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27/05/2010 - 21h48

Brasil e Turquia insistem em acordo com Irã; Hillary critica atitude

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COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Os governos de Brasil e Turquia insistiram nesta quinta-feira para que as potências mundiais considerem o acordo nuclear mediado pelos dois países com o Irã. A secretária de Estado americana, Hillary Clinton, criticou pela primeira vez de forma direta o acordo, dizendo que torna o mundo mais perigoso, e que o Irã está usando o Brasil para ganhar tempo e escapar de sanções internacionais.

Ela ainda completou dizendo que Brasil e EUA têm "sérias" discordâncias quando o assunto é o Irã.

Os EUA e outras potências acusam o Irã de tentar desenvolver armas nucleares, mas Teerã afirma que o seu programa tem fins pacíficos. Em 17 de maio, Brasil e Turquia conseguiram chegar a um acordo com Teerã para a troca de combustível nuclear, acreditando que a decisão poderia acalmar a comunidade internacional.

Sergio Lima/Folhapress
O premiê da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, e o presidente Lula, em Brasília
O premiê da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, e o presidente Lula, em Brasília

O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, reuniu-se nesta quinta-feira com o primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, que visita o Brasil. Eles acusaram as potências ocidentais de estarem agravando o conflito com o Irã por sua recusa em negociar.

"Tudo o que eles queriam foi tudo o que nós fizemos, agora é preciso que as pessoas digam claramente se querem construir possibilidade de paz ou se querem construir possibilidade de conflito. A Turquia e o Brasil são pela paz", disse Lula a jornalistas durante o encontro dos dois governantes em Brasília.

"Acreditamos que é a flexibilidade, não o dogmatismo que aproxima os povos. É esse espírito que nos guiou na negociação com o Irã... e constitui uma oportunidade que não pode ser desperdiçada", disse Lula.

Para o premiê turco, o momento não é adequado para discutir sanções ao Irã. Ele acrescentou que os países que criticam o acordo mediado por ele e Lula são "invejosos".

"Os países que estão criticando são países que têm armas nucleares e isso é muito contraditório", declarou Erdogan. Segundo ele, o Irã reafirmou à Turquia que não tem planos de construir armas nucleares.

Ambos estiveram neste mês em Teerã para mediar o acordo pelo qual o Irã aceitava enviar urânio baixamente enriquecido à Turquia, para receber no prazo de um ano combustível enriquecido a 20 por cento para uso em seu reator de pesquisas médicas.

Isso supostamente eliminaria os temores ocidentais de que o Irã poderia enriquecer urânio para uso em armas nucleares, uma intenção que Teerã nega possuir.

O acordo foi recebido com ceticismo pelos EUA e seus aliados, que acusam o Irã de já ter descumprido tratos anteriores. O intercâmbio de material nuclear havia sido proposto em outubro pela ONU (Organização das Nações Unidas), mas as potências ocidentais dizem que agora as condições mudaram.

Pressionando os demais países do Conselho de Segurança da ONU a aprovarem novas sanções contra o Irã, a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, condenou em Washington a abordagem de Brasil e Irã.

"Usando" o Brasil

Enquanto isso em Washington, a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, afirmou nesta quinta-feira que os Estados Unidos e o Brasil têm "sérias discordâncias" em relação ao programa nuclear do Irã, apesar de as relações bilaterais em outros temas serem boas. Hillary disse ainda que o Irã está apenas usando o Brasil, e que atitudes como a do Brasil e da Turquia tornam o mundo mais perigoso.

Saul Loeb/AP
Para a secretária de Estado americana, Brasil e EUA têm sérias discordâncias sobre Irã
Para a secretária de Estado americana, Brasil e EUA têm sérias discordâncias sobre Irã

Essas foram as declarações mais diretas feitas até agora sobre como os EUA veem a negociação brasileira e turca com os iranianos sobre seu programa nuclear.

"Achamos que ganhar tempo para o Irã, permitir que o Irã evite a unidade internacional a respeito do seu programa nuclear, torna o mundo mais perigoso, e não menos", disse Hillary em discurso no Instituto Brookings.

"Sem dúvida, temos sérias discordâncias com a política diplomática do Brasil em relação ao Irã", disse Hillary. "Mas nossa discordância não mina nosso comprometimento de ver o Brasil como um país amigo e parceiro", completou, questionada sobre como Washington enxergava o papel do Brasil na diplomacia global. "Nós queremos uma relação com o Brasil que resista ao teste do tempo", acrescentou.

Hillary afirmou ainda que o Irã estaria apenas usando o Brasil para ganhar tempo e evitar sanções do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas).

"Nós dissemos (aos brasileiros) que não concordamos com isso, que pensamos que os iranianos estão usando o Brasil, nós achamos que é hora de ir ao Conselho de Segurança", disse Hillary, ao responder questões de jornalistas sobre a nova estratégia de segurança da administração Barack Obama, divulgada nesta quinta-feira

Hillary alegou que o acordo firmado com o Irã sob mediação do Brasil e da Turquia apenas serve para dar mais tempo para o país persa atingir suas ambições nucleares e impede a unidade da comunidade internacional em responder ao Irã. Ela continuou, dizendo que atitudes desse tipo tornam o mundo mais perigoso.

"Nós achamos que dar mais tempo ao Irã, permitir que o Irã evite a unidade internacional a respeito de seu programa nuclear torna o mundo mais --e não menos-- perigoso."

Hillary disse que a visão dos EUA --não compartilhada pelo Brasil-- é de que o Irã só vai concordar em negociar sobre seu programa nuclear após o impor sanções mais duras contra o país.

ONU

Também em visita ao Brasil, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, disse que o Irã precisa se empenhar mais para afastar as preocupações internacionais. "No coração da crise parece haver uma séria falta de confiança no Irã", disse ele.

Ban, que participa de um evento da ONU no Rio, disse a jornalistas que o Irã, embora afirme não desejar armas nucleares, "declarou que vai continuar o processo de enriquecimento" de urânio mesmo com o intercâmbio de combustível nuclear.

Os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU já concordaram com a adoção de novas sanções ao Irã, inclusive Rússia e China, que antes relutavam por causa das suas intensas relações econômicas com Teerã.

O apoio russo às sanções causou evidentes atritos entre os dois governos, e o chanceler russo, Sergei Lavrov, não escondeu sua frustração com o comportamento da República Islâmica. "Para nosso grande pesar, durante anos - não só meses - a resposta do Irã a esses esforços foi insatisfatória, para falar em termos brandos", declarou.

Lavrov disse no entanto que o acordo mediado por Brasil e Turquia seria um avanço importante, caso viesse a ser implementado. Segundo uma nota do governo russo, ele mais tarde telefonou para o seu colega iraniano, Manouchehr Mottaki, a quem prometeu uma "cooperação ativa em levar adiante o processo de negociação."

Entenda o caso

Os Estados Unidos acusam o Irã de querer desenvolver armas atômicas, algo que é negado pelos iranianos, que afirmam que seu programa nuclear tem apenas fins pacíficos.

O acordo tripartite, firmado no dia 17 de maio em Teerã com Brasil e Turquia, determina que o Irã envie 1.200 quilos de seu urânio enriquecido a 3,5%, em troca de 120 quilos de urânio enriquecido a 20% na Rússia ou França --suficiente para a produção de isótopos médicos em seus reatores e muito abaixo dos 90% necessários para uma bomba. O urânio enriquecido seria devolvido ao Irã no prazo de um ano.

A troca aconteceria na Turquia, país com proximidades com Ocidente e Irã, e sob supervisão da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) e vigilância iraniana e turca.

Com este acordo, o Irã pretendia tranquilizar a comunidade internacional sobre seu programa nuclear.

No entanto, no dia seguinte ao acordo, os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas acertaram uma série de sanções contra o país, jogando por terra os esforços realizados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o primeiro-ministro da Turquia, Recep Erdogan, para resolver a crise por meio de negociações.

Um projeto de resolução, elaborado por Estados Unidos e apoiado por França, Rússia, China e Reino Unido, prevê sérias sanções contra o Irã, que ficará proibido de investir no exterior em certas atividades delicadas, terá seus navios inspecionados em alto mar, e sofrerá embargo sobre a compra de armas pesadas.

Na ocasião, Hillary Clinton agradeceu aos esforços de Brasil e Turquia, mas destacou as diversas reservas de Washington sobre o acordo tripartite, com a intervenção direta de Lula.

Sanções

A proposta de resolução do Conselho de Segurança da ONU com sanções contra o Irã, elaborada pelos EUA, Rússia e China prevê punições a bancos e outras empresas do país, além da criação de um regime internacional de inspeções em navios suspeitos de transportar cargas relacionadas aos programas nuclear e de mísseis.

O documento de dez páginas "pede aos Estados que adotem medidas adequadas para proibir (...) a abertura de novas agências, subsidiárias ou escritórios de representação de bancos iranianos" caso haja razões para supor que tais bancos estejam vinculados a atividades de proliferação nuclear.

O esboço também aponta "a necessidade de exercer vigilância sobre transações que envolvam bancos, inclusive o Banco Central do Irã, de modo a evitar que tais transações contribuam para a proliferação de atividades nucleares sensíveis" ou para o desenvolvimento de sistemas para o lançamento de armas atômicas.

A quarta rodada de sanções ao Irã ampliaria o embargo armamentista já em vigor contra o país, incluindo novas categorias de armamentos pesados.

Vários diplomatas ocidentais do Conselho de Segurança disseram que o órgão da ONU, com 15 países, deve votar a resolução no começo de junho.

COM AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS

 

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