento perante o Comitê de Inteligência do Senado dos EUA, o ministro da Justiça, Jeff Sessions, abusou de respostas evasivas na linha do "não me lembro" ou do "creio que não", e recusou-se a falar sobre conversas e questões envolvendo o presidente Donald Trump -consideradas pelo depoente "confidenciais".

Se alguma coisa ficou patente após o interrogatório foi a espantosa inabilidade política do presidente norte-americano e de sua equipe em lidar com um enredo que os assombra desde a campanha eleitoral e que se projetou de maneira desastrosa sobre o governo.

Trump e seus assessores parecem empenhados em transformar as investigações sobre a interferência russa no processo eleitoral numa areia movediça da qual a administração republicana não consegue se afastar.

Com boa vontade, os defensores atribuem os erros à inexperiência ou à "ingenuidade" do mandatário neófito sobre o funcionamento do jogo político-governamental. Para os opositores, o imbróglio é uma evidência do despreparo e da incapacidade de Trump para exercer a Presidência.

O fato é que a Casa Branca demorou a tomar decisões e deixou o processo se transformar numa bola de neve política. Trump hesitou em afastar Jeff Sessions do Departamento de Justiça quando se soube que ele não mencionara ao Senado dois contatos com o embaixador russo nos EUA.

Por mais lealdade que o senador republicano tivesse demonstrado desde o primeiro momento da candidatura, não foi uma boa ideia aceitar que o recém-empossado chefe do Departamento de Justiça apenas se declarasse impedido de acompanhar o caso e permanecesse no cargo -uma situação ambígua, senão esdrúxula.

Trump foi mal novamente ao decidir de sopetão, em "timing" infeliz, pelo afastamento de James Comey, diretor do FBI. Avaliou que a admissão pública de que a polícia federal americana errara na investigação dos e-mails de Hillary Clinton lhe daria uma oportunidade para se livrar de Comey com a condescendência dos democratas. Enganou-se. A demissão foi interpretada como uma possível tentativa de obstrução de Justiça.

Na sequência, o governo viu-se pressionado a nomear um procurador especial, com credibilidade suprapartidária, para acompanhar o inquérito -e demiti-lo agora, como já se especula, seria um novo escândalo.
Embora as conversas sobre um remoto processo de impeachment tenham refluído após Comey confirmar que Trump não está sob investigação, há ainda muito a esclarecer.

Que houve interferência de hackers da Rússia na campanha, é certo. Como é fato que aconteceram contatos nebulosos entre o time de Trump e representantes daquele país.

O que não se demonstrou -e nesse aspecto o governo se apega - é se houve algum tipo de conluio entre assessores do republicano e agentes do governo russo. As violações de arquivos digitais poderiam ter sido feitas, por exemplo, para fins de chantagem; ou, como alegam alguns, apenas para semear confusão. A novela não acabou. E, em se tratando de Trump, ainda pode ter lances rocambólicos e eletrizantes.

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