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Serafina

Gregorio Duvivier cai em piada e fala sobre maconha, amor e Eduardo Cunha

Gregório Duvivier

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Era uma vez um pequeno príncipe louro que morava no bairro da Gávea, no Rio de Janeiro. Por ser louro, os coleguinhas o chamavam de Xuxa na escola. Em casa, era conhecido por outro nome: Bola. É porque o Bola era gordinho. E não aliviava. Sempre que a família da Gávea recebia visitas, o Bola corria para se empetecar. Entre os seis e os oito anos de idade, colocava gravata-borboleta e paletozinho e ia atender a porta. Sua mãe [a cantora Olivia Byington] ralhava:

- Bola, isso é ridículo... As visitas vão achar que nós é que te vestimos assim!

Mais de 20 anos depois, hoje morando sozinho em uma pequena casa no Jardim Botânico, ele olha para um desenho de Antoine de Saint-Exupéry. Um desenho do Pequeno Príncipe recortado e equilibrado entre seus livros de roteiro, cinema, quadrinhos e um exemplar de "O Homem e seus Símbolos", do psiquiatra suíço Carl Jung. O ex-Bola repara a gravata-borboleta no pescoço do personagem e tem uma revelação:

- Será que é por isso que eu usava a gravata-borboleta? — se pergunta, mostrando a antiga peça de roupa verde, hoje enquadrada e pendurada numa parede da casa. — Era minha história preferida, meu pai [o músico Edgar Duvivier] lia sempre pra nós.

- Vou levar esse caso ao meu terapeuta.

Curiosamente, seu terapeuta não é jungiano, mas freudiano, e eles se encontram duas vezes por semana. Desde que ele tinha 13 anos (com algumas interrupções). Agora ele tem 29. (29-13=16).

*

O BOLA CRESCEU

Como num conto de fadas, o Bola cresceu e ficou famoso com o nome (verdadeiro) de Gregorio Duvivier. É verdade que não cresceu lá muita coisa. Com 1,68 m, mente descaradamente a altura:

- Tenho 1,69 m.

- Mas você não costuma aumentar quando perguntam?

- Sim, em geral, digo que tenho 1,70 m. Mas tenho 1,69 m.

- Li uma entrevista antiga em que você afirma ter 1,68 m.

- Tá certo. Você me pegou. Tenho 1,68 m.

Se não chegou a se expandir tanto verticalmente, a parte do conto de fadas relativa à fama é bem verdadeira. Se formou em letras, virou ator, roteirista, poeta, colunista de jornal (a Folha) e membro fundador do maior sucesso da internet brasileira no ramo da comédia, o Porta dos Fundos, com esquetes que já estão batendo nas 20 milhões de visualizações.

*

CRÍTICAS

Em uma dessas esquetes, gravada há dois anos e meio (e com 4,3 milhões de visualizações), Gregorio encarna um repórter tentando arrancar uma manchete do entrevistado. A Serafina inverteu os papéis e, sem avisá-lo, fez para ele as mesmas perguntas que ele usou na ocasião.

Serafina - Muito obrigado por conceder essa entrevista, a gente adora você na Redação.

Gregorio - Pô, que bom, bicho!

A pauta estava batalhadíssima.

Pô, curti.

Vem cá, como é que estão as críticas?

Ah, o quê? Ah é, tem as críticas [risos]! Como é que estão as críticas à minha atuação? [risos]

Ué, não tem críticas?

[risos] Cara, o que mais tem são críticas. Toda semana tem crítica à minha coluna.

Não se considera acima da crítica?

[risos] Jamais! Cara, eu tenho comentaristas da minha coluna. Esses dias eu olhei só por diversão as tags [sistema de busca em um site]. No Rodrigo Constantino [colunista da revista "Veja"], por exemplo, agora tem uma tag com o nome "Gregorio Duvivier", em que você clica e aparecem tipo umas 120 menções ao meu nome. Dá pra fazer um novo "Esquerda Caviar" [livro de Constantino, editora Record] só com textos em que ele cita o meu nome, cara!

Então, Gregorio, você acha que o seu trabalho é digno de crítica?

Huhumm, de crítica?

Você tem crítica ao Constantino, então? Ajuda minha manchetinha aí? (risos)

[risos] Como é mesmo? "Vamos batalhar a manchete?" [risos, percebendo a brincadeira da esquete]. Críticas ao Constantino [risos]. O Millôr dizia uma coisa boa: "Você nunca pode amplificar a voz dos imbecis" [risos]. Então, eu tento bater em quem tem mais alcance que eu. Tipo o [pastor Silas] Malafaia, o [pastor e deputado Marcos] Feliciano. Tento não me dirigir a um pessoal que está falando com menos gente, vamos dizer assim.

*

Gil Inoue

RISO, SÓ ENGAJADO

Duvivier cresceu para virar um animal político. Ele vê engajamento em tudo quanto é lado, incluindo o lado da gargalhada. "Quando você ri, seja do que for, é uma tomada de partido, sem perceber. E é sempre batendo em alguém. O lance é não bater nas mesmas pessoas de sempre. É nisso que a gente acredita no 'Porta'. Inclusive, é mais potente comicamente se você ri do inesperado de uma pessoa inesperada."

Uma das consequências dessa posição é ter um cuidado com ofensas. Gregorio e seus colegas evitam, por exemplo, usar a palavra traveco, porque "eu sei que a galera trans se incomoda. Mas tem vários esquetes em que a gente escorrega, com certeza. Hoje temos quase 500 vídeos, então tem vários que são limítrofes..."

Curioso que isso parta do grupo que se notabilizou por quadros como uma mulher explicando ao seu marido, na mesa de jantar, que o que ela quer mesmo "é foder".

"A mulher, em geral, era alvo da piada. Quando a mulher fazia piada, era pelo fato de ser burra, ou nem isso, era figurante da piada, como uma gostosa. Ver uma mulher falando putaria pesada prum cara, assim, é um negócio muito libertador."

"E eu acho que o Porta tem um pouco disso, a gente tenta não fazer a piada óbvia, a que neguinho já fez. Só isso já é uma postura política. Mesmo que não seja uma piada política, só de você não estar fazendo as piadas que todo mundo faz, já faz diferença. Eu tento não ser obviamente político, nem levantar bandeira, porque é uma cagada, acho que perde o humor quando você levanta uma bandeira óbvia, né? Acho que o ideal é quando a política tá ali entre as linhas, no 'entredito'."

"A nossa ideia não é que a patrulha estrague a graça, mas a gente acredita que dá para manter a graça com responsabilidade, com inteligência, sobretudo porque a piada de identificação óbvia, ela é mais fácil. Se eu subir num palco de stand-up, provo isso: 'Ah, outro dia o ladrão roubou o meu cartão de crédito, mas eu não cancelei, não, porque ele está gastando menos que a minha mulher'. Esse tipo de piada do stand-up, o público vai amar, vai aplaudir, as mulheres, inclusive. Mesmo sendo uma piada velha, mesmo sendo uma piada machista, o público ama porque tem alguma coisa ali, no inconsciente coletivo, que faz rir da repetição, do preconceito, da obviedade, de que a mulher é dependente do homem, seja o que for. Esse riso a gente evita. Não é só que não tem graça, é cafona. Não é só que é irresponsável, é que não tem mais graça mesmo. O cara que puxa uma piada dessas numa roda é foda, acho que são outros tempos mesmo..."

*

AS ESTUFAS

Gregorio gosta de fumar maconha e acha que, se todo mundo saísse do armário, as drogas seriam legalizadas. "As drogas só são ilegais, como o aborto só é ilegal, porque todo mundo que pratica não diz que pratica. Porque ou você prende toda a classe artística, ou pelo menos 90% da classe artística e também a classe política, ou você faz uma limpa. É a mesma coisa a operação

Lava Jato. Por que a Lava Jato talvez não vá pra frente? Porque vai ter que prender todo mundo, cara! Você vai prender quem usa droga? Ou quem faz aborto? Você vai atrás? Não vai sobrar um."

Quando contou à família que fumava maconha, lá pelos 14 anos, o pai retrucou: "Porra, fuma comigo, cara. Fuma em casa, fuma com a sua avó".

A avó, conta Gregorio, começou a usar maconha, por recomendação médica, aos 80 anos. "Tipo... Mudou a vida dela. Ela disse: 'Que pena que eu comecei a fumar tão tarde'. Porque deu uma alegria para a velhice dela, e ela viveu até os 94, fumando baseado."

Mas agora há um novo problema rondando a erva proibida. "Tenho amigos que plantam em casa", resume. Mas, como num filme B policial, esses amigos estão sendo presos, um atrás do outro. "A polícia bateu na casa deles por causa da conta de luz."

Como é, Gregorio? "A luz aumenta, por causa de estufa. Eles percebem quem tem estufa porque o uso da luz tem picos de horário. De noite, em geral, o cara tem um pico, e a polícia saca por aí que o cara planta."

"Sou contra o tráfico, contra você comprar com essa galera aí na rua, até pela qualidade, a qualidade é horrível. Os meus amigos plantam uma maconha de nível altíssimo. Mas tenho cada vez menos amigos que plantam..."

*

CLARICE...

Há muito tempo, numa galáxia muito, muito distante, Gregorio conheceu Clarice. Ela tinha 12 anos e fazia balé com a irmã dele. Gregorio tinha 15, ia buscar a irmã na aula e viu Clarice pela primeira vez. "Um dia ela foi lá em casa e me amarrei já nela, ela com uns 13, eu com 16." Estamos no ano de 2002 e crianças dessa geração não falam por telefone. Comunicam-se pela internet. Assim, trocaram seus números de ICQ, um sistema pioneiro em que as pessoas podiam escrever e receber respostas instantâneas a partir de seus enormes computadores em cima da mesa do quarto.

Mensagem vai, mensagem vem, o ICQ entrou em derrocada. Um novo serviço, o MSN, virou o queridinho dos namorados. Funcionou igual. Mensagem vai, mensagem vem. O flerte digital durou anos.

Em 2007, o caso de amor fica muito mais sério: Clarice faz 18 anos e descobre o Orkut, uma rede social. É um conceito muito mais avançado, tecnológico e completo para o namoro. Serve para troca de mensagens, para escrever depoimentos fofos, para criar grupos de amigos com afinidades e é perfeito para a colocação de fotos. Gregorio e Clarice se aproximam cada vez mais.

A chegada do Facebook em suas vidas marca uma nova mudança. Em 2009, eles começam a namorar fisicamente e as consequências são devastadoras:

"Ela me mostrou seriados que hoje em dia eu amo, tipo 'How I Met Your Mother'. Antes, eu teria preconceito, porque tem claque, mas é brilhante. O 'The Office' é um dos poucos que eu tinha visto antes, mas 'Friends' eu teria preconceito, ou 'Seinfeld', e os dramáticos também. A gente viu junto 'Homeland', 'House of Cards'. Ela me mostrou a genialidade que tem na TV americana. E as viagens. Ela ama viajar, então fomos para França, Grécia, fomos para Nova York, fomos para Uruguai, Argentina, sabe? A gente viajou muito juntos. Portugal, Londres, a gente viajou pra cacete juntos. E livros, ela me indicou uma porrada de livros interessantes, como 'A Visita Cruel do Tempo', de Jennifer Egan."

Gil Inoue

Mas, quando foram morar juntos, no Leblon, o casamento durou apenas um ano. Terminou há sete meses. Agora, Gregorio se mudou para a pequena casa numa vila do Jardim Botânico e passa as noites tentando aprender a tocar trombone.

*

MAIORIDADE PENAL

"É falta de empatia, cara. Falta de você se colocar um pouquinho no lugar, não ver protagonismo nos outros, não achar que esse moleque é um protagonista da vida dele. Não ver o protagonismo no outro, não ver humanidade no outro, isso me deixa muito puto mesmo. Me deixa puto e eu acabo reagindo com ódio. Pois é, cara, eu acho criminoso. Eduardo Cunha é um criminoso mesmo. Ele tem uma história de crimes. A entrada dele na política foi intermediada pelo PC Farias. Ele começou fazendo campanha para o Collor. O cara já começou no crime e, desde então, vem se especializando, em todos os sentidos. Virou um golpista profissional. O cara tem o Congresso nas mãos então vota o que quiser, quantas vezes quiser, do jeito que quiser. E tem uma coisa que eu acho muito nefasta nele: ele une dois cânceres brasileiros, que são o conservadorismo religioso, dos evangélicos, e também os interesses privados na Câmara. Em geral, eles não estavam unindo as duas coisas. Ele une o lobby evangélico e o lobby das empreiteiras ao mesmo tempo. O cara representa duas fatias muito poderosas da população."

- Acho que você já me deu sua manchetinha...

- É, né? [gargalhada] Pronto, agora eu posso relaxar.

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