França não planeja doar para Fundo Amazônia durante visita de Macron, apesar de pedido do Brasil

Europeus falam em contribuir financeiramente a partir de outros instrumentos

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Brasília

Apesar de pedido do governo Lula (PT), a França não planeja anunciar doação para o Fundo Amazônia, o principal mecanismo de financiamento de ações de preservação no bioma, durante a visita do presidente Emmanuel Macron ao Brasil.

Segundo uma fonte da diplomacia francesa, sob condição de anonimato, os europeus não planejam utilizar o Fundo Amazônia como principal vetor de investimento nessa área, mas privilegiar outros instrumentos para doações e empréstimos tanto com dinheiro público como privado para ações voltadas ao meio ambiente.

Retrato de Macron
O presidente da França, Emmanuel Macron. - Sameer Al-Doumy- 21.mar.2024/AFP

Lançado em 2008, o Fundo Amazônia funciona com pagamentos baseados em resultados de conservação da floresta. Ele tem a Noruega como o principal doador e ficou praticamente paralisado durante os quatro anos do governo Jair Bolsonaro (PL). Com a vitória do presidente Lula, outros países anunciaram aportes no mecanismo.

A Noruega é o país que de longe mais contribuiu com o fundo desde a sua criação, com num total de quase R$ 3,2 bilhões. Em segundo lugar, vem a Alemanha (R$ 299 milhões).

Quando chegou ao Palácio do Planalto pela terceira vez, o governo Lula aproveitou reuniões com autoridades internacionais para empoderar o fundo. Houve promessas de doação dos Estados Unidos, Reino Unido, Dinamarca, União Europeia, Japão e Suíça.

Os doadores tradicionais, Noruega e Alemanha, também fizeram compromissos adicionais.

De acordo com pessoas que acompanharam as tratativas, o governo Lula chegou a pleitear à França para tentar emplacar um anúncio para o Fundo Amazônia na ocasião da visita de Macron.

Em fevereiro de 2023, a então chanceler francesa, Catherine Colonna, disse em passagem pelo Brasil que a França estudava a possibilidade de contribuir para o Fundo Amazônia.

Segundo relatos ouvidos pela Folha, os negociadores da França colocaram óbices para atender ao pedido brasileiro. Eles sinalizaram disposição de contribuir com um fundo para preservação ambiental vinculado à ONU (Organização das Nações Unidas), sob o argumento de que os recursos poderiam também ser destinados para ações de proteção da biodiversidade e de combate à pobreza.

O lado brasileiro viu com ressalva essa possibilidade, por considerar que o Fundo Amazônia já tem a governança adequada para o financiamento mais eficiente em ações de preservação, além de ter apresentado resultados positivos ao longo da sua história.

Macron realiza na próxima semana uma visita de três dias ao Brasil. Ele desembarca em Belém no dia 26, vindo da Guiana Francesa (território do país europeu). Também passa por Itaguaí (RJ) —para visitar o estaleiro onde ocorre a cooperação entre os dois países em submarinos—, São Paulo e Brasília.

A agenda em Belém, sede da COP30 no ano que vem, tem forte componente ambiental. Entre os compromissos, há uma reunião de Macron e Lula com o cacique Raoni e outras lideranças indígenas.

Ao ser questionada sobre o Fundo Amazônia, a fonte da diplomacia francesa disse que o país pretende centrar esforços de cooperação em outros mecanismos.

Ela citou maior engajamento da AFD (Agência Francesa de Desenvolvimento), destacando o papel da instituição em parcerias com organismos brasileiros, como o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e o Basa (Banco da Amazônia).

Em outubro do ano passado, a AFD assinou um memorando de entendimento com o BNDES visando apoiar conjuntamente até 500 milhões de euros em projetos no Brasil. Entre os objetivos, estava a criação e implementação de novos instrumentos para atuação do banco de fomento brasileiro em finanças sustentáveis e climática.

A ideia, segundo essa fonte diplomática, é incrementar esforços de cooperação científica que já existem com instituições francesas, como IRD (Instituto de Pesquisa para Desenvolvimento) e Cirad (Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvimento), e desenvolver novos modelos, além de utilizar ferramentas "mais tradicionais".

A eventual criação de um instituto de biodiversidade entre os dois países também fará parte de uma "reflexão conjunta", de acordo com um diplomata francês. Na visita de Macron, está prevista a divulgação de iniciativas que contemplem o desenvolvimento conjunto da região amazônica abrangendo tanto o Brasil como a Guiana Francesa.

Lula e Macron são aliados na arena internacional. O francês é visto como o principal interlocutor de Lula na Europa. Em 2021, o então pré-candidato Lula foi recebido com honrarias no Palácio do Eliseu, em Paris. O gesto foi uma provocação do europeu contra o então presidente Jair Bolsonaro (PL), que anos antes havia destratado o chanceler francês ao não recebê-lo no Palácio do Planalto para transmitir uma live cortando o cabelo.

Ainda na área ambiental, o governo Macron tem pedido que o Brasil endosse um pacto lançado por Paris em junho do ano passado sobre sustentabilidade. Lula chegou a participar da cerimônia na capital francesa, mas o Brasil ainda não apoiou formalmente o documento.

A principal razão é que os negociadores brasileiros entendem que os temas levantados pelo pacto deveriam ser tratados no âmbito das reuniões multilaterais ambientais.

Além do mais, o documento lançado pela França não traz o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Trata-se de peça-chave nas negociações climáticas para os países emergentes, que defendem que as nações ricas —que se industrializaram antes e portanto historicamente poluíram mais— têm maior responsabilidade na luta contra o aquecimento global.

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