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Jornalista e autor de "Escola Brasileira de Futebol". Cobriu sete Copas e nove finais de Champions.

Nunca foi fácil para o Brasil vencer a Copa América

Há contradições incríveis em nossas análises atuais sobre futebol

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​O gol de falta mais famoso de Didi deu vitória por 1 a 0 sobre o Peru, em 1957. Classificou o Brasil nas eliminatórias para a Copa de 1958, na Suécia, mas foi comemorado de forma tímida, como se apreende da leitura de Nelson Rodrigues.

“Terminado o jogo, eu fiquei vendo a saída da multidão, que tinha qualquer coisa de fluvial em seu lento escoamento. Íamos todos tristes. E pior do que isso —íamos humilhados. Cada torcedor levava para casa a sensação vaga, obscura, de que se estava praticando um crime contra o futebol brasileiro. Houve qualquer coisa de funeral na vitória brasileira.”

O brasileiro Roberto Firmino dribla o goleiro Pedro Gallese para marcar o segundo gol da seleção contra o Peru, durante goleada por 5 a 0 na fase de grupos da Copa América - Miguel Schincariol - 22.jun.2019/AFP

Com seis jogadores que seriam campeões mundiais em 1958, o Brasil venceu com atuação arrastada. Garrincha chutou na trave, o peruano Lazón também. Com sua falta cobrada em estilo folha seca, Didi evitou o terceiro jogo da melhor de três que existiria em caso de empate, porque a primeira partida, em Lima, terminou 1 a 1.

Dois anos depois, a seleção fez sua primeira partida depois de ser campeã, na Suécia. O rival foi, de novo, o Peru, na estreia do Campeonato Sul-Americano de 1959, em Buenos Aires. O empate por 2 a 2 provocou Nelson Rodrigues a escrever, outra vez brilhantemente.

“Eis a verdade, amigos: — o empate de 2 x 2, com o Peru, dá vontade de sentar no meio-fio e chorar. Nunca o Brasil foi tão pouco campeão do mundo! Jogou o mesmo escrete da Suécia, com pouquíssimas alterações. Mas a equipe patrícia parecia o antiescrete, a negação do escrete que, após atuações feéricas, pôs no bolso a taça Jules Rimet. Alguém objetará que o empate não é derrota. Ao que eu respondo: — em certas condições, o empate é pior do que a derrota.”

Além de recordar que feérica é sinônimo de mágica, a releitura de textos do passado ajuda a pôr um pé na realidade. Há contradições incríveis em nossas análises atuais, e pode incluir este colunista nessa onda.

Se repetimos que o Brasil já não é potência, por que imaginamos que é preciso jogar como em 1958? Se elogiamos os trabalhos de longo prazo de França e Alemanha, por que cogitamos a demissão de Tite num empate contra o Paraguai? Se exaltamos a Islândia, que eliminou a Inglaterra e empatou com Portugal, na Eurocopa, por que sonhamos com uma goleada contra a seleção peruana? Goleada que, se não houver, resultará em críticas severas mesmo em caso de conquista da Copa América.

A seleção é refém de um sucesso que não possui há quatro Copas do Mundo e necessita de um trabalho de médio prazo para voltar ao nível que já teve. Hoje, faz parte da elite do futebol mundial, mas ela se expande, porque jogadores de países antes periféricos têm acesso às mesmas tecnologias, equipamentos e treinamentos dos clubes mais evoluídos. O peruano Paolo Guerrero cresceu no Bayern, e o venezuelano Rincón desenvolveu-se no Hamburgo e na Juventus. Hoje está no Torino.

Não é outra razão para a Albânia ter vencido Portugal em 2014 e a França em 2015. Os albaneses não foram à final da Eurocopa em 2016. Portugueses e franceses, sim. Imagine se os treinadores Fernando Santos e Didier Deschamps tivessem sido descartados depois dos vexames contra a Albânia. Provavelmente, Portugal não seria campeão da Europa, e a França não ganharia o mundo.

Tratou-se a Copa América como obrigação, em caso de vitória, e vexame, se houver derrota. É covardia. Parece mais certo pensar no torneio como sempre foi. Desprezado por nós brasileiros, de costas para a América Latina. Mas vencer nunca é desprezível. Especialmente com as coisas postas no lugar. A Copa América é um pedaço do caminho para o que realmente nos importa: ser campeão do mundo em 2022.

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