Jornalista e autor de "Escola Brasileira de Futebol". Cobriu sete Copas e nove finais de Champions.
Sonho de promessa do Vasco é o mesmo relatado por sequestrador do ônibus
Talles Magno contou com a ajuda da mãe, que fez rifa, para realizar o sonho de ser jogador
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A ameaça à arrancada do São Paulo, com cinco vitórias seguidas e dois pontos a menos do que o líder Santos, tem nome e sobrenome: Talles Magno. Menino do Vasco, é retrato do Rio de Janeiro, que virou manchete nesta semana, outra vez por razões alheias à sua vocação natural à festa e à alegria.
Talles nasceu num condomínio em Jacarepaguá, na zona oeste. Aos 9 anos, foi selecionado numa peneira do Vasco e convidado para participar de excursão a Portugal. Não tinha dinheiro. Sua mãe fez uma rifa de uma camisa do Vasco, para arrecadar parte do valor. Deixou de pagar a conta de luz, e o pai conseguiu empréstimo com seu patrão. Talles viajou, jogou e nunca mais saiu do caminho para ser craque.
Seu sonho é o mesmo relatado pelo sequestrador do ônibus da ponte Rio-Niterói, Willian Augusto da Silva. Durante as quatro horas em que manteve 39 passageiros como reféns no ônibus da linha 2520, William repetia que só queria entrar para a história.
Na manhã de terça, data do sequestro, o técnico português Jorge Jesus chegou ao Ninho do Urubu com perguntas sobre a geografia da cidade. Queria saber a extensão da ponte Rio-Niterói. São 13.290 metros. Do início da travessia sobre a baía de Guanabara até o CT do Flamengo, no bairro carioca de Vargem Grande, são 68 km.
Provavelmente sem entender a distância, o jornalista português Rui Santos escreveu que Jesus pensou em rescindir seu contato com o Flamengo em dezembro, por causa da violência. O treinador português disse que não pode comentar nada sobre o que não afirmou.
Sua família está em Portugal e, como o jornalista, certamente viu o noticiário.
O relato é de que os familiares adoraram o Rio nos dias que passaram na Barra da Tijuca. Se o Brasil inteiro se assustou com mais um caso de violência, imagine a família, em Portugal. Além de Jorge Jesus, o Ninho do Urubu tem outro habitante recente.
O menino Ronald, 17, eleito destaque do Torneio de Favelas e contratado pelo observador Waltinho, ex-jogador rubro-negro e filho de Silva, o Batuta, craque de Flamengo e Vasco na década de 1960.
Ronald ganhou o Torneio de Favelas pelo time do Gogó da Ema, comunidade de Belford Roxo onde nasceu o cantor Seu Jorge. O
Gogó da Ema é uma das razões de o campeonato amador, chamado “Brasileirão da Baixada”, ser disputado em turno e returno em campo neutro. No início de sua história, era ida e volta, cada um em seu campo. O medo de entrar em algumas comunidades obriga disputas nos campos neutros de Mesquita e Xerém. Toda semana, há de 400 a 800 espectadores.
O site da Associação dos Clubes de Futebol de Belford Roxo tem links para as páginas da CBF e da federação do Rio. Nem a FFERJ nem o diretor da base da CBF, o ex-lateral Branco, conhecem o torneio.
O site da associação de Belford Roxo apresenta um calendário com sete competições, uma sub-17. Além do Brasileirão da Baixada Fluminense, outro torneio amador da região é a Champions League de Duque de Caxias. “Trabalho na base há 12 anos e não conheço esses torneios”, diz Waltinho.
Depois de contratar Ronald, do Gogó da Ema, Waltinho lapida jogadores na Taça das Favelas de São Gonçalo, cidade onde vivia o sequestrador.“A gente está aqui hoje para ser espelho para alguém lá da nossa favela, porque toda vez que sai na televisão, só sai morte e amigo da gente sendo preso. Mas hoje, a gente fez história.”
A declaração é do menino Ronald, ao ser eleito craque da Taça das Favelas, em julho.
Neste domingo, Talles Magno é esperança de sua torcida e de sua família. Sua mãe não tinha uma arma, nem de brinquedo. Tinha uma camisa do Vasco, para vender numa rifa.
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