Açafrão-da-terra tempera a renda de família no norte de Minas Gerais
Produtores tentam obter o máximo de pequenas áreas de cultivo, sem depredar o cerrado
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A casinha de Aroldo Mendes Barbosa no projeto de assentamento de reforma agrária Rancharia, a 35 km de Arinos (MG), tem uma parede coberta pelo desenho de um grande automóvel azul, em traços infantis. O filho João Paulo Pereira Mendes, 23, ri ao confessar que é obra sua.
João Paulo mora hoje na cidade, depois de formar-se em agronomia no IFNMG (Instituto Federal do Norte de Minas Gerais), onde cursou também o ensino médio. Com o pai mora só João Vítor, 16, o único irmão.
A área de 43 hectares, dos quais menos de 10% foram abertos com derrubada de cerrado, tem meio hectare onde predomina o verde brilhante de grandes folhas junto ao chão. São centenas de pés de açafrão-da-terra, raiz de um amarelo intenso, aparentada com o gengibre, com que se faz o tempero popular no interior do Brasil.
O açafrão brota em meio a muitas árvores, pés de acerola, banana, goiaba, mamão, baru, jabuticaba, seriguela, araçá, guariroba (palmito amargo) e pitanga. Esse consórcio de espécies arbóreas, frutíferas e rasteiras compõe o que se chama de sistema agroflorestal, mais conhecido pela abreviação SAF.
O conceito é obter o máximo de renda em pequenas áreas de cultivo, de modo a evitar a derrubada de áreas maiores de vegetação natural para plantio de culturas tradicionais como feijão, arroz e milho —ou, maiores ainda, para pastagem.
Aroldo vendeu as últimas cabeças de gado depois de contemplado no Projeto Ecoforte da Copabase (Cooperativa Regional de Agricultura Familar e Extrativismo), cuja sede fica no campus do IFNMG. Como ele, outras mil famílias receberam capacitação em agroecologia, e 53 unidades produtivas obtiveram recursos para implantar um SAF.
No caso de Aroldo, o investimento foi de cerca de R$ 8.000, entre mudas e material para implantar irrigação. A família entrou com a terra e a mão de obra, e o agrônomo João Paulo ainda obteve um emprego como técnico da Copabase, onde ganha R$ 1.400 mensais.
Em um ano, de julho de 2020 a julho de 2021, o trio colheu 1.250 kg de raízes de açafrão. Depois de fatiadas, secas e moídas em moinho, 150 kg do pó resultante foram vendidos a R$ 50 o quilo, uma renda de R$ 7.500.
De fruteiras a renda obtida é ainda melhor. Eles chegam a colher, em meio hectare, sete toneladas de goiaba e três de acerola, cuja venda retornaria R$ 14.500 —fora o que conseguem vendendo coquinhos azedos coletados das palmeiras baixas que pululam na mata preservada.
No entanto, dadas as dificuldades na venda dos frutos impostas pela pandemia, com a suspensão de aulas e da merenda em escolas públicas que absorve a produção de polpa, o resultado caiu para R$ 5.000 em 2021.
A Copabase foi fundada em 2008. Sua área de atuação é o noroeste de Minas Gerais, na microrregião Urucuia Grande Sertão, próxima ao Parque Nacional Grande Sertão Veredas.
Um de seus trunfos, além do programa Ecoforte, é a organização da cadeia de produção, beneficiamento e comercialização do baru, castanha do cerrado com crescente demanda nacional e internacional.
Após 13 anos, a cooperativa deu um salto em 2021 com a entrada em canais de venda como Central do Cerrado e Mercado Livre. Passou ainda a exportar baru para os Estados Unidos.
Outro marco deste ano foi a certificação Ticca (Territórios Indígenas e Áreas Conservadas por Comunidades Locais) para comunidades que integram a cooperativa. O reconhecimento internacional será útil para abrir portas em mercados que valorizam as práticas de comércio justo e socioambientalmente sustentáveis.
Os jornalistas Lalo de Almeida e Marcelo Leite viajaram a convite do IEB (Institu to Internacional de Educação do Brasil ) e do CEPF (Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos).
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