Em reunião com EUA, Salles mostra Brasil como cachorro de olho em frango de padaria

Imagem foi exibida para equipe de John Kerry, enviado especial para o clima do governo americano

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Washington

O ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) lançou mão de uma estratégia no mínimo inusitada na tentativa de convencer os Estados Unidos a enviarem dinheiro ao Brasil para a preservação da Amazônia.

Em reunião com integrantes da equipe de John Kerry, enviado especial para o clima do governo Joe Biden, Salles mostrou slides em que era possível ver a imagem de um cachorro sentado, abanando o rabo diante de uma máquina de frango assado, situação bastante comum em frente a padarias brasileiras.

Segundo relatos de quem viu a apresentação, era possível ler, em inglês, "expectativa de pagamento" acima da imagem dos frangos, que carregavam cifrões de dólares estampados no peito. Pouco habituados à cultura do frango de padaria, os americanos não conseguiram entender de imediato a ligação entre a figura e a mensagem do governo brasileiro.

As imagens, que datam de 17 de março, fizeram parte de uma série de reuniões bilaterais entre integrantes dos governos brasileiro e americano nas últimas semanas, em preparação para a Cúpula de Líderes sobre o Clima, que Biden marcou para os dias 22 e 23 de abril.

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) foi convidado por Biden para participar do encontro, que vai acontecer de forma virtual, e deve reunir 40 líderes mundiais.

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Ilustração com base em slide apresentado pelo ministro Ricardo Salles em reunião com autoridades americanas - Catarina Pignato

Os EUA querem que o Brasil se comprometa com metas objetivas de redução de desmatamento ilegal, zerando a prática até 2030, e apresente resultados ainda neste ano.

Salles, por sua vez, insiste na ideia de que o Brasil vai se comprometer com números apenas se receber dinheiro antecipado de países estrangeiros, mas os americanos condicionam o financiamento a resultados concretos.

Na reunião do dia 17 de março, por exemplo, o ministro brasileiro pediu US$ 1 bilhão até 2021 para ajudar na preservação da floresta. Salles também diz que o Brasil precisa receber recursos de compensação sobre outras preservações já feitas, como a redução de 7,8 bilhões de toneladas de carbono de 2006 a 2017.

Entre os negociadores americanos, a apresentação feita por Salles reforçou a imagem de que o governo Bolsonaro não está bem preparado para a cúpula, resistente a assumir metas mais ambiciosas ou a apresentar uma estratégia crível para reduzir a devastação do bioma.

De acordo com o Deter, o sistema de monitoramento de desmate do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), o desmatamento na Amazônia voltou a bater recorde em março e foi o maior dos últimos seis anos. Os dados apontam 367,61 km² de desmatamento. O recorde anterior pertencia a 2018, com 356,6 km² destruídos, seguido por 2020, com 326,49 km² derrubados, todos sob governo Bolsonaro.

Após a chegada de Biden à Casa Branca, o meio ambiente se converteu no principal assunto da relação bilateral entre Brasil e EUA.

Para diversos setores do governo Bolsonaro, a cúpula organizada por Biden é considerada um momento-chave no relacionamento entre os países. Os americanos pretendem observar a participação do Brasil para decidir se existe de fato uma mudança de rumo da gestão brasileira.

O temor entre auxiliares do Planalto é que uma atuação de Bolsonaro julgada como frustrante pelos EUA abra as portas para o aumento da pressão diplomática e econômica contra o país.

Os preparativos para a cúpula têm mobilizado ao menos três ministérios: Meio Ambiente, Itamaraty e Agricultura.

A avaliação de conselheiros de Bolsonaro é que o presidente não pode repetir a retórica que ele já adotou no passado sobre o tema, a de que existe cobiça estrangeira pela Amazônia, e os recorrentes ataques contra ONGs e populações indígenas.

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