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Jornalista de ciência e ambiente, autor de “Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” (ed. Fósforo)

Ouse buscar a verdade sobre drogas, queimadas e crise climática

Livro sobre maconha e queimadas da Amazônia abrem olhos de quem quer ver

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A moça ao lado tem tatuagem no antebraço esquerdo que diz: "Sapere aude". Um lapso de memória impõe consulta à memória coletiva in silico, que informa a tradução esquecida para o dístico latino: "Ouse saber".

Provérbios costumam encapsular sabedoria acumulada por gerações, guardam o fumo da verdade. Onde há fumaça há fogo. Nesta primavera escaldante, uma dose dupla de fumacê pode contribuir para desanuviar os olhos da mente.

Primeiro, a fumaça da Cannabis. Informar-se sobre maconha e seu potencial de benefício à saúde interessa a todos. Quem não tem ou conhece alguém com depressão, ansiedade, insônia, dores, câncer, Alzheimer ou Parkinson?

A maconha está vencendo preconceitos. E por ippon - Pedro Ladeira - 29.jun.23/Folhapress

Seja pela via da pesquisa biomédica, com seus endeusados testes clínicos aleatorizados e controlados, seja pela experiência anedótica de portadores e seus parentes (o adjetivo mais adequado seria "traumática"), a maconha está vencendo preconceitos. E por ippon.

Quem afirma é Sidarta Ribeiro, neurocientista que se ergueu como intelectual público, condição nem sempre benquista por luminares da ciência normal e seus assessores na imprensa. Está no livro "As Flores do Bem – A Ciência e a História da Libertação da Maconha".

Cabem aqui dois avisos a navegantes. Um: cultivo relações próximas com Sidarta, que começaram como fonte de informações e evoluíram para fonte de amizades. Dois: temos a mesma editora, Fósforo, que lançou em 2021 meu "Psiconautas – Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira", com prefácio dele.

Seu livro é de utilidade pública. Lastreia com fartas referências científicas e relatos tocantes as propriedades das irmãs CBD e THC (analgésicas, anti-inflamatórias, antiespasmódicas, anti-isquêmicas, antieméticas, antibacterianas e antidiabéticas da maconha) obscurecidas por uma muralha de racismo estrutural, proibicionismo fracassado e bom-mocismo acadêmico.

No imaginário social, a maconha está marcada como droga de pretos e pobres. Embora consumida por brancos de todas as classes, há quem acredite piamente que a liamba esteja na raiz das supostas indolência e violência atribuídas às favelas e periferias.

A obra faz jus ao bem-apanhado título "As Flores do Bem". Lá estão as referências dos estudos e as explicações sobre por que pesquisas promissoras não avançam mais, em particular num país demófobo como o Brasil. O maior senão do livro é que não será lido pelos cultivadores do pânico moral.

Outra cortina de fumaça esclarecedora cobre no momento boa parte da Amazônia. Embora o desmatamento tenha recuado 42,5% nos primeiros sete meses do ano, comparados com igual período de 2022, as queimadas estão comendo soltas.

Parece contraditório, mas não é. Detritos de derrubadas em alta nos fatídicos anos Bolsonaro deixaram de ser incinerados, por causa do excesso de umidade. Com a estiagem inaudita no bioma, grileiros —primeiro elo na cadeia de devastação amazônica— correm a tocar fogo na biomassa, agora mais inflamável sob ar seco.

O fumo da verdade não dá descanso nem a quem tem os olhos bem abertos. Como narrou Meghie Rodrigues na revista Nature, a ecóloga brasileira Erika Berenguer, da Universidade de Oxford, estudiosa da vulnerabilidade da floresta ao fogo, foi escorraçada por ele.

Berenguer estava na região do Tapajós quando se viu envolta pela fumaça, dia e noite. Teve de abandonar o trabalho de campo por dez dias. "Eu estava mais sem fôlego do que quando tive Covid", disse Rodrigues. "Isso é envenenamento coletivo."

Queimamos combustíveis fósseis e as florestas, alimentando a fornalha do efeito estufa e do El Niño, que impelem a mata amazônica para um ponto de não retorno na espiral de ressecamento. Cegos brincando com fogo.

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