Serafina
Estilista Marisa Ribeiro aconselha clientes a comprarem menos roupas
Tudo culpa do uniforme de tergal da filha. Não fosse ele, Marisa Ribeiro provavelmente teria seguido outro rumo que não a moda. Quando a primogênita entrou na escola, há mais de 30 anos, a mãe zelosa se recusou a vesti-la com tecido sintético, que, segundo diz, não permite que a pele respire. Comprou algodão e mandou fazer modelos mais confortáveis.
As outras mães gostaram da ideia e encomendaram uniformes iguais para seus rebentos. Na garagem de casa e com uma costureira que a ajudava nos finais de semana, aceitou o desafio.
Julia Rodrigues | ||
Conhecida por seus tricôs, a estilista Marisa Ribeiro iniciou a carreira costurando peças para as filhas |
Logo Marisa passou a oferecer artigos não só para os miúdos, mas também para suas mães, como saias e roupas de ioga. As primeiras estampas ela criou utilizando um carimbo feito de batata.
Foi um sucesso. O mulherio todo queria as tais peças de Marisa Ribeiro.
Sem cacife para encomendar etiquetas, a estilista deu lá seu jeito. Passou a confeccionar algumas com papel ou a assinar o nome nas roupas com canetinha. Com a demanda maior, contratou mais um funcionário, passou a fazer as próprias malhas e deixou para trás a garagem. Instalada no Brooklin, na zona sul paulistana, comprou mais duas máquinas. Uma foi bancada pelo marido.
A outra, pelo pai.
O patriarca tinha recursos para investir um montante mais generoso, mas não acreditava que a filha iria longe. "Ele achava que lugar de mulher era em casa cuidando dos filhos" —conta, sentada no escritório de sua fábrica de três andares no Jabaquara, em São Paulo.
Marisa hoje tem quatro lojas na cidade, onde vende suas peças de tricô em fios especiais, como algodão egípcio e cashmere de fio de cabras da Mongólia. Conta com 33 funcionários. Entre eles, a filha Coca Aguiar, que cuida da comunicação, e o marido, Arthur Aguiar, que há 20 anos abandonou a engenharia para cuidar das contas das lojas da mulher.
"Eu estava sobrecarregada. Casa, fábrica e três filhas pequenas para criar sem babá. Disse a ele: 'Ou você vem me ajudar ou fecho'." Marisa veste uma bata de de sua nova coleção. É de seda e algodão e tem desenhos de peixes e bolas. Calça vermelha e unhas dos pés e das mãos pintadas da mesma cor. Esguia, olhos azuis, usa cabelo grisalho em um corte chanel. Aos 65 anos, diz que ainda se acha uma criança. "Me olho no espelho e até levo um susto."
Em sua sala, há vários potes de vidro cheios de chumaços de algodão e retalhos de panos coloridos —memória das cores fortes usadas em suas coleções. No ar, o perfume suave que se espalha pela fábrica vem de uma essência utilizada no tingimento dos tecidos.
Sua xará, a gigante varejista Marisa, acaba de fechar quatro lojas. Já Marisa Ribeiro parece passar incólume pela crise econômica que o país atravessa. "Tive aumento de vendas no atacado."
Ela herdou clientes que ficaram órfãs de grifes que sucumbiram nos últimos anos, como Andrea Saletto e Maria Bonita Extra.
A estilista costuma aconselhar as pessoas a comprarem poucas peças. Apesar de viver de vendas, para ela não se trata de um desatino: "Sério, para que ter tanta roupa? As pessoas têm que refletir: 'Eu preciso mesmo disso?'", aconselha.
Desde os primórdios, Marisa investiu em tecidos de qualidade. O mesmo não se diz do material barato, da marca Eternit, que usou para montar as bancadas de seu primeiro showroom, há três décadas. Uma freguesa desavisada quis saber de onde eram aqueles "mármores" tão finos. "Ah, querida, este é um material muito especial. É francês e chama-se 'Éternité'" —debochou Marisa, dizendo o nome da marca com biquinho e sotaque das terras de Proust.
Já é hora do almoço quando Arthur, seu marido, entra na sala. Os dois estão juntos há 40 anos. Pelo visto, parece que não são só as roupas Marisa Ribeiro que duram tanto tempo.
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