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Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.

Descrição de chapéu
Ruy Castro

Um lápis e uma pena

Dois instrumentos de trabalho que mal ouso tocar porque, um dia, estiveram nas mãos de J. Carlos

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Ruy Castro

Em 1924, o caricaturista (como se chamavam os hoje cartunistas) J. Carlos e sua mulher, Lavínia, foram assistir ao começo da construção de sua casa, na rua Jardim Botânico, aqui no Rio. Era o prêmio por, até ali, 22 anos de trabalho em revistas como Fon-Fon!, Para Todos... e Careta. J. Carlos achou que o momento exigia certa solenidade, como a deposição de uma simbólica pedra fundamental no terreno. Mas olhou em torno e não viu nenhuma pedra. Então teve um lampejo exclusivo dos gênios.

Capas do caricaturista J. Carlos para a revista Para Todos..., foto de um de seus estojos e uma pena e um lápis que pertenceram a ele - Heloisa Seixas

Tirou do bolso um lápis —o instrumento com que produzia capas, páginas duplas, letras para títulos, vinhetas, adornos e sua maior criação, a melindrosa, a garota carioca dos anos 20. Fez ponta no lápis com um canivete e cravou-o delicadamente no solo. Um lápis se compõe de madeira e grafite. O grafite é uma pedra. Era a pedra fundamental de sua vida. Um ano depois, a casa ficou pronta —a única no mundo sustentada por um lápis.

Tive a felicidade de saber desta história a tempo de incluí-la em meu livro "Metrópole à Beira-Mar —O Rio Moderno dos Anos 20", cuja capa, uma deliciosa melindrosa na praia, era uma capa de Para Todos..., de 1927, por J. Carlos. Ao preparar o livro, tive também a sorte de conhecer José Carlos de Britto e Cunha, neto e xará de J. Carlos. Ele e sua família têm carregado a chama de J. Carlos desde a morte dele, em 1950, aos 66 anos —não por coincidência, à prancheta, com um lápis na mão.

Quase tudo de J. Carlos está preservado: desenhos impressos, originais, esboços e até os estojos contendo seus lápis, penas, tintas e borrachas. É um tesouro das artes gráficas brasileiras, que retorna com frequência em livros e exposições.

Tesouro agora desfalcado de um lápis e de uma pena que me foram presenteados pela enorme generosidade de José Carlos. Um lápis e uma pena que mal ouso tocar porque, um dia, estiveram nas mãos de J. Carlos.

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