Onça-parda celebridade é capturada em Hollywood após atacar chihuahuas

Futuro do animal, com idade avançada, é incerto; eutanásia não está descartada

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Los Angeles

O morador mais famoso e recluso de Hollywood Hills não é uma celebridade do cinema e, sim, do mundo selvagem: uma onça-parda de 55 quilos. Por dez anos, o animal viveu livremente na região, fazendo aparições noturnas nas câmeras das mansões nas colinas e se alimentando de veados no Griffith Park.

Mas tal equilíbrio foi quebrado nas últimas semanas. O felino atacou dois chihuahuas que passeavam na coleira com seus donos, em ocasiões diferentes. Na primeira, o cãozinho morreu, e na segunda o dono conseguiu salvar o cachorro após contra-atacar a onça-parda, uma espécie também conhecida como puma e leão de montanha.

O comportamento inesperado levou à captura de P-22, seu nome oficial, na segunda-feira (12), por biólogos do National Park Service (NPS), agência federal que acompanha os animais nas Montanhas de Santa Mônica, em Los Angeles, desde 2002. O nome P-22 vem de puma, e o número vem da sequência de pumas registrados.

Onça-parda anda à noite entre pedras
Onça-parda (também chamada de puma) P-22 em área de Los Angeles; felino, que foi capturado nesta semana após atacar dois cachorros chihuahua, virou símbolo de parque da cidade - Miguel Ordenaña/Natural History Museum/Divulgação

O futuro da onça de Hollywood é incerto. Eutanásia não está descartada, já que seu estado de saúde é precário, mas há a possibilidade de transferência para um santuário.

"P-22 pode não voltar ao Griffith Park, mas seu legado para Los Angeles não será perdido", disse à Folha a diretora da National Wildlife Federation na Califórnia, Beth Pratt, uma porta-voz informal do felino que lidera um festival anual em sua homenagem.

"Ele nos mostrou o que é possível. Mesmo com todas as rodovias e construções, um puma ainda pode criar um lar na segunda maior cidade do país [EUA]. Ainda não sabemos o que há de errado com ele, mas ver todo o apoio que ele está recebendo em Los Angeles e no mundo me dá esperança."

Na manhã de segunda-feira, P-22 foi capturado com ajuda de um dardo tranquilizante enquanto se escondia no quintal de uma casa no bairro vizinho de Los Feliz. Os donos da propriedade não tinham ideia da presença do animal, rastreado por coleira desde 2012.

Exames iniciais mostraram que P-22 está significativamente abaixo do peso e tem uma lesão no olho direito, uma possível consequência de um atropelamento no final de semana. Ele recebeu fluidos com vitaminas para desidratação, anti-inflamatório, antibiótico e antiparasitário.

No momento, P-22 está num hospital veterinário dedicado a animais silvestres.

Pratt disse que chorou "lágrimas de alívio" ao saber que a onça-parda havia sido capturada com segurança pelo amigo e biólogo da NPS Jeff Sikich. "P-22 está agora numa área tranquila do hospital, longe de pessoas e sendo observado por câmeras", disse Pratt, autora do livro "When Mountain Lions Are Neighbors" (quando leões da montanha são vizinhos, ed. Heyday).

Mulher loira segura cartaz de animal; ao fundo há cartaz com o letreiro de Hollywood
Beth Pratt, diretora da National Wildlife Federation na Califórnia, com cartaz da onça-parda P-22; ela organiza festival em homenagem ao animal no Griffith Park, em Los Angeles, desde 2015 - Arquivo Pessoal

A onça-parda ganhou status de celebridade ao ser descoberta em 2012 por câmeras instaladas no Griffith Park. O parque, uma área montanhosa com 4.000 acres (cerca de 16 km2), é visitado por 10 milhões de pessoas por ano e guarda zoológico, museu, observatório, campo de golfe, dezenas de trilhas e o letreiro de Hollywood.

A surpresa foi enorme: para chegar ali, P-22 teve que cruzar duas das mais movimentadas freeways do país, além dos bairros de Bel Air e Beverly Hills. No parque, ele viveu sozinho, sem parceiras. Hoje, está com 12 ou 13 anos, idade avançada para a espécie.

Dezenas de pumas já morreram cruzando as rodovias, o caso mais recente no mês passado. As freeways 101 e 405 cortam as Montanhas de Santa Mônica, onde habitam de dez a 15 pumas jovens e adultos, isolando as populações de diversas espécies.

Para resolver o problema, diferentes agências e ativistas estão há duas décadas planejando a construção de uma travessia florestal sobre a 101 para conectar habitats. Em 2022, as obras finalmente começaram em Agoura Hills, noroeste de Los Angeles. O projeto de US$ 85 milhões (R$ 448 mi) será o maior corredor selvagem do mundo numa região urbana.

Viaduto com vegetação passa em cima de estrada
Projeção artística da travessia para animais que está sendo construída em Los Angeles; obra deve proteger onças-pardas e outros bichos que vivem no entorno da cidade - Divulgação

"Monitoramos essa região com muitas câmeras faz sete anos. Vimos de tudo, linces, veados, gambás e, apenas três dias atrás, vimos P-77, um jovem puma. Ele veio até esse morro, a 50 metros de onde estará a travessia", disse à reportagem o biólogo da NPS Jeff Sikich, num evento de início das obras, em setembro.

"Gosto de pensar que, se a ponte já estivesse aqui, P-77 teria atravessado. ElE seria um acréscimo importante para a baixíssima diversidade genética dos pumas do outro lado."

Sikich estava no time da NPS que capturou P-22 em 2012, quando checaram sua saúde e lhe deram uma coleira com rastreador. Em 2014, ao ser capturado de novo para um exame de rotina, o felino estava doente, provavelmente envenenado após consumir algum animal que havia ingerido raticida. Ele foi tratado e devolvido ao parque.

"Ataques de leões da montanha contra pessoas são extremamente raros. Nossas pesquisas de 20 anos, nesta cidade com milhões de habitantes, mostram que os pumas fazem o melhor para nos evitar", disse Sikich, que já rastreou mais de cem onças-pardas, as mais recentes neste mês (quatro filhotes do animal P-99).

"Às vezes, as onças-pardas cruzam nossos quintais ou aparecem em nossas câmeras, mas elas preferem nos evitar e evitam áreas com construções. Elas preferem a natureza."

Por causa da fama, P-22 virou garoto-propaganda do corredor e da luta pela proibição da venda de veneno de rato, do qual já foi vítima. Desde 2015, um festival no Griffith Park celebra sua existência, organizado pela National Wildlife Federation.

Pratt, que tem uma tatuagem de P-22 no braço, inicia o evento com uma caminhada de 80 km para simular a travessia que ele fez até o parque. Na trilha, ela usa no pescoço uma coleira de rastreamento de 900 gramas, a mesma utilizada nos pumas, para mostrar que o aparelho é seguro. Ao final do festival, a coleira é doada ao programa da NPS.

Com a provável futura ausência de P-22 no Griffith Park, Pratt promete continuar com o festival e sua caminhada. "Vou seguir honrando seu legado até consertarmos esse terrível problema de conectividade do qual ele é vítima e construirmos mais travessias de vida selvagem", disse.

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