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Serafina

Arquiteto desde o berço, Thiago Bernardes projeta legado olímpico

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Se você nunca ouviu o nome Thiago Bernardes, certamente já visitou, passou em frente ou viu imagens do Museu de Arte do Rio, o MAR. Aberto em 2013, ele é a vedete da Olímpiada-2016.

Foi construído para se destacar na paisagem da velha praça Mauá, onde está em andamento o maior legado arquitetônico dos jogos mundiais: o Porto Maravilha, revitalização da zona portuária do Rio de Janeiro.

Christian von Ameln
Traços de família - Neto do gênio maldito da arquitetura modernista, Thiago Bernardes constrói casas premiadas e como o avô Sérgio, começa a enveredar para projetos públicos - Thiago Bernardes em seu escritório paulistano, uma casa de Gregori Warchavchik no Jardim Europa#serafina91
Thiago Bernardes em seu escritório paulistano, uma casa de Gregori Warchavchik no Jardim Europa

Aos 44 anos, Thiago é o arquiteto que assina a obra, executada pelo seu escritório, o Bernardes + Jacobsen. Laureado neste ano com o prêmio Architizer, um dos mais importantes da arquitetura contemporânea mundial (por duas obras, a Casa Delta, no Guarujá, e a Capela do Joá, no Rio de Janeiro), ele diz que o museu foi bem mais do que um projeto: "Vai além da arquitetura, está inserido no contexto de um novo pensamento para a cidade".

Sentado na sala de reuniões da sede carioca da Bernardes Arquitetura, Thiago parecer ser, ele próprio, uma obra em progresso. Tornou-se conhecido e reverenciado pelos projetos de casas e hotéis marcados pelo traço único, silencioso, que se integra à paisagem. Agora o seu afã, segundo diz, é avançar, ir adiante no conceito de arquitetura.

"Tenho um cliente que é dono de uma área em Paraty quatro vezes maior que a cidade. Estamos desenvolvendo ali um projeto para que a região cresça de forma ideal, integrada", afirma. "As pessoas estão entendendo que muros só pioram a segurança. Não querem mais condomínios fechados. Então, como fazer para as cidades esticarem? Pensar nessas soluções é o meu maior tesão no momento."

A história de Thiago com a arquitetura vem de berço. Ele é filho e neto de duas lendas do traço: Claudio Bernardes (1949-2000) e Sergio Bernardes (1919-2002). Claudio, o pai, foi um dos precursores do uso de matéria-prima em seu estado natural: terra, bambu, palhas, cipós, pedras, madeira.

"A maior lição que recebi do meu pai foi uma casinha que ele construiu em Angra. A casa não tinha nenhuma porta, nem no banheiro. Ali estava tudo de relação humana e de comunhão com o entorno. Meu pai a construiu aos 20 anos", lembra Thiago.

*

HISTÓRIA PERDIDA

O avô, Sergio, é um capítulo inteiro da história da arquitetura brasileira. Um capítulo obscuro, que Thiago foi desvendar em meados dos anos 2000, quando se jogou na estrada para realizar o documentário "Bernardes", lançado em 2014.

"Fiz esse filme para entender certas coisas", conta o neto. "Todos os lugares que eu ia no mundo, encontrava alguém que me perguntava: 'Você é neto do Sergio Bernardes?' Ele tinha uma relevância, eu sabia, mas, ao mesmo tempo, ninguém mais falava dele aqui, nem no curso de arquitetura. Por quê?".

Nascido em 1919, no Rio de Janeiro, Sergio Bernardes foi alçado para o palco da arquitetura modernista na mais tenra idade. Antes de concluir a faculdade, já fazia casas para a elite intelectual do Rio. Em 1953, ganhou o prêmio de jovem arquiteto na 2ª Bienal de São Paulo com a casa da urbanista Lota de Macedo Soares.

"Sergio era o maior arquiteto de moradias nos anos 1940 e 50. Era um Fla-Flu, Sergio Bernardes e Oscar Niemeyer", comenta o professor e arquiteto Lauro Cavalcanti, no filme "Bernardes".

Dono de uma mente livre e gênio da prancheta, Sergio resolveu virar o cavalete no auge da carreira e da fortuna. Em 1968, abandonou a festa. Literal e metaforicamente. Na noite das bodas de prata, zarpou da casa na avenida Niemeyer, onde recebia dos Kennedy aos Mutantes, deixando para trás somente uma carta.

"Representei muitos anos o mesmo teatro, a mesma peça, com os mesmos cenários, com o mesmo público, os mesmos artistas, com a mesma estrela. Estou farto de representar. Serei autenticamente eu e a minha sensibilidade. Nego que o passado participe do presente", dizia um dos trechos da carta.

Daí em diante, o arquiteto, que havia construído grandes obras, como o Pavilhão de São Cristóvão, na zona norte carioca, partiu para o radicalismo de pensamento, propondo projetos visionários, incompreensíveis para a época.

Quando, em 1964, veio a ditadura, Sergio viu nos militares uma oportunidade. Acreditou na ação transgressiva e revolucionária dentro do sistema. Trabalhando para o regime, construiu obras polêmicas, como o mastro da bandeira do Brasil, na praça dos Três Poderes, em Brasília, símbolo do autoritarismo.

"Dá para entender o Sergio ter acreditado que era possível colocar ideias dentro daquele contexto. O regime militar apostou no desenvolvimento, na grande infraestrutura do Brasil, um ideal dos modernistas", comenta o arquiteto e crítico Guilherme Wisnik, em "Bernardes".

Christian von Ameln
Traços de família - Neto do gênio maldito da arquitetura modernista, Thiago Bernardes constrói casas premiadas e como o avô Sérgio, começa a enveredar para projetos públicos - Thiago Bernardes em seu escritório paulistano, uma casa de Gregori Warchavchik no Jardim Europa #serafina91
Bernardes constrói casas premiadas e, como o avô Sérgio, começa a enveredar para projetos públicos

Sorvendo um café preto, Thiago diz que, olhando em perspectiva, duas gerações depois, a história do seu avô é, sem dúvida, "uma puta história": "Ele foi taxado de arquiteto dos militares. Mas o Sergio não tinha partido. Enxergou na ditadura uma maneira de fazer uma mudança social pela arquitetura. Aí se ferrou. Foi duro fazer este filme".

Guardadas as proporções do tempo e escala, Thiago segue a trilha do avô. De arquiteto dos endinheirados, começa agora a enveredar pelas obras públicas.

"Morria de medo de seguir a carreira do meu pai e do meu avô", diz Thiago. "Não queria fazer igual a eles e acho que encontrei a minha própria história."

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