Cadeia global de alimentos emite mais carbono que países europeus e Rússia

Estudo contabilizou uso de energia fóssil nos sistemas alimentares, que empregam 15% dos combustíveis fósseis emitidos no mundo

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São Paulo

A produção de alimentos consome pelo menos 15% dos combustíveis fósseis queimados anualmente no mundo. A quantidade —4,6 gigatoneladas de carbono— equivale à soma das emissões dos países da União Europeia e ainda a Rússia. A conclusão é de um estudo publicado nesta quarta-feira (1º) pela Dalberg Advisors, sob encomenda da Aliança Global pelo Futuro da Alimentação.

É a primeira vez que um estudo contabiliza as emissões globais dos combustíveis fósseis usados nos sistemas alimentares como um todo —do plantio até o prato. Os pesquisadores chegaram à estimativa global de 15% com base em dados já publicados sobre a dependência de energia fóssil nos sistemas alimentares dos Estados Unidos (13,6%), União Europeia (13%), Índia (13%) e Brasil (14%).

"Ainda que todos os governos cumprissem os respectivos compromissos climáticos para 2030, o uso de combustíveis fósseis no nosso sistema alimentar continuaria a comprometer as nossas metas [de manter o aquecimento global abaixo de] 1,5ºC até 2037", diz o estudo.

Grãos de soja voam enquanto dois homens parecem mexê-los com pás
Trabalhadores na produção de soja na província de Heilongjiang, na China - Wang Jianwei - 10.jan.2023/Xinhua

A maior parte do combustível fóssil queima durante o estágio de processamento e embalagem (42%), seguida das fases de consumo e descarte (38%). O estudo observa que o alto consumo de produtos ultraprocessados implica maior uso de energia e, portanto, mais emissões de carbono.

As fases agrícola e industrial dão conta dos outros 20% do uso de energia fóssil na cadeia de produção dos alimentos.

O estudo não contabiliza outras fontes de emissão de gases-estufa nos sistemas alimentares, como aquelas geradas pelo desmatamento e pelo uso de fertilizantes e que colocam sob o setor agrícola mais responsabilidade pela conta de emissões das cadeias produtivas.

O foco nas emissões ligadas a combustíveis fósseis busca dar um recado político à organização da COP28, conferência do clima da ONU.

Isso porque os anfitriões da COP28 —que será presidida pelo CEO da petroleira Adnoc, Sultan Al Jaber, que também é ministro da Indústria dos Emirados Árabes— elegeram o tema da alimentação como uma prioridade para as discussões da conferência, embora o principal desafio da crise climática seja outro: justamente, o fim dos combustíveis fósseis.

Por outro lado, a análise aponta outros investimentos do setor petroleiro nos sistemas alimentares.

"Só nos EUA, foram projetados investimentos em petroquímicos no valor de US$ 164 bilhões para o período 2016-2023. Os plásticos relacionados com a alimentação e os fertilizantes representam, juntos, cerca de 40% dos produtos petroquímicos", diz o estudo.

Já no Brasil, o desmatamento é o maior vetor de emissões dos sistemas alimentares, que respondem por 73,7% das emissões do país, segundo uma estimativa produzida pelo Observatório do Clima e publicada na última semana.

Do total de 1,19 gigatonelada de carbono emitida por desmatamento no Brasil em 2021, pelo menos 1,01 gigatonelada está ligada aos sistemas alimentares, sendo que a produção de carne bovina responde sozinha por 0,98 gigatonelada de carbono emitida por desmatamento.

Segundo a FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), aproximadamente dois terços das emissões dos sistemas alimentares no mundo vêm da agricultura e do desmatamento.

"O número é mais elevado nos países em desenvolvimento, mas também diminui significativamente à medida que o desmatamento diminui e o processamento de alimentos, a refrigeração e outras atividades aumentam ao longo da cadeia produtiva", diz relatório da FAO produzido em 2021. Na época, com dados de 2015, o estudo apontou que os sistemas alimentares respondem por um terço das emissões globais de carbono.

Embora o novo estudo da Aliança Global foque suas estimativas apenas nas emissões vindas da energia fóssil, as recomendações são amplas e incluem desde o uso de energias renováveis e a busca da eficiência energética até mesmo a mudança do padrão de dieta.

"Mudando para dietas ricas em vegetais e minimamente processadas, particularmente onde o consumo de carne e gordura saturada é elevado, há potencial para reduzir 49% da intensidade energética dos sistemas alimentares e gerar cobenefícios para a saúde", afirma o estudo.

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