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Sistemas alimentares urbanos para enfrentar a fome e a crise climática

É preciso fomentar a economia local, reduzir a distância entre produtores e consumidores e contribuir para a resiliência alimentar das cidades

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David Hertz

Chef e empreendedor social, cofundador da ONG Gastromotiva e do movimento Social Gastronomy

Somos 8 bilhões de habitantes no planeta. Na base da evolução demográfica global está um contingente de 3,1 bilhões de pessoas que não conseguem pagar por uma dieta saudável.

Estamos imersos em uma crise pautada pela insegurança alimentar que cresce fomentada por desafios geopolíticos e eventos climáticos.

Em 2050, dois terços da população mundial viverão em assentamentos urbanos e periurbanos. E é provável que 3 bilhões de pessoas tenham acesso insuficiente à saúde, energia, água potável e a uma alimentação saudável.

Produtores de cooperativa plantam hortaliças e frutas em São Paulo, na região de Perus, divisa com Cajamar e Santana de Parnaíba
Produtores de cooperativa plantam hortaliças e frutas em São Paulo, na região de Perus, divisa com Cajamar e Santana de Parnaíba - Karime Xavier/Folhapress

A escalada da fome no Brasil e em diversos países demanda a construção de sistemas alimentares urbanos resilientes e que tragam soluções concretas voltadas à população em situação de vulnerabilidade.

Em recente articulação do Fórum Global do Pacto de Milão para Política de Alimentação Urbana, no Rio de Janeiro, participei de debates muito ricos sobre o tema.

Um deles sobre agricultura urbana e periurbana voltada a cidades inclusivas e resilientes ao clima; outro, sobre políticas públicas adotadas por cidades como Nova York, Copenhague, Birmingham, Milão, Guadalajara e Daegu.

A mesa sobre ações de governo versou sobre como podemos otimizar as compras públicas de alimentos para creches, escolas, hospitais e presídios de modo a promover a produção local com a criação de cinturões verdes no entorno das cidades.

A proposta é fomentar a economia local e circular, reduzir a distância entre produtores e consumidores –incluindo a emissão de gases de efeito estufa– e contribuir para a resiliência alimentar das cidades.

No Fórum, uma das defesas foi que a agricultura urbana e a periurbana pode ajudar a reduzir os custos da adaptação climática nas cidades, na medida em que colaboram para aliviar a crise planetária associada às mudanças globais do clima, à perda de biodiversidade, ao aumento da poluição e à escalada do desperdício de alimentos.

Esse olhar para as cidades é norteado pela constatação da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) de que 70% dos alimentos do mundo têm como público-alvo os habitantes urbanos.

Sistemas alimentares sustentáveis eficientes são pautados pela disposição de repensar aspectos como recursos naturais para a produção e a base das dietas urbanas.

Quando consideramos o cenário de mudanças climáticas, vemos claramente o potencial de impacto positivo do fomento da agricultura urbana e periurbana. Defendo o apoio a lideranças locais e a organizações sociais que possam protagonizar e multiplicar as iniciativas –elas podem sistematizar as melhores práticas, ser fonte de dados e influenciar políticas públicas que fomentem a troca de informações.

Uma iniciativa da Gastromotiva que dialoga com a defesa de sistemas alimentares sustentáveis e eficientes nas cidades é o Refettorio Gastromotiva, restaurante-escola no Rio de Janeiro. Na prática, fomentamos o desperdício zero de alimentos.

Também no Rio, Shirley Conceição, cozinheira social no bairro de Mesquita, nossa ex-aluna, montou um projeto de negócio social de agricultura familiar urbana baseado no modelo de "tetos verdes": hortas em lajes de residências, com potencial de geração de renda para os moradores. Ela implementou o projeto e conseguiu impactar 40 pessoas.

Agir para combater a fome passa por enxergar criticamente o desperdício de alimentos e a crise climática sob a ótica urbana.

E ainda por considerar essas variáveis no plano de desenvolvimento socioeconômico dos territórios, pensando em uma boa governança de iniciativas locais, focando na melhoria dos processos de produção e consumo de alimentos.

Equipe do Refettorio Gastromotiva, no Rio de Janeiro, durante a pandemia - Divulgação

Dizem que as perguntas movem o mundo e, aqui no Brasil, isso não é diferente. Devemos nos perguntar se é viável (ou até quando será viável) centrarmos o consumo, priorizando alimentos processados e transportados em longas distâncias.

É fato que a agricultura urbana chegou para ficar e precisamos acelerar essa agenda, norteados por uma nova consciência da urgência de combater o impacto negativo desse atual modelo de escoamento de alimentos nas diferentes etapas da cadeia "do campo à mesa".

É por meio dela que vamos tornar as cidades mais resilientes ao clima, que vamos gerar mais empregos e promover a segurança nutricional e alimentar.

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