Obra em córrego de Ilhabela (SP) sem licitação gera impasse

Contrato foi firmado com base em decreto de calamidade; prefeito diz que dragagem é necessária

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Caraguatatuba (SP)

Uma obra para o desassoreamento de um córrego em Ilhabela, no litoral paulista, gerou um impasse. A prefeitura contratou sem licitação uma empresa para efetuar a dragagem, mas o Ministério Público acionou a Justiça e exige que o serviço seja iniciado só com autorização dos órgãos ambientais.

O contrato, no valor de R$ 13,5 milhões, foi firmado com base no decreto estadual nº 67.502, de 19 de fevereiro de 2023, que estabeleceu estado de calamidade pública no município devido às fortes chuvas no período do Carnaval.

O prefeito Toninho Colucci (PL) nega ter se aproveitado do documento para contratar a empresa sem licitação e diz que a obra é necessária.

foto de córrego com areia e floresta e montanha ao fundo
Córrego Água Branca, em Ilhabela (SP); intenção da prefeitura de fazer obra para desassoreamento gera impasse com Ministério Público - Acervo Coletivo SOS

A dragagem foi planejada para o córrego da Água Branca, também conhecido como rio Paquera, o maior rio de Ilhabela, que cruza o parque estadual e deságua na praia da Barra Velha. A administração diz que seu leito está assoreado e que, em caso de temporal, poderá haver alagamento e enchentes.

A prefeitura não procurou a Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), segundo a estatal. O prefeito afirma que foi feita consulta ao Daee (Departamento de Águas e Energia Elétrica), que não teria emitido licenciamento, mas, segundo ele, não se opôs à realização da obra.

Procurado, o Daee diz que a prefeitura fez no dia 9 de março uma consulta sobre obras emergenciais no córrego, acompanhado de laudo da Defesa Civil.

No dia seguinte, o órgão estadual deferiu o pedido da prefeitura, ressaltando, entretanto, que a responsabilidade sobre os serviços a serem executados, bem como a disposição do material retirado, é do órgão que solicitar a execução, observada a legislação ambiental sobre o assunto.

Ao tomar conhecimento do contrato, o Ministério Público acionou a Justiça. O promotor Tadeu Salgado Badaró Junior, do Gaema (Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente), entrou com uma ação exigindo que a obra só seja liberada após autorizações de Cetesb e Daee.

Segundo o promotor, há uma ação ajuizada em janeiro de 2020 com pedido liminar —portanto, antes ainda da tragédia registrada neste ano— para que o município se abstenha de realizar ações de desassoreamento do córrego da Água Branca sem prévio aval de órgãos ambientais.

Segundo a Cetesb, somente com autorização a prefeitura poderá intervir no córrego, por se tratar de uma APP (Área de Preservação Permanente).

Impacto ao manguezal e vida marinha

Contrários à obra, moradores e ambientalistas de Ilhabela recorreram ao Ministério Público no último dia 23 para tentar impedir o início da obra.

Segundo a advogada e ambientalista Gysele Bastos, além da falta de licença, a obra pode pôr em risco o ecossistema do córrego, que integra a APP marinha do litoral norte, que mantém áreas de manguezal e marisma. O temor é que o manguezal seja afetado com a movimentação de equipamentos para retirar lama.

"Não houve consulta ao Conselho Municipal de Meio Ambiente, conforme determina a legislação", diz Bastos.

Moradora de Ilhabela, Gilda Nunes, ambientalista que atua no IIS (Instituto Ilhabela Sustentável), também é contrária à dragagem.

"Faz anos que a prefeitura quer fazer essa obra, sem licenciamento e sem licitação, mas se trata de uma área de proteção ambiental marinha e deve ser preservada pela sua importância ambiental. É um verdadeiro oásis dentro da cidade."

Moradores também questionaram o motivo da obra ao TCE (Tribunal de Contas do Estado) de São Paulo, com o pedido de revisão do contrato licitatório.

A licitação foi feita com a empresa DP Barros Pavimentação e Construção Ltda. Marcelo Oliveira, diretor da empresa, afirma que os equipamentos e o pessoal já foram contratados, mas que aguarda a ordem de início de serviço pela prefeitura.

A dragagem, segundo ele, deverá ser feita entre três e seis meses, sem riscos ao meio ambiente. "Os equipamentos irão trabalhar embarcados sobre balsa, no leito do rio, e não nas margens."

A empresa tem experiência de 11 anos nesse tipo de serviço, segundo Oliveira, atuando nas dragagens dos rios Pinheiros e Tietê. O diretor afirma ainda que questões de licenciamentos e autorizações devem ser resolvidas pela prefeitura.

O prefeito Toninho Colucci diz que a obra é necessária. "Choveu e muito material foi carreado para o leito do rio, que em alguns trechos está com meio metro de altura. Se chuvas voltarem com intensidade, poderá causar alagamentos e até mortes."

Colucci afirma que, "se depender do licenciamento, será uma via-crúcis imensa". "A lei me faculta essa possibilidade por tratar-se de obra emergencial. Não iremos causar danos ambientais, iremos apenas mexer no leito do rio, desassorear para que possa receber maior volume de água nos períodos de chuva."

"Entendo que posso contratar e fazer a obra emergencial, mas, se Ministério Público entender que não, vou parar tudo e investir o recurso em obras de pavimentação. A população ficará mais feliz", afirma Colucci.

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