Serafina
Artista sueca Mamma Andersson é curadora convidada da Bienal de SP
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A artista, Karin Mamma Andersson, em seu ateliê na Suécia |
O rastro das rodas de um carro desgovernado corta o manto branco da neve sobre a estrada. O caminho que atravessa a floresta de pinheiros leva a um céu cor de chumbo, ou de pombo esmagado no asfalto.Na distância, as nuvens carregadas formam uma mancha que parece afogar o horizonte.
Não há ninguém por ali, nem sinal do que pode ter acontecido segundos antes que esse momento fosse plasmado numa pintura que desafia qualquer noção de passado, presente e futuro.
Karin Andersson, ou Mamma Andersson, como é conhecida no mundo das galerias e dos museus, é a artista visual sueca que vem, ao longo das últimas décadas, construindo essas cenas e espaços de tensão transbordante.
Suas pinturas são o cenário por trás de histórias desconhecidas, o set de um filme imaginário, a casa assombrada por lembranças turvas de infância, o flagra de um momento em que o mobiliário, papéis de parede e serviços de chá se rebelam contra vontades burguesas.
"Uma pintura é um momento sem começo nem fim", diz a artista. "Penso nelas como capítulos de um livro ou o roteiro de um filme. Queria representar espaços em que a paisagem pudesse se manifestar como um espírito. Sinto atração por lugares estranhos e despojados. Enquanto dor e medo podem causar certo entorpecimento, esses sentimentos me ajudam a encontrar uma expressão particular."
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Obra 'Pigeon House', de Mamma Andersson |
Mamma Andersson, no caso, é uma das vozes singulares que estão moldando a próxima Bienal de São Paulo. Escalada pelo espanhol Gabriel Pérez-Barreiro, o curador do evento que estreia em setembro no parque Ibirapuera, ela é responsável pela seleção de parte dos artistas da exposição. Mas antes disso, suas próprias pinturas vão estar no mesmo pavilhão da Bienal em duas das galerias que vão à feira SP-Arte, agora em abril.
Tecidos e texturas
No fundo, sua obra tenta trazer à tona os abismos possíveis que rondam o dia a dia. É o medo de tubarões escondidos no silêncio azulejado da piscina do clube.
Essa abordagem desconfiada que ela lança à perversidade do mundo de pelúcia da classe média tem um pé, ela diz, no fato de ter crescido num ambiente de operários na Suécia.
Mesmo num dos países mais ricos e progressistas do mundo, Mamma Andersson conta que enfrentou olhares atravessados quando decidiu se tornar uma artista.
Talvez por isso suas composições tendem a estar no fio da navalha entre o falso conforto proposto pelas revistas de decoração e a cena de um crime brutal.
Neta de um decorador de interiores e fã de artistas que exploraram o prazer tátil de pele, tecidos e texturas, dos impressionistas franceses aos expressionistas nórdicos, Mamma Andersson entende a sua pintura como filtro entre forças antagônicas, algo entre a frivolidade do romantismo fru-fru e as pauladas do teatro do absurdo.
Mas qualquer violência em seus trabalhos é sempre emudecida. Suas telas são estudos contemplativos de tudo aquilo que está por trás do ódio, algo que pode ser confundido com o retrato de um mundo atraente na superfície e distópico nos alicerces.
"Toda a arte que conheço tem a melancolia como raiz", diz Mamma. "Sou desse lugar quase no círculo polar, onde não existe luz. Nada é muito alegre. É o meu lar."
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