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16/01/2011 - 11h02

Volume com críticas ao poema "No Meio do Caminho" ganha reedição

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MANUEL DA COSTA PINTO
COLUNISTA DA sãopaulo

"O sr. Carlos Drummond de Andrade é difícil. Por mais que esprema o cérebro, não sai nada. Vê uma pedra no meio do caminho -coisa que todos os dias sucede a toda gente (mormente agora, que as ruas da cidade inteira andam em conserto)- e fica repetindo a coisa feito papagaio (...). E não houve uma alma caridosa que pegasse nessa pedra e lhe esborrachasse o crânio com ela?"

Essas gentis palavras sobre "No Meio do Caminho" foram escritas por Gondin da Fonseca no "Correio da Manhã", em 1938. Fazem parte de uma coleção de desaforos que Drummond ouviu anos a fio, desde a publicação do poema na "Revista de Antropofagia", em 1928.

E não parou por aí. Mesmo quando ele já havia publicado outras pedras fundamentais da literatura brasileira, como "Sentimento do Mundo" (1940) e "A Rosa do Povo" (1945), o poema continuava a incomodar, recebendo elogios tímidos e interpretações perplexas.

Por pirraça ou vingança, um Drummond já consagrado reuniu esses comentários, em 1967, na antologia "Uma Pedra no Meio do Caminho - Biografia de um Poema", que acaba de ganhar reedição pelo Instituto Moreira Salles, na esteira da versão fac-similar de "Alguma Poesia" (por sinal, o livro em que está incluído "No Meio do Caminho").

Se no original não faltavam textos de genuína compreensão do poema (como os de Mário de Andrade e Paulo Mendes Campos), o volume inclui uma fortuna crítica posterior, com análises de Antonio Candido, Mario Quintana e José Guilherme Merquior.

"No Meio do Caminho" chocou seus primeiros leitores pelo solecismo da frase "tinha uma pedra" (em lugar da forma culta "havia uma pedra") e por projetar a sensação de esgotamento mental numa antirretórica que encontra seu correlato num objeto elementar, genuína pedra no sapato do beletrismo pré-modernista.

Acostumados que estamos com a dicção de Drummond, que associa o singelo ao cósmico, cabe-nos hoje redescobrir suas complexidades. Pois, se o título remete ao primeiro verso da "Divina Comédia" ("No meio do caminho de nossa vida"), o poema se desdobra em outras criações de Drummond, como "A Máquina do Mundo", que também remete a Dante (com sua estrutura em tercetos) e no qual as "pupilas gastas na inspeção" do viandante da estrada mineira ecoam as "retinas tão fatigadas" do poema da pedra, a contemplação dramática de nosso destino mineral.

LIVRO
UMA PEDRA
NO MEIO DO CAMINHO - BIOGRAFIA DE UM POEMA **
AUTOR: Carlos Drummond de Andrade
ORGANIZAÇÃO:
Eucanaã Ferraz
EDITORA: Instituto Moreira Salles (344 págs., R$ 50)

FILME

SOUL KITCHEN *
Fatih Akin (Imovision, locação)
Um filho de imigrante grego e dono de restaurante mequetrefe se associa a um chef sofisticado, desgosta a tosca clientela, é abandonado pela namorada (que migra para Xangai) e traído pelo irmão (que perde a birosca na jogatina). Ambientado em Hamburgo, o filme é uma divertida fábula de resistência à globalização.

LIVRO

O GOVERNO DE SI E DOS OUTROS **
Michel Foucault; tradução de Eduardo Brandão (WMF Martins Fontes, 380 págs., R$ 68)
Na transcrição de um de seus últimos cursos no Collège de France, Foucault analisa o conceito grego de "parresía" ("dizer tudo", "falar com franqueza"), como virtude, dever e técnica. Como sempre na obra do filósofo, a genealogia de uma noção histórica se inscreve alegoricamente nas práticas do presente -no caso, uma erudita contraposição entre o projeto moral da "veridicção" e a retórica das seitas.

DISCO

UM DIA DE BANDA *
Vermelho (Independente; download gratuito pelo site www.umdiadebanda.art.br)
Integrante do 14 Bis, Vermelho compila músicas de seu pai, o maestro Sebastião de Assis Moreira, e de compositores de bandas populares. Com interpretação primorosa do grupo 12 de Março, o repertório reconstitui um dia de festejos, com dobrados e motetos para procissões e cavalhadas. Folclore perdido no tempo? A polca "Um Gracejo" e o "Choro para Cravo" restauram a vivacidade do Brasil profundo.

 

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