Siga a folha

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

Descrição de chapéu Eleições EUA 2020

Zumbis comeram os cérebros de Bloomberg e Buttigieg?

Democratas, cuidado com os mortos-vivos

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Estou na Espanha agora, falando sobre ideias zumbis –ideias que deveriam ter sido mortas pelas evidências, mas continuam se arrastando por aí. Nos Estados Unidos modernos, as ideias zumbis mais importantes estão à direita, mantidas vivas por dinheiro grosso de bilionários que têm interesse financeiro por fazer as pessoas acreditarem em coisas que não são verdadeiras.

Mas às vezes as ideias zumbis também conseguem comer o cérebro de centristas. Com certeza, alguns dos zumbis mais destrutivos dos últimos 12 anos se arrastaram até entrar na luta das primárias democratas, onde alguns centristas estão repetindo ideias que foram totalmente derrubadas anos atrás.

Aliás, a experiência da Europa, e da Espanha em particular, oferece algumas das balas que deveríamos usar para acertar esses zumbis na cabeça.

Vamos começar pelas origens da crise financeira de 2008, tema que continua relevante se não quisermos repetir antigos erros.

Embora poucos tenham visto 2008 chegar, em retrospecto foi um clássico pânico bancário, o tipo de coisa que acontecia com frequência antes dos anos 1930. Primeiro, os credores foram apanhados em uma gigantesca bolha imobiliária; depois, quando a bolha estourou, grande parte do sistema financeiro simplesmente congelou.

O que tornou esse pânico possível, depois de duas gerações de relativa calma financeira? A resposta, claramente, foi a erosão da regulamentação financeira eficaz durante as décadas anteriores.

Mas os direitistas se recusaram a aceitar o óbvio. Em vez disso, eles forçaram uma narrativa alternativa em que os liberais de alguma forma causaram a crise ao forçar pobres banqueiros inocentes a emprestar dinheiro a pessoas de cor (eles não foram geralmente tão explícitos, mas essa era a clara mensagem). Essa narrativa era tão descaradamente interesseira que é difícil acreditar que qualquer pessoa a levasse a sério; mas algumas pessoas influentes a compraram. E entre elas estava Michael Bloomberg.

Nesta altura, a evidência contra a história de "a culpa foi dos liberais" é avassaladora. O surto de empréstimos ruins não veio nem de órgãos patrocinados pelo governo nem de bancos regulamentados, mas de originadores de hipotecas não regulamentados. A consequência foi tão grave porque os investidores acreditaram, erroneamente, que instrumentos financeiros elegantes os protegiam dos riscos.

E, crucialmente, a bolha habitacional foi um fenômeno internacional: a Espanha teve uma bolha maior que a nossa, seguida de uma queda pior. Os americanos liberais forçaram os bancos espanhóis a fazer maus empréstimos?

Mas as ideias zumbis não podem ser mortas por evidências. Os perpetradores da mentira da "culpa foi dos liberais" continuam por aí, ainda conseguindo espaço para espalhar sua desinformação na mídia da corrente dominante.

Elizabeth Warren afirma que a adoção por Bloomberg de uma falsa narrativa de direita sobre a crise financeira deveria desqualificá-lo para a nomeação democrata. Mas eu aceitaria lhe dar uma chance se ele admitisse que foi tomado pela desinformação da direita. Se ele não quiser fazer essa admissão, ela tem razão.

Ao mesmo tempo que Bloomberg está sendo questionado sobre seu zumbi da bolha imobiliária, Pete Buttigieg enfrenta críticas justificadas por comprar outra ideia zumbi –a obsessão pela dívida do governo. Essa obsessão fez muito para atrapalhar a recuperação da crise financeira.

Para ser justo, o pânico do deficit não foi um golpe tão claro quanto a alegação de que filantropos causaram a crise financeira, embora algumas das vozes mais fortes a denunciar os males dos deficits tenham sido de óbvios fingidores. O que aconteceu, porém, foi que muitas pessoas importantes imaginaram que atacar os riscos da dívida as fazia parecer sérias, porque era isso o que todas as outras pessoas sérias estavam fazendo.

Nesta altura, porém, a obsessão pela dívida foi totalmente derrubada pela pesquisa e a experiência econômicas. Vivemos em um mundo inundado de poupança privada em busca de um lugar para ir, com investidores dispostos a emprestar dinheiro a governos por taxas de juros incrivelmente baixas. Na verdade, é irresponsável não pôr esse dinheiro para trabalhar investindo no futuro, tanto construindo infraestrutura física como através de programas que ajudem a desenvolver o potencial das crianças.

Agora, o governo Trump está agindo errado –pegando emprestado grandes somas, mas desperdiçando o dinheiro em cortes de impostos para as corporações e os ricos. Mas até os gastos em deficits ruins reforçam a economia até certo ponto, e é por esse motivo que os EUA continuam crescendo razoavelmente depressa enquanto a Europa, ainda nas garras da ideologia da austeridade, está estagnada.

Veja: é fácil defender a tese política de que os democratas deveriam nomear um centrista, e não alguém da ala esquerda do partido. Os candidatos que são vistos como ideologicamente radicais geralmente pagam uma multa eleitoral; isso é especialmente verdadeiro se, como Bernie Sanders, eles posarem como mais radicais do que realmente são.

Mas uma parte chave da atração do centrismo é a crença de que os centristas são realistas, que compreendem como o mundo funciona. É muito mais difícil defender centristas que repetem afirmações visivelmente falsas, em especial se estas forem basicamente propaganda de direita.

Como eu disse, você pode ter um bom argumento para a proposta de que os democratas devem nomear um centrista, afinal. Mas um centrista cujo cérebro foi comido por ideias zumbis? Nem tanto.

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas