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Questões de Ordem: Um transbordo
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Como sempre, o ministro Celso de Mello promete um voto resumido --e se estende por centenas de quilômetros.
Na sessão de ontem, ele citou tudo e todos. De Ban Ki-moon, secretário-geral da ONU, ao professor Celso Lafer, por sua vez citando Montesquieu. De Cláudio Weber Abramo, diretor da ONG Transparência Brasil, a Santo Agostinho, identificado erroneamente como figura da "escolástica medieval" (os escritos dele pertencem à patrística, não à escolástica).
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Toda essa gente foi lembrada só para reafirmar a tese de que a corrupção corrói o Estado republicano.
A atenção do espectador já tinha sido, na mesma sessão, posta duramente à prova por Dias Toffoli, que segue um estilo inverso ao de Celso de Mello. Lê seu voto com velocidade de locutor esportivo, como se andasse em cima de brasas em suas condenações (por corrupção) e absolvições (dos crimes de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha).
No meio disso tudo, pontos importantes tremeluziram rapidamente. Celso de Mello apontou, por exemplo, a possibilidade de que sejam anuladas as decisões do Congresso sobre reforma previdenciária. Se a emenda proposta pelo governo Lula em 2003 foi aprovada por meio de votos corruptos, seria, em tese, nula a sua validade.
Verdade que muita coisa, nesse aspecto, nem foi regulamentada.
A discussão se complica porque não só a reforma tributária ficou sob suspeita, mas também tudo o que se pode presumir como decorrente do "apoio ao governo" por parte dos parlamentares condenados.
Outro ponto a notar, no voto de Celso de Mello, foi sua menção a atos de corrupção promovidos "pelo Executivo". Sugeriu, com isso, disposição para condenar José Dirceu.
O mais incerto, nas discussões desta segunda-feira, foi o caso de José Borba, do PMDB. Recebeu dinheiro, como ninguém discorda; a dúvida é se poderia ser acusado de lavagem também.
Afinal, foi ao Banco Rural para sacar os recursos enviados por Marcos Valério. Ao saber que tinha de assinar um recibo, recusou-se; foi preciso que Simone Vasconcelos pegasse um avião para Brasília, retirasse o dinheiro ela própria e o entregasse ao deputado.
Para Rosa Weber e Gilmar Mendes, não há como falar em lavagem: o corrupto recebe dinheiro das mãos da própria corruptora.
Celso de Mello acompanhou Joaquim Barbosa. No raciocínio condenatório, uma coisa é o corruptor já estar preparado, de maleta em punho, para dar o dinheiro combinado. Outra é o corruptor ser acionado especialmente, porque a engenharia da lavagem de dinheiro sofreu um acidente de percurso.
Acidente suspeito: se José Borba se recusou a assinar, comenta Celso de Mello, torna-se mais evidente ainda o seu dolo. Dois crimes, portanto. "Um transbordo", qualificou Ayres Britto. Uma coisa é fingir que não recebeu. Pior, diz ele, é colocar nas costas de outra pessoa a responsabilidade do recebimento.
Com Ayres Britto condenando José Borba, deu 5 a 5 na votação. Ficou aberta para as próximas sessões a possibilidade de alguém mudar de ideia.
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