Siga a folha

Advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro.

A utopia da desconexão

Talvez seja preciso ser um bilionário para se dar ao luxo de não ter um smartphone

Assinantes podem enviar 7 artigos por dia com acesso livre

ASSINE ou FAÇA LOGIN

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Esteve no Brasil na semana passada o escritor Yuval Noah Harari, conhecido mundialmente por seus livros “Sapiens” e “Homo Deus”. Tive a oportunidade de conversar com ele em três eventos distintos, incluindo um realizado no Congresso Nacional, com presença massiva de parlamentares. Em uma das conversas, ele confessou que “não tem smartphone”.

Essa revelação leva a pensar o que significa no mundo de hoje —para quem tem condições de pagar por conexão— não ter um smartphone. 

O historiador Yuval Noah Harari durante palestra no Fórum Econômico Mundial, em Davos, em 2018 - Sandra Blaser - 24.jan.18/Fórum Econômico Mundial

Uma resposta a essa indagação pode ser encontrada involuntariamente no documentário sobre a vida de Bill Gates, recentemente lançado na Netflix (“O Código Bill Gates”). O documentário é interessante. No entanto, o que mais me chamou a atenção é o fato de que Gates vive praticamente desconectado. Ele lê livros em papel (muitos!) e dá a impressão de que raramente chega perto de um computador ou de um smartphone.

Isso ilustra o fato de que no mundo de hoje talvez seja preciso ser um bilionário do nível de Bill Gates para se dar ao luxo de não ter um smartphone.

Como disse Harari quando perguntei sobre isso: “O maior símbolo de status no mundo de hoje é a desconexão. Se você tem um smartphone, significa que você tem um chefe. Pode ser seu marido, seus filhos ou colegas de trabalho. Podem ser também os próprios aplicativos. Por meio do aparelho você está condicionado a ser acionado por alguém a qualquer momento”.

Harari diz que, apesar de não ter smartphone, seu marido tem. E isso o protege das infinitas demandas que vêm através do aparelho, segundo ele “abrindo tempo para que ele possa pensar e escrever”. 

Perguntei também o que ele recomendaria nesse contexto de overdose de informação. Sua resposta foi justamente a importância de buscar proteger espaços de desconexão. Criar “santuários” mentais. Momentos em que temos autonomia e tranquilidade para deixar a mente livre.

Esse é, aliás, um dos principais pontos enfatizados por Harari. A humanidade nos últimos séculos teve um progresso imenso na área de saúde, com a invenção das vacinas e dos antibióticos e avanços em medicina e prevenção. Não por acaso a expectativa de vida era de 49 anos nos Estados Unidos no início do século 20 e hoje é de 78 anos. 

O problema é que, se avançamos em saúde física, em saúde mental não se pode dizer o mesmo. Especialmente por causa da velocidade da mudança atual, casos de ansiedade ou depressão estão se tornando cada vez mais visíveis.

Harari lida com isso meditando duas horas por dia, além de partir uma vez por ano para um retiro isolado de ao menos um mês. Soluções que usualmente não são acessíveis à maioria das pessoas. 

No mundo em desenvolvimento, a situação é ainda mais paradoxal. Há ao mesmo tempo o desafio de conectar os desconectados e de reparar os excessos da ultraconexão. Tarefa cada vez mais difícil em um mundo em que a sobrevivência depende cada vez mais de estar conectado o tempo todo. 

No Brasil conheço apenas uma pessoa que, tendo dinheiro, optou por não ter smartphone. E você, quantas pessoas conhece?

Reader

Já era Esquecer que 40% dos brasileiros até 2018 nunca usaram um computador

Já é Trabalhar para conectar 100% do país e especialmente as escolas públicas

Já vem Cultivar autonomia para se desconectar
 

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas