Temporada de furacões começa sem que Porto Rico saiba quantos morreram na anterior

Estudo afirma que o furacão Maria provocou mais mortes do que o divulgado

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São Paulo

Tem início nesta sexta-feira (1º) a estação dos ciclones tropicais no Atlântico, alguns dos quais crescem para se transformar em furacões e ganhar nomes próprios.

Há indícios de que a temporada não será tão devastadora quanto a de 2017. Mas ninguém sabe ao certo.

 

Stefan Rahmstorf, Kerry Emanuel, Mike Mann e Jim Kossin, quatro especialistas em clima e suas tempestades, preveem uma estação regular, com uma dezena de tormentas dignas de nome. Menos precisamente, entre 7 e 13 ciclones.

O batismo ocorre quando a tempestade tropical assume um padrão circular e seus ventos ultrapassam a marca de 63 km/h (34 nós). 

Se em 2018 houver mesmo 13 delas, os nomes já listados pelo Centro Nacional de Furacões dos Estados Unidos serão: Alberto, Beryl, Chris, Debby, Ernesto, Florence, Gordon, Helene, Isaac, Joyce, Kirk, Leslie e Michael.

Alberto, aliás, nem esperou a data convencionada de abertura da estação ciclônica. Entrou já no final de maio pelo golfo do México, com ventos de até 100 km/h.

Três décadas atrás, pesquisadores como Kerry Emanuel, professor de ciência atmosférica do MIT Instituto de Tecnologia de Massachusetts, previram, com apoio de modelos simuladores do aquecimento global, que não haveria necessariamente mais ciclones, mas sim que aumentaria a frequência daqueles com energia bastante para figurar como furacões de categoria 4 e 5 (os mais violentos).

É o que parece estar ocorrendo, indicam agora os quatro climatologistas. A força motriz dos ciclones está na evaporação da água do oceano, que absorve calor da atmosfera e, como ela, está se esquentando sob efeito do aquecimento global.

Os dados de observações por satélite, a partir de 1979, corroboram a projeção de que os furacões mais fortes se tornariam ainda mais intensos. E não só no oceano Atlântico, embora a tendência mais significativa se apresente justamente na porção norte desse oceano.

Mais ainda: as tempestades recordistas em vento têm ocorrido nas últimas décadas, não por acaso no período em que se deu a maior parte do aumento de cerca de 1ºC na temperatura média da atmosfera.

A temporada de 2017 bateu todos os recordes de energia acumulada de furacões. Mas isso não quer dizer que a de 2018 vá ser ainda mais forte, nem mesmo que vá ser igual ou parecida —nada no clima acontece de maneira assim linear.

No ano passado houve os famigerados Harvey (maior chuva já ocorrida nos Estados Unidos), Irma (recordista de tempo —37 horas— com ventos de 300 km/h) e Maria (mais de 4.000 mortos em Porto Rico, batendo os cerca de 1.800 do Katrina no estado da Louisiana, em 2005).

O número incerto de vítimas na ilha caribenha, um Estado associado dos EUA, sugere que, em matéria de furacões, até o passado tem algo de imprevisível. Quando colapsam todos os serviços, contar cadáveres se torna tarefa duplamente ingrata.

O governo local registra oficialmente 64 mortos, um número desacreditado. Levantamentos independentes citados em reportagem da série Crise do Clima, que está sendo publicada pela Folha, estimaram a cifra em mais de mil, mas estudo publicado nesta semana propôs que mesmo esta seja multiplicada por quatro.

O trabalho saiu na revista especializada New England Journal of Medicine, assinado por pesquisadores da Universidade Harvard. Os 15 autores estimam o total de mortes em 4.645 (o número oficial multiplicado por quase 73).

Chegou-se ao dado por meio de entrevistas em 3.299 domicílios, uma amostra aleatória representativa da população porto-riquenha. Com base nelas, os pesquisadores concluíram que houve 14,3 mortes por mil habitantes entre 20 de setembro (dia do furacão) e 31 de dezembro de 2017, ou 62% mais que no mesmo período de 2016.

O estudo descobriu que a interrupção dos serviços de saúde aos idosos e a perda de serviços públicos básicos para os pacientes de doenças crônicas tiveram impactos significativos em todo esse território.

Assim se chegou ao total de 4.645 mortes em excesso, mas note que se trata de uma projeção. Talvez nunca se venha a saber com segurança quantas pessoas pereceram à espera de socorro, diálise, cirurgia, remédios etc, por força do colapso nos transportes e no fornecimento de energia elétrica.

A maioria da população "boricua", como se chamam os habitantes de Porto Rico, ficou sem energia elétrica, telefonia celular, combustível e internet por semanas.

Oito meses depois, Porto Rico ainda está longe da recuperação, o cômputo de vítimas não para de aumentar, e uma nova temporada de furacões bate à porta da Ilha do Encanto.

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