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Apoiar entregadores pode ser uma forma de finanças inclusivas

Negócio antecipa recebível performado com alto impacto social em uma das populações mais vulneráveis da sociedade

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Luciano Gurgel

Bacharel em economia pela Universidade de São Paulo (USP), foi diretor de investimentos da Yunus Negócios Sociais e é diretor-executivo da Artemisia

Há um consenso no Brasil de que entre as três letrinhas mágicas que têm sintetizado a responsabilidade corporativa, o ESG, a mais difícil de se cumprir é o S de social.

Gestores de grandes empresas se perguntam se não bastam os impostos que são pagos pelas corporações para que o governo cuide das pessoas à margem da sociedade. Outras se questionam: "E aquela ONG que rendeu boas fotos no último ano, será que não repetimos a dose para ‘cumprirmos a cota’?"

Paralisação de entregadores por aplicativo busca melhor remuneração e condições dignas de trabalho - Karime Xavier/Folhapress

Quando pensamos nas instituições financeiras, a missão de concretizar o S fica ainda mais difícil, sobretudo pelo desafio de fazer com que a atuação, que é muito associada à cobrança de juros extorsivos, seja vista como de impacto social positivo.

A despeito de todos os obstáculos, têm surgido iniciativas consistentes que mostram como o S pode se tornar tangível no mundo das finanças.

Uma delas está sendo liderada pela Articuladora de Negócios de Impacto de Periferia (Anip), iniciativa conjunta de A Banca, FGVcenn e Artemisia, com apoio da Fundação Arymax, da Fundação Tide Setubal, do Instituto humanize e do Instituto Sabin, que concluiu uma transação envolvendo a concessão de um empréstimo de longo prazo utilizando o racional do capital paciente à Trampay.

A Trampay é um negócio social que tem como principal linha de atuação a antecipação do faturamento de entregadores por aplicativos. É uma ferramenta de engajamento de informais, focada em melhorar a qualidade de vida no trabalho de entregadores e motoristas de aplicativo.

Entregadores por app trabalham uma quinzena inteira e, no dia seguinte, têm o faturamento totalizado. O valor devido é pago dez dias depois desta totalização. Por exemplo: todas as entregas realizadas do dia 1º ao 15 de cada mês são totalizadas no dia 16 –e o entregador só recebe o valor correspondente no dia 25. Todo o valor gerado do dia 15 ao 31 é totalizado no dia 1º e recebido no dia 10.

Ou seja, o entregador fica, todo mês, com um desencaixe de pelo menos dez dias entre o faturamento gerado e o recebimento na conta.

Com a solução da Trampay, o entregador recebe hoje o que trabalhou ontem. Esse valor antecipado faz com que despesas básicas ou inesperadas desses trabalhadores não sejam mais uma preocupação.

Trata-se de uma antecipação de um recebível performado com alto impacto social em uma das populações mais vulneráveis da sociedade.

Dados do Ipea - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de 2021 mostram que 1,5 milhão de brasileiros trabalham por meio de aplicativos de entrega ou transporte. A maioria desses trabalhadores é homem, preto ou pardo.

Entre motociclistas que fazem entregas, o rendimento é de aproximadamente R$ 1.500 por mês, com jornadas de trabalho extensas que podem chegar a 18 horas por dia.

Há, ainda, o risco de rendimentos negativos. Estamos, portanto, falando de uma população realmente à margem da sociedade e que, na maioria das vezes, só executa essa atividade profissional por falta de opção.

E isso implica algumas dificuldades práticas. Às vezes, falta dinheiro para abastecer o tanque da moto, trocar um celular ou carregador, comprar medicamentos ou mesmo se alimentar. Ou seja, falta o financiamento do ‘capital de giro’ para o entregador. Aquele capital que faz a roda da atividade girar.

O interessante é que a operação de antecipação do faturamento do entregador é de baixíssimo risco de crédito. O faturamento já foi realizado, o que no jargão do mercado financeiro é chamado de recebível performado.

O risco do financiador desta operação é que o aplicativo ou que os operadores logísticos, que às vezes se posicionam entre os apps e os entregadores, não paguem o valor trabalhado e faturado. Risco baixíssimo tendo em vista o perfil de crédito dos aplicativos de entrega.

A operação de crédito à Trampay realizada pela Anip visou ao reforço de caixa para a empresa, permitindo aumentar os recursos à disposição dos entregadores e melhorando as condições de trabalho.

Na primeira rodada serão quase 900 entregadores beneficiados com a antecipação dos rendimentos e, ao cabo da operação, por volta de 20 mil beneficiados. A magia desses números acontece pela lógica do crédito rotativo, no qual recursos podem ser reciclados e beneficiar diversas pessoas.

Com a operação de financiamento da Trampay, entendemos que estamos –Anip, Artemisia e demais parceiros– contribuindo para mostrar que podemos, por meio da lógica do mercado e do mundo dos negócios, apoiar setores mais fragilizados da sociedade.

Viabilizando recursos que se reciclam e que permanecem gerando impacto social positivo enquanto estiverem disponíveis.

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