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Não precisamos de você, já taxamos poluidores, diz ministro francês a ativista do Greenpeace

Cúpula do Novo Pacto Financeiro discute recursos para países mais vulneráveis ao clima; Lula chegou a Paris nesta quinta

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Paris

"Faça com que os poluidores paguem", diz uma faixa assinada pelo Greenpeace e rapidamente estendida por uma ativista à frente do palco da Cúpula do Novo Pacto Financeiro, diante de uma plateia de chefes de Estado e de governo, diretores de bancos e instituições multilaterais.

O ato durou poucos segundos, durante a abertura do evento na manhã desta quinta-feira (22). "Não precisamos de você para saber que os poluidores devem pagar, nós já o taxamos", disse ao microfone o ministro francês da Economia e Finanças, Bruno Le Maire, enquanto a ativista era retirada do evento por um segurança. Veja o momento no vídeo abaixo.

A reação de Le Maire vem na esteira de uma crise do ambientalismo com o governo francês, que dissolveu o movimento ecologista Soulèvements de la Terre (em português, Revoltas da Terra) após acusá-lo de atos violentos.

A União Europeia taxa, dentro do bloco, os combustíveis fósseis conforme a quantidade de carbono emitido. O bloco também aprovou, no final de abril, uma taxa de carbono para importações, que deve passar a valer a partir de 2026.

A criação de taxas —por exemplo, sobre transações financeiras e também sobre a emissão de carbono do transporte marítimo— está entre as propostas da França para aumentar a receita do financiamento climático destinado a países em desenvolvimento.

No entanto, as ONGs ambientalistas têm criticado a manutenção dos subsídios dados por governos em todo o mundo ao setor de petróleo e gás, o que mais contribui para as emissões de gases-estufa, causadores da crise climática. A União Europeia tem elevado os investimentos em gás e carvão para se livrar da dependência do gás russo, por ocasião da Guerra da Ucrânia.

Ativista climática Vanessa Nakate, do grupo Fridays For Future, pede um minuto de silêncio na abertura da cúpula, em Paris, nesta quinta (22) - Ludovic Marin/Pool via Reuters

O fim dos investimentos em energia fóssil é um dos tabus das negociações climáticas, que serão presididas na COP28 do Clima, em novembro, por Sultan al-Jaber, membro do governo dos Emirados Árabes que também responde pela maior empresa petroleira daquele país, a Adnoc. O presidente Lula deve se reunir com o Jaber nesta tarde em Paris.

A chegada de Lula, pela manhã, foi aguardada por algumas dezenas de apoiadores, com bateria e gritos de torcida —"Lula guerreiro do povo brasileiro"— na entrada do hotel onde o presidente se hospeda em Paris.

Um grupo de sete bolsonaristas também se posicionou no meio da avenida. Eles seguravam três faixas com dizeres sobre a cadeia ser o lugar para Lula. O grupo foi afastado do local pela polícia francesa.

Ainda assim, devido ao tumulto na entrada principal, a chegada de Lula aconteceu por uma porta lateral do hotel.

Apoiadores aguardam o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, na porta de hotel em Paris nesta quinta (22); Lula está na capital da França para participar da Cúpula do Novo Pacto Financeiro - Ana Carolina Amaral/Folhapress

O presidente almoçou no hotel com a ex-presidente Dilma Rousseff, hoje à frente do banco dos Brics. Pela tarde, Lula fará reuniões bilaterais com chefes de Estado de África do Sul, Cuba e Haiti, além do encontro com o presidente da COP28.

O aparente conflito de interesses do líder árabe da COP28 tem aumentado a desconfiança da comunidade internacional sobre a capacidade dos países implementarem o Acordo de Paris de mudança do clima, cujo objetivo é reter o aquecimento global entre 1,5°C e 2°C.

"Não há conflito de interesse, porque as decisões vêm dos países, não do presidente da COP28", afirmou à reportagem o presidente da COP27 e o ministro de Relações Exteriores egípcio, Sameh Shoukry.

Questionado sobre a relevância do posto que ocupou na negociação da COP27, que levou à criação do fundo para perdas e danos climáticos, Shoukry se limitou a dizer que confia totalmente na condução da COP28 por Jaber.

A retomada da confiança entre os blocos de países desenvolvidos e aqueles em desenvolvimento é um dos objetivos que um novo pacto financeiro busca atingir. Na abertura do evento, um discurso do economista Amar Bhattacharya buscou fornecer a garantia do cumprimento da doação de US$ 100 bilhões para o clima —prometidos em 2009— em 2023, conforme a Folha adiantou.

"O progresso significativo da mobilização de recursos para o clima sugere uma alta chance de entrega em 2023", ele afirmou.

De acordo com o alto escalão do governo francês, o montante já foi alcançado, mas o teor do anúncio foi amenizado para que os países doadores possam dividir o protagonismo sobre o resultado na COP28 do Clima.

Saques no FMI

Ao discursar nesta tarde durante a cúpula, a diretora-gerente do FMI (Fundo Monetário Internacional), Kristalina Georgieva, confirmou o atingimento da meta de distribuir a países em desenvolvimento o equivalente a US$ 100 bilhões em Direitos Especiais de Saque (SDR, na sigla em inglês), mecanismo que funciona como uma moeda complementar à reserva dos países.

O anúncio já era esperado pelos países que participaram de grupos de trabalho de preparação para a cúpula, como parte de uma estratégia de retomada da confiança entre os blocos de países desenvolvidos e aqueles em desenvolvimento, que vêm cobrando promessas de financiamento feitas nos últimos anos.

Em 2021, o FMI havia anunciado a distribuição de US$ 650 bilhões em Direitos Especiais de Saque, mas boa parte se destinava a países desenvolvidos —cerca de US$ 160 bilhões foram para o bloco europeu, enquanto os países africanos ficaram com apenas US$ 24 bilhões.

A diferença de distribuição foi criticada pelo secretário-geral da ONU, António Guterres, e pela primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley, ainda na abertura da cúpula.

De forma similar, a confirmação de que os países completam em 2023 o montante de US$ 100 bilhões para o clima foi recebida com críticas pelo bloco de países em desenvolvimento, que avalia o anúncio como atrasado e insuficiente. A promessa, feita em 2009, deveria ter sido cumprida em 2020.

Além dos três anos de atraso, os países desenvolvidos ainda não apresentam perspectiva de cumprir a destinação anual de US$ 100 bilhões. O fluxo anual estava previsto para acontecer no período 2020-2025.

Kristalina Georgieva, diretora-gerente do FMI, Emmanuel Macron, presidente da França, e Ajay Banga, presidente do Banco Mundial, na abertura da Cúpula do Novo Pacto Financeiro, em Paris, nesta quinta (22) - Ludovic Marin/Pool/AFP

"O sistema falhou com os países em desenvolvimento. Sua arquitetura foi criada após a Segunda Guerra Mundial e reflete a adaptação política e econômica da dinâmica de poder daquele período", pontuou Guterres. "Hoje essa estrutura é absolutamente disfuncional e injusta para um mundo multipolar, com tensões crescentes."

O presidente francês, Emmanuel Macron, afirmou também na abertura da cúpula que "um país nunca deveria ter que escolher entre reduzir a pobreza ou proteger o planeta". "Precisamos encarar ambos desafios de uma só vez", completou.

Convocado pela França, o encontro reúne mais de cem chefes de Estado em Paris até esta sexta (23), além de instituições financeiras multilaterais, como o Banco Mundial e o FMI (Fundo Monetário Internacional), bancos regionais de desenvolvimento, fundos de investimento, empresas e ONGs.

A inspiração para o encontro partiu da iniciativa Bridgetown, capitaneada por Mia Mottley. Barbados está entre os países mais vulneráveis à crise climática e atualmente atravessa uma temporada de furacões.

"Não pedimos a falência do setor privado, mas que ele compartilhe o fardo conosco, para que nós possamos compartilhar os bens públicos, os benefícios comuns. Nós criamos um mundo no último século em que o poder de algumas empresas é maior do que países inteiros", afirmou Mottley na abertura do evento.

A cúpula será encerrada na manhã da sexta-feira. O governo francês espera manter a pauta na agenda dos próximos encontros de líderes globais ao longo deste ano, como o G20, a Assembleia Geral da ONU e a COP28 do Clima.

A repórter viajou a convite da Embaixada da França no Brasil.

O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.

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