Descrição de chapéu Financial Times mudança climática

Evento sobre clima nos Emirados Árabes alerta palestrantes para não 'criticar corporações'

Ativistas estão alarmados com aviso de 'não protestem' no país que vai sediar a COP28

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Aime Williams Attracta Mooney
Financial Times

Os oradores de uma conferência sobre clima e saúde em março nos Emirados Árabes Unidos, país que vai sediar a cúpula climática COP28 da ONU neste ano, foram instruídos a não protestar ou "criticar corporações", num alerta que citou as leis do estado do Golfo e alarmou os ativistas.

Os organizadores aconselharam os participantes do evento Forecasting Healthy Futures (Prevendo Futuros Saudáveis) no mês passado em Abu Dhabi, capital dos Emirados e seu membro mais rico, a "estarem cientes e respeitarem as leis dos EAU", e alertaram: "Não critiquem o islã, o governo, corporações ou indivíduos dos Emirados Árabes Unidos" e "não protestem".

A orientação escrita, vista pelo Financial Times, acrescentava: "Entendemos que a mudança climática pode ser um assunto controverso e acolhemos todas as perspectivas e opiniões no discurso civil em toda a agenda do programa. Protestar é ilegal nos Emirados Árabes Unidos, e qualquer caso de protesto perturbador será resolvido pelas autoridades locais".

Bomba de petróleo em meio a dunas de areia com uma montanha árida no fundo
Extração de petróleo em dunas do deserto de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos - Giuseppe Cacace - 30.ago.2022/AFP

Ativistas climáticos disseram que as restrições à liberdade de expressão levantam mais questões sobre a adequação dos EAU, ricos em petróleo, para sediarem a cúpula climática anual da ONU, que acontecerá em novembro e dezembro. Cientistas de renome alertaram para uma "janela de fechamento rápido" para limitar o aquecimento global a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais.

"Isso é profundamente preocupante", disse Collin Rees, do grupo climático Oil Change International, dos EUA. "A linguagem adotada aqui não pode ser aceitável nas negociações climáticas. Deve haver forte resistência a isso, e a ONU deve oferecer um lugar o mais forte possível para a próxima COP."

Grandes protestos são frequentemente organizados durante o evento climático anual. Cerca de 100 mil pessoas foram às ruas de Glasgow (Escócia) em um único dia quando o Reino Unido sediou a COP26. Grupos da sociedade civil críticos das empresas de combustíveis fósseis participam da cúpula em grande número.

A conferência sobre saúde no contexto das mudanças do clima foi organizada pelo Forecasting Healthy Futures (FHF), grupo de organizações de saúde e tecnologia reunidas pelo Malaria No More.

De acordo com o site do evento, o financiamento inicial para a FHF foi fornecido pelo Reaching the Last Mile, grupo de saúde pública e desenvolvimento ligado ao presidente dos Emirados Árabes Unidos, Mohammed bin Zayed al-Nahyan.

A Forecasting Healthy Futures disse que o grupo não recebeu "orientação" do Reaching the Last Mile "ou de qualquer outro indivíduo ou instituição dos Emirados".

E acrescentou: "No interesse de proteger os palestrantes e membros do painel de qualquer violação real ou percebida da lei dos Emirados Árabes Unidos, e dada a esperada cobertura online do evento, com o potencial de citações incorretas ou descaracterização, erramos por excesso de cautela ao emitir de forma independente orientações que cobrem a interpretação mais ampla do código penal dos EAU sobre difamação".

Majid al-Suwaidi, diretor-geral da COP28, fez um discurso de abertura na conferência da FHF, divulgando a próxima cúpula como aquela que adotará uma abordagem "inclusiva" para enfrentar as mudanças climáticas.

Homem discursando
Sultan Ahmed al-Jaber, ministro e CEO da gigante estatal do petróleo Abu Dhabi National Oil Company (Adnoc), que vai presidir a COP28, em palestra em evento - Karim Sahib - 14.jan.2023/AFP

Lise Masson, diretora de justiça climática e defesa de energia da Friends of the Earth International, disse que as conferências da COP há muito sofrem de "captura corporativa". "Estamos nos preparando para que esta COP seja uma versão extrema e intensa de algo que não é novo", disse ela.

Cherelle Blazer, diretora sênior do Sierra Club, grupo climático dos Estados Unidos, disse que é "de vital importância" que membros de grupos da sociedade civil participem da COP, apesar de ela se realizar em "um local hostil a protestos".

O país anfitrião já está sob escrutínio devido à nomeação do sultão al-Jaber, chefe da empresa estatal de petróleo Adnoc, de Abu Dhabi, para a presidência da COP28.

A cúpula da COP do ano passado no Egito terminou em decepção para muitos, já que os países produtores de combustíveis fósseis, incluindo a Arábia Saudita, bloquearam a pressão de outros para incluir no acordo final a promessa de reduzir gradualmente todos os combustíveis fósseis.

Um porta-voz da COP28 dos EAU disse que a conferência "adotará uma abordagem inclusiva, envolvendo todas as partes interessadas dos setores público e privado, sociedade civil, comunidade científica, mulheres e jovens" e "dará as boas-vindas a diálogos inclusivos e construtivos que facilitem a formação de consenso para promover resultados climáticos ambiciosos".

Eles disseram que os organizadores garantiriam "que existam espaços seguros onde todas as vozes possam ser ouvidas".

A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC, na sigla em inglês), que supervisiona a cúpula, disse que o local da COP seria um "espaço extraterritorial" administrado pela ONU.

"A participação significativa de todos os atores da sociedade no processo da UNFCCC e na Conferência das Partes (COP) anual é um ingrediente indispensável para o sucesso desses eventos", afirmou.

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