Siga a folha

Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.

Descrição de chapéu

Sobre a nova moda de 'lançar desafios', que são favores na verdade

Receio que o Verissimo já tenha falado do mesmo e eu esteja a fazer figura de bobo

Assinantes podem enviar 7 artigos por dia com acesso livre

ASSINE ou FAÇA LOGIN

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Antes que eu morra, gostaria de declarar sem margem para dúvidas a minha admiração por Luis Fernando Verissimo.

Numa entrevista à Paris Review, James Thurber disse que um dos maiores receios dos humoristas americanos de meados do século 20 era dedicarem-se a trabalhar num texto durante três semanas e depois descobrirem que o grande Robert Benchley já tinha escrito sobre o mesmo assunto, e melhor, duas ou três décadas antes.

Os humoristas de língua portuguesa do século 21 podem dizer a mesma coisa do Luis Fernando Verissimo.

É muito irritante. Acontece-me engraçar com uma particularidade qualquer da nossa língua e temer imediatamente duas coisas: que o Verissimo já tenha falado dela; que o Verissimo nunca tenha falado dela por não a achar suficientemente interessante.

Registro, por exemplo, que não se costuma exarar nada em outro lugar que não seja um documento legal. Ninguém exara coisas em outros documentos. “Exarei aqui uma lista de compras neste guardanapo” é uma frase que, muito provavelmente, nunca foi pronunciada. Do mesmo modo, as pessoas só envidam esforços. Pessoalmente, nunca envidei nem vi envidar mais nada. Mas receio o Verissimo já tenha falado do mesmo e eu esteja a fazer figura de bobo. Devia envidar esforços para verificar se ele exarou uma coisa parecida algures, mas tenho preguiça. E medo.

Há uma moda que, por ser recente (pelo menos, só dei por ela agora), talvez lhe tenha escapado. Trata-se do lançamento de desafios. Todas as semanas, alguém me “lança um desafio”. Em 90% dos casos, o lançador do desafio deseja, na verdade, um favor. Como pedir um favor envolve uma obrigação, opta por lançar um desafio, circunstância em que o obrigado passo a ser eu: devo ficar agradecido por ter sido resgatado à aborrecida modorra em que vivo, por intermédio de um interessante desafio.

A palavra “desafio” já exprimiu uma impertinência (“Paula Cristina, não me desafies que eu sou tua mãe”) e até competição (“O desafio entre Flamengo e Fluminense terminou com um empate”). Mas creio que só recentemente passou a ser um favor travestido. Creio que o objetivo é dificultar a recusa. Pode não haver tempo para fazer um favor, mas rejeitar um desafio é uma covardia. Sabem muito, estes estilistas da língua.

LINK PRESENTE: Gostou desta coluna? Assinante pode liberar o acesso gratuito de qualquer link para até cinco pessoas por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas