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Minas e Energia pressiona Ibama contra revisão da licença de Belo Monte

Alexandre Silveira propôs resolução ao CNPE, órgão assessor de Lula, contra redução na capacidade da hidrelétrica

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Brasília

Em meio ao processo de revisão da licença ambiental da usina de Belo Monte, no Pará, o Ministério de Minas e Energia tenta pressionar contra mudanças que possam reduzir o tamanho do desvio de água do rio Xingu para a geração hidrelétrica.

O ministro Alexandre Silveira preparou uma resolução, à qual a Folha teve acesso, que classifica a usina como de importância para a segurança energética nacional e recomenda que o ministério passe a participar do monitoramento das condicionantes socioambientais de funcionamento da usina.

O documento precisa ser votado pelo CNPE (Conselho Nacional de Política Energética), presidido também por Silveira e do qual participam diversos outros ministros.

Usina de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará
Usina de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará - Lalo de Almeida - 19.set.2022/Folhapress

Anexada, há uma carta, endereçada ao presidente Lula (PT), com justificativas para a resolução —o conselho é formalmente um órgão de assessoramento da Presidência em temas de política energética.

"Cabe observar que alterações nas condições originais previstas na outorga da usina causariam impacto direto na capacidade de geração de energia pela UHE Belo Monte, com consequências negativas para as tarifas de energia elétrica de todos os consumidores de energia elétrica do país", diz o texto destinado ao chefe do Executivo.

"Essas são, senhor presidente, as razões que justificam o encaminhamento da presente proposta de reconhecimento da importância estratégica da Usina Hidrelétrica de Belo Monte para a garantia da segurança energética nacional, por meio de Resolução do Conselho Nacional de Política Energética."

As condicionantes foram determinadas no processo de licenciamento ambiental da usina e compõe uma série de compromissos que o empreendimento, operado pela Norte Energia, tem que cumprir para funcionar.

A licença para a construção de Belo Monte foi um dos motivos que acirrou a relação entre a atual ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e Lula no primeiro governo do petista.

Com os dois de volta aos postos, a autorização, que venceu em 2021, está em processo de revisão pelo Ibama (Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais e Renováveis), que pode determinar se ela será, ou não, renovada —até o fim da análise técnica, a usina pode funcionar.

Enquanto pescadores ribeirinhos da região e movimentos sociais pedem a reparação, o próprio órgão, em uma nota técnica, entende que a suspensão da autorização levaria a prejuízos ao meio ambiente, à gestão ambiental do empreendimento e a graves consequências sociais na região

Um dos pontos de principal atenção, e sob o qual o Ministério de Minas e Energia tem preocupação, é o chamado hidrograma de vazão —a quantidade de água que a usina desvia do rio Xingu para a geração de energia.

Desde antes do início da operação da usina, entidades ambientais alertam para o fato de que a hidrelétrica colocaria em risco a sobrevivência dos rio e das comunidades que dele subsistem, ao diminuir em excesso o fluxo natural das águas.

Desde o início da operação da usina, essa vazão é questionada por órgãos como o Ministério Público Federal e pelo próprio Ibama. Atualmente, está em vigor um acordo com a Norte Energia que restringe o desvio do rio para a usina.

O termo, no entanto, vale até dezembro de 2023.

Mesmo se a resolução proposta por Alexandre Silveira for aprovada, a decisão final sobre a renovação da licença segue com o Ibama.

"O acompanhamento de condicionantes das licenças ambientais cabe essencialmente ao órgão licenciador. O ICMBio, a Funai e outros órgãos públicos participam desse processo", diz Suely Araújo, ex-presidente do instituto e coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima.

"No processo de renovação, temas como os sérios problemas existentes na zona de vazão reduzida ou as dificuldades com os ribeirinhos terão de ser enfrentados. O Ibama vai analisar como ficam as condicionantes e dará a palavra final, independentemente de pressões políticas ou de eventual resolução do CNPE", completa.

Para Elisa Mergulhão, da coordenação nacional do MAB (Movimento Atingidos por Barragens) e que acompanha o caso de Belo Monte, "estando no governo Lula, esperamos ter uma oportunidade melhor de discutir outras condições para essa renovação da licença, contando com maior participação popular".

Ela afirma ainda que uma série de condicionantes precisam ser cuidadosamente analisadas, pois não foram inteira ou parcialmente cumpridas, em especial a que toca o hidrograma, para aumentar a proteção ao meio ambiente e às comunidades afetadas.

"Este hidrograma [em vigor] foi proposto pelo empreendedor", lembra.

Procurados, MME e Ibama não se manifestaram. A Norte Energia preferiu não comentar o assunto.

O tema estava previsto na pauta de uma sessão extraordinária do CNPE, marcada para a próxima quinta-feira (23). A agenda, no entanto, foi cancelada. A reunião ordinária do conselho, mesmo assim, está prevista para acontecer em 7 de dezembro.

A resolução, assinada por Silveira, reconhece Belo Monte "como de interesse público para garantia da segurança energética do país", e justifica essa condição pela "sua potência instalada de 11.233 MW [megawatts]" —capacidade que seria reduzida se o desvio do rio Xingu fosse menor.

Classifica também a hidrelétrica como "energia limpa, renovável" e recomenda que o Ministério de Minas e Energia, junto com o do Meio Ambiente e o dos Povos Indígenas, "monitore as ações socioambientais desenvolvidas" pela Norte Energia, "visando ao cumprimento das condicionantes".

A proposta da minuta vem acompanhada de uma nota técnica da pasta, que se posiciona contra qualquer tipo de aumento na preservação do curso natural do Xingu —ou seja, defende que não seja reduzido o desvio de água destinado à usina.

O argumento da pasta é de que diminuir o fluxo da hidrelétrica poderia aumentar o preço da conta de luz em 1,7%.

Ele também alerta para que uma possível mudança pode "afetar a segurança do suprimento eletroenergético do SIN", o sistema nacional de energia elétrica.

O ministério ainda argumenta que medidas de redução do desvio de água do rio Xingu, que busquem mitigar o impacto ambiental da usina, podem comprometer o "equilíbrio econômico-financeiro do empreendimento", o que colocaria em xeque o funcionamento dos programas de proteção ambiental promovidos por ele.

Sobre a participação da pasta no processo de acompanhamento das condicionantes ambientais, o documento diz que isso visa "dar celeridade às emissões de licenças e autorizações necessárias para a realização das obras de eletrificação e instalações de sistemas de geração de energia elétrica".

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