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A polêmica das farmácias

Ao informar o CPF em programas de fidelidade, fazemos uma troca: nossos dados pelos descontos nos produtos

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Hoje, diversos setores contam com programas de fidelidade. A loja frequentemente pede que o cliente informe o CPF para conceder descontos. Talvez ninguém seja tão agressivo como as farmácias. Você entra no estabelecimento e, na primeira interação com o funcionário, ele pergunta o seu CPF. Você fala “Bom dia!”, a pessoa solicita o CPF —muito antes de você concluir qualquer compra.

Recentemente, o grupo Raia Drogasil tentou dar um passo além: a adoção de biometria para identificar seus fregueses. Porém, frente à repercussão negativa, voltou atrás.

A fidelização do cliente traz benefícios para a empresa. O efeito mais óbvio é garantir uma demanda mais cativa e estável. Muitas vezes a pessoa até topa pagar um preço mais alto, em nome dos pontos que acumula dentro do programa de fidelidade. E como os pontos em geral expiram, a pessoa pode gastar um pouco a mais para poder trocá-los por algum produto.

Note, inclusive, que as empresas informam quanto os prêmios valem em termos de “pontos”, e não seu valor monetário. Isso torna opaca a comparação do benefício do prêmio com o custo oriundo das compras extras necessárias para garanti-lo. Muito provavelmente estamos trocando gato por lebre.

Mais importante, a empresa consegue algo que vale ouro —dados sobre sua clientela. Com isso, ela consegue acompanhar nosso padrão específico de compras. Ao informar o CPF, fazemos uma troca: nossos dados pelos descontos nos produtos. É parecido com o que realizamos online. Não pagamos um centavo para usar plataformas como Google ou Facebook. Mas fornecemos nossos dados. Essas empresas então aprendem um pouco sobre nós, e nos “presenteiam” com anúncios personalizados —com os quais elas ganham dinheiro.

Os impactos para o consumidor não são nada triviais. Por um lado, a empresa consegue se ajustar mais à demanda. Isso traz benefícios ao consumidor, pois diminuem suas chances de não encontrar o produto na loja mais próxima. Por exemplo, se o estabelecimento aprende que boa parte de sua clientela fiel compra fraldas descartáveis, ele pode se planejar de maneira mais efetiva. Assim, na maioria das vezes, os consumidores conseguem encontrar o produto na loja mais próxima.

Mas a empresa também consegue ajustar sua política de preços de acordo com o tipo de consumidor. E aqui o efeito é menos óbvio.

Firmas gostariam de cobrar preços diferentes de consumidores diferentes —preços maiores de quem está disposto a pagar mais, e menores para quem está disposto a pagar menos. Assim, elas conseguiriam mais dinheiro dos fregueses do primeiro tipo, sem perder os fregueses do segundo tipo. Só que, em geral, consumidores não revelam essa informação por livre e espontânea vontade. Afinal, ninguém quer pagar preços mais altos. Então as empresas utilizam outras informações para realizar essa discriminação de preços.

As informações coletadas nos programas de fidelidade podem municiar estratégias das empresas, que cobram preços diferenciados de acordo com a localização dos estabelecimentos. Se, com base nas informações sobre seus clientes de uma determinada vizinhança, uma cadeia de farmácias descobre que os consumidores são vidrados em fitoterápicos, cobre-se um preço mais alto deles! Claro, essas pessoas saem perdendo.

Em outras palavras, com programas de fidelidade, empresas ficam sabendo um pouco mais sobre nós. Trocamos nossos dados por descontos. E não é nada óbvio se saímos ganhando com isso.

Mauro Rodrigues (professor de economia na USP e autor do livro "Sob a lupa do economista") e equipe do Por Quê?

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