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Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

Infantil, 'Verão 90' é a cara das atuais novelas da Globo

Simplicidade e pobreza criativa da trama das 19h é padrão

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As três novelas que a Globo exibe de segunda a sábado frequentemente aparecem no ranking dos dez programas de TV mais vistos no Brasil. A novela das 21h, há décadas, é o programa número um. A das 19h costuma ocupar o terceiro lugar e a das 18h aparece, atualmente, entre a nona e a décima posição.

Os números de audiência já não são os mesmos de outros tempos, mas ainda assim não podem ser considerados desprezíveis. "O Sétimo Guardião" tem registrado no PNT (Painel Nacional de Televisão), que reúne os números de 15 grandes mercados, médias em torno de 28 pontos (cada ponto equivale a 693.788 indivíduos).

Em sua última semana, em janeiro, "O Tempo Não Para" teve média de 21 pontos e "Espelho da Vida" ficou em 18 pontos.

Somando produções originais e reprises, Globo, SBT e Record apresentam diariamente 13 novelas. Em julho de 2015, quando a Band ainda exibia novelas turcas, a Globo tinha uma às 23h e o SBT reprisava mais títulos, este número chegou a 16.

A permanência das novelas na grade das TVs abertas atende, naturalmente, a um misto de paixão e hábito do brasileiro por este gênero.

Além, é claro, de ser um negócio dos mais lucrativos. Ainda que altos, os custos de produção de um folhetim são diluídos ao longo de 150/200 capítulos e os bons números de audiência sempre atraem anunciantes e patrocinadores.

Essa combinação de gosto arraigado e bom negócio tem funcionado como uma fortaleza eficiente na TV aberta contra a invasão das séries. Parece incompreensível, para quem consome seriados e minisséries na TV paga ou em serviços de streaming, essa preferência por novelas. E é mesmo.

Qualquer espectador que tenha a experiência de assistir seguidamente a meia dúzia de boas séries de 10 a 15 episódios não consegue acompanhar uma novela sem sentir incômodo com a falta de ritmo, a enrolação desenfreada, a simplicidade do roteiro e a ausência de qualquer traço de ambição artística.

A estreia, há duas semanas, de "Verão 90", nova novela das 19h da Globo, dá uma boa ideia dessa situação. Ambientada em 1990, com um ponto de partida que lembra "Samantha!", produzida pela Netflix, a trama tem se revelado uma decepção em vários quesitos.

Texto primário, que beira a novela infantil, interpretações caricatas, produção precária e repetição abusada de clichês deram o tom dos primeiros dez capítulos. Fosse uma paródia, até teria mérito, mas não. É só ruim mesmo. Uma suposta ousadia foi vista na cena que retrata a reação dos personagens ao anúncio do confisco da poupança, em 16 de março de 1990.

Assistindo a Fernando Collor e Zélia Cardoso anunciarem as primeiras medidas do novo governo, Lidiane (Claudia Raia) diz que votou no presidente por ele ser "um pão".

Foi uma piada (consentida) com a própria atriz, que serviu de garota-propaganda a Collor na campanha eleitoral e, posteriormente, declarou ter sido uma experiência "traumática". Em momento algum do capítulo houve referência ao fato de que a própria Globo apoiou a candidatura de Collor em 1989 —isso sim seria uma ousadia.

A simplicidade e a pobreza criativa de "Verão 90" não configuram novidade. É um padrão mesmo. Salta aos olhos nos últimos anos a intenção deliberada da Globo de oferecer novelas despretensiosas em todas as suas faixas horárias.

É uma estratégia que tem funcionado, aparentemente, na retenção dos espectadores, ainda que frustre uma parcela deles. Falo de gente que gosta de novelas, tem boas lembranças do gênero, mas já está com um pé firme nas séries.

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