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A blindagem das empresas estatais

Não há incompatibilidade entre uma gestão transparente, técnica, íntegra e voltada ao cumprimento de objetivos empresariais e a melhoria do bem-estar social

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A aprovação da Lei de Responsabilidade das Estatais (lei 13.303, de 2016) foi uma reviravolta nas empresas públicas. É indiscutível o avanço em termos de gestão transparente e eficiente do patrimônio público, levando-o a contribuir para o aumento do bem-estar coletivo em detrimento dos interesses de grupos de pressão.

No ano de sua aprovação, após a recessão de 2014-2016, a situação das empresas públicas federais emitia sinais de alerta. No agregado, apresentavam prejuízos. O patrimônio das 46 empresas com controle direto da União (proporcional à sua participação) era de R$ 228 bilhões (3,6% do PIB), e algumas dessas estatais estavam na iminência de demandar recursos do Tesouro para cumprimento de obrigações. Entre essas, 11 possuíam patrimônio líquido negativo.

Não eram raras as denúncias de desvios de conduta e de arbitrariedades no controle de preços e tarifas. E era grande o desgaste reputacional, o que contribuía para que o valor de mercado das empresas listadas na Bolsa de Valores (B3) estivesse ainda abaixo do seu patrimônio líquido.

Desde então, os resultados melhoraram. O patrimônio da União nas empresas diretamente controladas subiu 75% de 2016 a 2020 —média de 15% ao ano— e alcançou 5,3% do PIB. As empresas com patrimônio negativo limitavam-se a seis no final de 2020.

As inovações trazidas em 2016 tratam de dois vetores: licitações e contratos, e governança corporativa. A Lei das Estatais recebeu o reforço de outras iniciativas, como a Lei Anticorrupção (lei 12.846, de 2013) e a nova Lei da Improbidade (lei 14.320, de 2021), para promover significativa mudança no ambiente corporativo público. Adicionalmente, a competência técnica das agências reguladoras e supervisoras deveria cumprir o papel de assegurar o funcionamento saudável do mercado.

Não há incompatibilidade entre uma gestão transparente, técnica, íntegra e voltada ao cumprimento de objetivos empresariais e a melhoria do bem-estar social. Bem administradas, as empresas investem e geram valor, por meio de pagamento de salários, impostos e dividendos. As produtoras de commodities ainda pagam rendas governamentais (royalties) pela exploração de recursos naturais. Assim, contribuem para o crescimento de longo prazo da economia.

Ao receberem essas receitas, os governos podem realizar políticas públicas que atenuem ciclos econômicos, sem atacar a convivência dessas empresas com regras de mercado nem a sua rentabilidade, e sem destruir valor para seus empregados, fornecedores, acionistas e comunidades beneficiadas.

O que a lei trouxe para as empresas públicas visa elevar os níveis de excelência na gestão e de integridade —algo que, para o setor privado, há muito tempo é requerimento mínimo para tornar uma empresa elegível a atrair investidores na B3. Desde 2000, a B3 criou um selo de reconhecimento, o Novo Mercado, para empresas com alto nível de governança.

No caso das estatais, a lei trouxe obrigações de constituir estruturas de governança, como conselhos de administração e comitês, capazes de tomar decisões estratégicas de modo colegiado, de antever riscos e assegurar o desenvolvimento dos negócios.

Ademais, exige a definição de políticas voltadas à gestão técnica, ao corrigir as falhas de controles internos e assegurar requisitos de competitividade, implicando até a fixação de preços capazes de cobrir os custos dos serviços prestados ou segundo parâmetros de mercado. Assegura contratações com perfil técnico, remunerações e incentivos compatíveis; exige códigos de conduta ética e integridade, com normas para explícita vedação (e responsabilização) de atos de corrupção e fraude.

E, por fim, exige a elaboração de carta anual de governança corporativa, com a função de comunicar ao público a sua estratégia de longo prazo e o seu plano de negócios, assumindo compromissos e avaliando os resultados da gestão.

Tais obrigações foram incorporadas nos estatutos de todas as empresas nos meses subsequentes à aprovação da Lei das Estatais. Uma verdadeira frente de trabalho!

Como referência, o setor privado vem aprofundando seus compromissos ESG (ambientais, sociais e de governança), sem renunciar à rentabilidade. Ao contrário, a adesão a essa agenda cumpre o objetivo de promover negócios engajados na inclusão social e na transição para uma economia mais verde, contribuindo para mitigar riscos. Essa tem sido a cartilha das empresas para merecer a confiança dos seus clientes, investidores e entorno. Trata-se de gerar valor e, ao mesmo tempo, assumir parcela da responsabilidade por mais bem-estar.

Se, por um lado, empresas estatais deveriam trabalhar ainda mais por uma agenda ESG que assegure sua legitimidade social, por outro, não podem ser culpadas pelas eventuais lacunas nas políticas públicas. Estas, mediante financiamento do Tesouro, são os instrumentos adequados para, por exemplo, atenuar os riscos de racionamentos, fome, agitação social relacionados à atual escassez global de combustíveis e de alimentos.

Outra discussão seria privatizar ou não algumas dessas empresas. Mas, enquanto forem públicas, modificar os fundamentos da Lei das Estatais —que tem trazido cultura da rentabilidade, sustentabilidade e da responsabilidade— será um imenso retrocesso para instituições que, com esforço e benefício de muitos, vêm contribuindo para o crescimento mais inclusivo no Brasil.

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