Descrição de chapéu Cenários 2023

Interesse por carros elétricos ganha força, mas futuro com eles não está tão próximo

Emplacamento de veículos do tipo cresceu 43,4% em 2022 no Brasil, mas mercado ainda esbarra em custo e crise de insumos

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São Paulo

Entre janeiro e novembro de 2022, 43,7 mil carros eletrificados foram vendidos no Brasil. A conta divulgada pela Anfavea (associação das montadoras) inclui carros 100% elétricos e diferentes opções de modelos híbridos. No total, há 255 versões desses carros sendo comercializados no país, e nenhum custa menos de R$ 140 mil.

Os números dão a impressão de se tratar de algo ainda elitizado, mas o crescimento de 43,4% nos emplacamentos na comparação com o mesmo período de 2021 mostra o interesse do público pelas novas tecnologias de propulsão.

O carro elétrico Tesla Model 3 (R) é exposto durante o evento de lançamento oficial da Tesla em Bangkok no último dia 7 - Lillian Suwanrumpha/AFP

Ao mesmo tempo em que aumenta a disponibilidade de modelos, vem a constatação de que o futuro não será tão elétrico quanto parecia. A crise no fornecimento de componentes causada pela pandemia e a Guerra na Ucrânia têm feito governos e montadoras revisarem seus planos, e essas mudanças trazem impactos diretos ao Brasil.

"O momento de conflito acaba interferindo em diversos aspectos no mercado econômico, como é o caso do aumento do preço de matérias-primas e também na cotação do dólar", diz Davi Bertoncello, CEO da Tupinambá Energia. "O segmento de carros elétricos no Brasil ainda é bastante dependente de importações."

O executivo ressalta que esse não é um problema apenas do segmento de carros elétricos, pois a guerra influencia também no preço do petróleo. Por esse lado, recarregar um carro elétrico em casa ainda custa bem menos que abastecer um veículo a gasolina para obter autonomia equivalente.

Segundo dados apurados pelo Instituto Mauá de Tecnologia, o motorista gasta R$ 23 com energia para percorrer 100 quilômetros com um Peugeot e-2008 GT no trânsito urbano de São Paulo. Caso tenha um 208 1.6 automático flex, o gasto para rodar a mesma distância com etanol será de R$ 53.

Os cálculos consideram os valores médios da energia em residências na capital paulista em novembro e do combustível de origem renovável na segunda semana de dezembro. Os dados são, respectivamente, da Enel e da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis).

A conta com base no etanol busca mostrar a alternativa de menor impacto ambiental disponível nos postos. Embora a queima do álcool resulte também em poluentes, há vantagens em todo o ciclo do combustível renovável diante da gasolina.

É por isso que uma das soluções apontadas para o mercado brasileiro e países como a Índia é o desenvolvimento de modelos compactos movidos pela combinação de eletricidade e etanol.

No caso dos modelos 100% elétricos, é possível recarregar o carro sem custos em pontos disponibilizados por montadoras em shoppings e supermercados, por exemplo.

Em geral, são tomadas de menor capacidade, que exigem cerca de oito horas para ir do zero aos 100% de energia nas baterias. Ainda não há previsão de quando esse serviço começará a ser cobrado.

Diversas marcas têm oferecido a instalação residencial de plugues residenciais similares a esses encontrados em estabelecimentos comerciais. São os "wallboxes", que custam por volta de R$ 5.000.

Caso tenha disponibilidade para carregar o carro na garagem, o proprietário vai precisar desse sistema: sem ele, conectar um automóvel pequeno a uma tomada convencional de 220v vai demandar cerca de 20 horas para atingir o máximo da capacidade de armazenamento.

A vantagem do elétrico diminui fortemente na comparação dos preços dos veículos. Enquanto o e-208 GT é anunciado por R$ 220 mil, a versão 1.6 flex automática parte de R$ 97 mil. Outro problema é o valor do seguro.

"Quando falamos em profissionais que usam o veículo como principal ferramenta de trabalho, o custo da apólice veicular torna-se algo muito relevante. Muitas vezes, o valor da cobertura é algo impraticável, fazendo com que busquem alternativas em associações ou a contratação apenas de assistências em caso de pane", afirma o CEO da Tupinambá.

Esse é um dos gargalos da mobilidade elétrica sobre quatro rodas. Os custos envolvidos ainda são elevados para motoristas de táxi ou aplicativo, que poderiam ser os principais usuários desses modelos no dia a dia. A massificação dos elétricos nessas categorias ajudaria a reduzir as emissões de poluentes nas cidades e os níveis de ruído.

Os planos de locação de longo prazo, usados por muitos profissionais da área de transportes, também custam mais no caso de modelos recarregados na tomada. O aluguel de um Renault e-Kwid (R$ 147 mil) por dois anos custa R$ 4.719 por mês no plano com franquia de 3.000 quilômetros.

Ao pensar no uso profissional dos veículos elétricos, há ainda a questão dos entregadores.

Acreditamos que o cliente perfeito para a eletricidade é o motoboy, porque, para eles, essa opção será absolutamente mais econômica", diz Billy Blaustein, cofundador da Leoparda Electric.

A startup, que comercializa motocicletas elétricas, aposta em um sistema de troca rápida de baterias para manter os veículos em funcionamento durante um dia de trabalho, sem precisar esperar pela recarga. Blaustein vê que os problemas atuais desse segmento são os valores desses acumuladores de energia e a necessidade de expandir os pontos de reabastecimento.

"Há a crença de que o custo do níquel subirá por causa da guerra, e essa é uma matéria-prima usada em baterias de íons de lítio", diz o executivo. "Porém é improvável que isso tenha um impacto direto na adoção [da mobilidade elétrica] no Brasil", afirma o executivo da Leoparda.

Do lado da rede de recarga, os aportes terão de ser altos. Segundo a Anfavea, se o Brasil quiser acompanhar o movimento global de eletrificação, será necessário investir R$ 50 bilhões em infraestrutura até 2035, com a instalação de 150 mil eletropostos. Esses aportes impactariam também os fornecedores e as redes concessionárias.

Mas a expansão das redes de recarga e do fornecimento de energia podem fazer do país uma referência global em eletrificação.

A pedido da General Motors, a AEA (Associação Brasileira de Engenharia Automotiva) fez um estudo e concluiu que, no Brasil, um carro 100% elétrico é dez vezes mais eficiente do que um modelo movido a gasolina.

A pesquisa levou em consideração a matriz energética do país. Em nota, a GM disse que 84% da energia elétrica vem de fontes renováveis, como a hídrica, a solar e a eólica.

Os empresários envolvidos têm pressa. Para Davi Bertoncello, da Tupinambá Energia, o interesse do brasileiro pelas novas tecnologias cresce rapidamente.

"Recentemente realizamos uma pesquisa quantitativa de intenção de compra de carros elétricos e híbridos e descobrimos que cerca de 58% dos brasileiros que pretendem comprar um automóvel querem modelos desse tipo", afirma o CEO.

"O perfil desse público é composto, em sua maioria [57%], por mulheres de maior renda e escolaridade que estão no mercado de trabalho."

O levantamento feito em 2022 coletou dados de pessoas que declararam ter vontade de trocar de veículo nos próximos três anos.

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