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Pesquisador do Transformative Learning Technologies Lab da Universidade Columbia em Nova York, pesquisador do Centro de Economia e Política do Setor Público da FGV/SP e ex-secretário municipal de Educação de São Paulo.

Auxílio emergencial sim; desmonte não

Mexer atabalhoadamente nos mínimos constitucionais não é o melhor caminho

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Na grande marcha para involuir 40 anos em 4, o Brasil agora discute se devemos garantir ou não um investimento mínimo em educação e saúde. Um vistoso jabuti incluso no projeto que possibilita a volta do auxílio emergencial àqueles que mais sofrem com a pandemia, a desvinculação de recursos da saúde e educação representa, na prática, a redução dos investimentos nas duas áreas.

A Constituição Brasileira determina que os municípios gastem no mínimo 15% de sua receita com saúde e 25% com educação. Já os estados devem destinar 12% da receita à saúde e 25% à educação. O relatório do senador Márcio Bittar que institui o auxílio emergencial prevê o fim dessa obrigação.

É claro que a sociedade precisa discutir a qualidade do gasto em saúde e educação e ampliar os mecanismos de transparência dos mesmos. Mas mexer atabalhoadamente nos mínimos constitucionais não é o melhor caminho para isso.

A existência de um valor mínimo de investimento para a saúde é um dos pilares do SUS. Em meio a esta dramática pandemia e seus efeitos futuros, colocar os secretários de saúde com um “pires na mão” não seria apenas insensibilidade, seria sadismo dos nossos parlamentares.

Apenas durante as ditaduras do Estado-Novo e militar o país não teve um investimento mínimo em educação definido por lei. Não creio que nossos parlamentares, que merecem o elogio da sociedade pela aprovação do novo Fundeb há poucos meses, caiam em contradição e virem as costas à educação pública mimetizando ditaduras.

Dada a previsível reação da sociedade, é possível que o fim das vinculações de educação e saúde sejam apenas uma cortina de fumaça para a realização de um sonho antigo do ministro Paulo Guedes: um piso único que destine 40% das receitas para as duas áreas, dando liberdade aos prefeitos e governadores para escolherem como distribuir os recursos entre as mesmas. Esta medida também promoverá a redução de investimentos nas duas áreas, com maior prejuízo para a educação.

Levantamento realizado por esta Folha em 2019 —portanto antes da pandemia— indicou que o gasto médio nas capitais com saúde era de 21,6% e na educação de 25,8%, perfazendo um total de 47,4%, o que já estava acima dos 40% previstos por Guedes em sua proposta inicial.

Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada de setembro de 2020 vai na mesma direção: 80% dos 5.480 municípios da amostra gastam mais do que o piso. Segundo os pesquisadores do instituto em um cenário de unificação dos pisos as perdas da educação tendem a ser maiores que as da saúde, dadas as características das despesas das duas áreas.

Há um dado adicional. Como já escrevi nesse espaço, a saúde é uma área que mobiliza demandas imediatas dos cidadãos, lida com a dor, a possibilidade da morte e a qualidade de vida. Os resultados educacionais na maioria das vezes são alcançados em prazos que ultrapassam o período de uma gestão. Os políticos são racionais e procuram maximizar a moeda que garante sua sobrevivência: o voto. Qual seria a escolha de um candidato à reeleição? Inaugurar postos de saúde ou investir em educação?

Nosso país tem um enorme passivo na área de educação. O número de matrículas em creche é baixíssimo, a pré-escola não foi universalizada, não conseguimos garantir educação de qualidade para todos. Esse passivo foi ampliado durante a pandemia do Coronavirus, o que exigirá mais investimentos.

Está nas mãos do Congresso Nacional decidir se reafirmará seu compromisso com a educação pública, expresso na aprovação do novo Fundeb em 2020, ou se aceitará aprovar de “contrabando” na lei do auxílio emergencial, um dispositivo que na prática reduzirá os investimentos em educação e tornará permanente algo que nem as ditaduras conseguiram: acabar com o investimento mínimo em educação no Brasil.

*O título desse artigo foi inspirado na campanha nas redes da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.

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