Descrição de chapéu Planeta em Transe desmatamento

Desmate no cerrado cresce 25% e ultrapassa 10 mil km2

Sob Bolsonaro, é o 3º ano seguido de aumento da derrubada na savana mais biodiversa do mundo

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São Paulo

O desmatamento no cerrado brasileiro cresceu cerca de 25%, em relação à última medição e chegou a 10.688,73 km². É o maior número desde 2015, quando foram registrados 11.129,06 km² de derrubada, e o segundo maior salto já computado.

Além disso, é o terceiro ano seguido de crescimento de devastação no bioma. A área derrubada equivale a cerca de sete cidades de São Paulo.

Parte de uma árvore caída contrasta com o céu cheio de nuvens; ao fundo, um grande campo aberto
Área de cerrado desmatado para o plantio de soja no entorno da bacia do rio dos Couros, na Chapada dos Veadeiros, em Goiás - Lalo de Almeida - 9.dez.2021/Folhapress

Os dados são provenientes do Prodes Cerrado, programa do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) que mede o desmatamento ocorrido no bioma. Os números são registrados de agosto de um ano até julho do ano seguinte, ou seja, o desmate divulgado nesta quarta (14) ocorreu de agosto de 2021 até julho deste ano.

No período anterior, a derrubada de cerrado tinha ficado na casa dos 8.531 km². Em 2019, primeiro ano do governo Jair Bolsonaro (PL) —no qual a destruição de floresta explodiu na Amazônia—, o cerrado registrava 6.319 km² de derrubada.

Desde o início do governo Bolsonaro, foram derrubados 33.444 km² de cerrado, segundo os dados do Inpe.

A devastação no cerrado do Brasil, a savana mais biodiversa do mundo e com importante papel nas bacias hidrográficas brasileiras, não fica tão distante numericamente do desmate registrado na Amazônia no mesmo período —11.568 km². O problema, porém, é proporcional.

O cerrado tem, aproximadamente, metade do tamanho da Amazônia brasileira. O número aponta, então, um ritmo de destruição mais elevado na savana brasileira.

"O risco é enorme desse bioma. A gente correr o risco de perder esse bioma é [algo] imensurável, do que pode representar para nós e para o planeta. Quando perdemos pedaços do cerrado dói, porque a perda acumulada é grande", diz Frederico Machado, líder da estratégia de conversão zero do WWF-Brasil, que aponta que mais da metade do bioma já foi derrubado.

Segundo Machado, o aumento expressivo no desmate pode estar relacionado com um sentimento de "fim de feira". "O final de um governo que tapou os olhos para a destruição, para os crimes ambientais", diz Machado.

O cerrado brasileiro tem menor proteção, quando comparado à Amazônia. O Código Florestal em vigor aponta que, em linhas gerais, deve ser conservada em pé (o que é chamado de reserva legal) 80% da área das propriedades privadas localizadas no bioma amazônico. Para o cerrado, esse número é de 20% ou de 35% (caso de áreas de cerrado localizadas na Amazônia Legal).

Ao mesmo tempo em que recebe menor proteção, o cerrado nacional vê o avanço do agronegócio, especialmente de plantações de soja. Levantamento recente do MapBiomas mostrou que a soja já ocupa cerca de 10% do cerrado, o que equivale a 20 milhões de hectares.

Uma das regiões mais visadas ao se falar sobre tal expansão é o Matopiba, que compreende áreas do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. São esses, inclusive, os estados que dominam a área derrubada, segundo os dados do Inpe. O Maranhão foi responsável por 26,5% do desmate, Tocantins por 19,9%, Bahia por 13,3% e o Piauí por 11,1%.

A expansão da soja sobre áreas de floresta amazônica foi freada, em grande medida, graças à moratória da soja, um acordo que proíbe o comércio, a aquisição e o financiamento de grãos produzidos em áreas desmatadas ilegalmente na Amazônia após julho de 2008.

Há resistência no setor, porém, para uma expansão da moratória para o cerrado.

Com o aumento expressivo do desmatamento na Amazônia durante o governo Bolsonaro, cresceu também a pressão internacional sobre o assunto. Recentemente, avançou na União Europeia uma nova regulamentação para impedir importação de produtos ligados ao desmatamento. O Brasil e a Amazônia estão contemplados nessa legislação, porém, o cerrado ficou de fora.

O especialista do WWF-Brasil ressalta que uma parcela do bioma foi abarcada pela legislação europeia, embora a maior parte tenha ficado de fora. Segundo ele, porém, há a intenção de incluir, futuramente, o restante do bioma na regulamentação.

Segundo a regra, o mercado comum europeu rejeitará commodities, como carne, soja, madeira, borracha, cacau, café e óleo de palma (dendê), provenientes de áreas desmatadas, ainda que com permissão legal, depois de 31 de dezembro de 2020.

Machado afirma que tal data de corte deve se manter em uma futura inclusão completa do cerrado no regramento. "Então não adianta a corrida do ouro, não adianta esse desespero de desmatamento, porque a porta já fechou", diz Machado. "Então quem desmatar após essa data corre seríssimo risco de sofrer as implicações de bloqueio comercial, de bloqueio financeiro."

Um estudo publicado em 2020 na revista Science mostrou que o desmatamento ilegal na Amazônia e no cerrado pode estar contaminando aproximadamente 20% da soja e pelo menos 17% da carne exportadas para a União Europeia.

"Os riscos estão ficando aqui no Brasil, principalmente para o agronegócio, então é importantíssimo que o próprio setor adote medidas para separar o joio do trigo", diz o especialista.

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