Siga a folha

Jornalista e roteirista, é autora do livro "Almanaque da TV". Escreve para a Rede Globo.

Descrição de chapéu Natal

Dei meião no Natal, fui vítima da sina que rege as surpresas de amigo oculto

Todo fim de ano essa história ressurge para me assombrar, mais de 20 anos depois

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Paulo Roberto, me perdoa. Todo fim de ano essa nossa história ressurge para me assombrar. Feito lembrancinha que a gente recebe e passa adiante, na esperança de se livrar —mas que acaba voltando, principalmente contra nós. Como eu poderia supor que aquele equivocado meião selaria para sempre os nossos destinos?

Tínhamos o quê? Onze anos? Era a confraternização da sexta série. Você queria ganhar um disco dos Ramones. Eu queria lhe dar um disco dos ​Ramones. Só que um dia antes, no shopping, deu-se a tragédia. Fui vítima da sina que rege as surpresas de amigo oculto.

"Disco? Pra quê? Vamos comprar um meião." Tentei argumentar, feito Cristóvão Colombo diante dos sábios de Salamanca, mas a sentença dos meus pais era irrevogável. "Meninos adoram meião! É prático, eles usam no futebol." Paulo Roberto, eu nunca tinha visto você nem sequer perto de uma bola no recreio. Mas assim foi. Meninos levaram salgado, meninas levaram doce. Eu levei minha angústia —e o par de meiões.

Ilustração para a coluna de Bia Braune do dia 20 de dezembro de 2021 - Marcelo Martinez

A entrega se deu no último tempo de aula. Após receber meu próprio presente —exatamente o que havia pedido—, balbuciei algumas palavras e chamei seu nome, Paulo Roberto. Delicado, você abriu o pacote já sabendo que não tinha o formato de um disco. E então olhou fundo nos meus olhos. "Meninos adoram meião, meião, meião", ecoava na minha cabeça. Nisso, o sinal bateu. Todo mundo saiu correndo, inclusive você. No ano seguinte, trocamos de escola.

Até que, já adolescente, veja só quem reapareceu na minha turma de inglês. Paulo Roberto, eu o reconheceria em qualquer lugar, muito porque você estava de chinelos. Tentei fugir do assunto, mas como? Você não só se lembrava do fato, como foi extremamente simpático. Pior: desenvolveu um crush por mim, demonstrando clara tendência à síndrome de Estocolmo.

Na festa de encerramento do curso, deu carona a metade da turma e percebi que arrumou um jeito de me deixar por último. Quando estacionamos na porta de casa, era alta madrugada. Você colocou o braço por cima dos meus ombros e, bem, rolou o clima ideal para erradicar um trauma. De repente, ouviu-se um pigarro. Meu pai, furibundo com a hora, estava plantado no meio do jardim. Um inimigo oculto de pijama... E meião.

Mais de 20 anos depois, ainda penso em você, Paulo Roberto. Sobretudo quando vejo alguém tristonho, ganhando meia de Natal. Tomara que esteja bem. E, caso ainda guarde nosso antigo souvenir da mágoa, espero que o pendure na janela e que o bom velhinho deixe um ótimo presente lá dentro. Ou, quem sabe, outro par de meiões. Aí já é por sua conta. Boas festas, B.

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas