Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.
'Maldivas' só tem destaque por ter Bruna Marquezine, mas é aposta furada
Com diálogos cheios de tiradas e um fiapo de história, série não impressiona nem assinantes otimistas do streaming
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O espectador otimista é aquele que navega pelo cardápio da sua plataforma de streaming sem encontrar nada que preste, mas não se irrita. É assim mesmo, ele diz. Hoje não achei nada, mas amanhã vou achar.
Este Cândido, que assina Netflix, Globoplay, Prime Video, Starzplay, Paramount e Apple TV, entre outras, vê com bons olhos a quantidade de séries oferecidas e a variedade de gêneros disponíveis, mesmo que nada se encaixe no seu gosto. Eu não gostei, mas alguém, com certeza, vai gostar, ele raciocina.
Diante de "Maldivas", porém, esse assinante padrão, que nunca reclama, ficou com a pulga atrás da orelha. Não é apenas mais uma série, ele nota. É algo que a Netflix trata orgulhosamente como um produto especial, algo que dá lustro ao seu catálogo. Daí a dúvida que atinge Cândido: por que uma série tão besta e vazia está ocupando este lugar de tanto destaque?
Todas as respostas convergem para um nome: Bruna Marquezine. A série marca a estreia da atriz na Netflix, após duas décadas de serviços prestados à Globo. E por que isso é tão importante? Porque a Netflix acredita que a atriz seja um enorme chamariz de audiência.
Com 43 milhões de seguidores no Instagram e uma boa imagem pública, Marquezine é um modelo para o público adolescente, sobretudo feminino. Trata-se de um "target" que o mercado publicitário considera prioritário.
Para esta estreia, a Netflix apostou num misto de comédia e thriller policial com foco no "girl power". A ação se passa integralmente dentro de um condomínio na Barra da Tijuca. Na verdade, é um ambiente cenografado, com flamingos infláveis, sem qualquer traço de identidade que o situe; poderia ser em qualquer cidade.
Sheron Menezzes, Carol Castro, Manu Gavassi e Natalia Klein vivem as poderosas frequentadoras do condomínio. Num tom que lembra publicidade da Bacardi, passam o dia na beira piscina bebericando drinques coloridos.
A personagem de Bruna junta-se ao grupo com o objetivo de investigar o desaparecimento da mãe. Com o sorriso plácido, e aquele ar de quem se pergunta "o que eu estou fazendo aqui?", a atriz não precisa fazer esforço algum para se destacar —ela é a única cuja interpretação não busca a caricatura.
"Maldivas" é ostensivamente narrada. Para não deixar nenhuma dúvida, e tentar arrancar algum sorriso dos espectadores, a ação é explicadinha passo a passo pela narradora.
Alguns temas são levantados ao longo dos sete episódios —o marido de uma das mulheres usa tornozeleira eletrônica e a transforma em cúmplice; o marido de outra se apaixona por um homem; e um terceiro marido ganha a vida fazendo preenchimentos estéticos nas mulheres mais inseguras. Na realidade, porém, nenhum assunto é desenvolvido, e todos esses personagens são também meros esboços.
"Maldivas" é uma aposta no que há de mais fácil: diálogos cheios de tiradas "espertas", boas atrizes se esforçando para produzir risos e um fiapo de história. Nada faz muito sentido, mas tudo bem. É engraçadinho, bonitinho e passa rápido.
O que me espanta é a Netflix acreditar que o caminho é por aí, subestimando o público. Nem o espectador mais otimista, com fé na capacidade de ser surpreendido pela maior plataforma de streaming do mundo, é capaz de entender uma aposta furada dessas.
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