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Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.

Cultura também é turismo

A livraria Shakespeare & Company, em Paris, tem fila na porta, como se fosse o Bateau Mouche

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Foi outro dia, em Paris. Vista de longe, era uma excursão normal: um grupo de turistas à porta de um endereço, em fila para entrar e respirar os eflúvios da história que teria acontecido ali. O lugar era a Shakespeare & Company, a livraria da rue de la Bûcherie, na Rive Gauche. Fila para livraria? Pode crer. O fato de a turma parecer ter vindo da Torre Eiffel, das Galeries Lafayette e do Bateau Mouche direto para a Shakespeare & Company provava que turismo também podia ser cultura. Afinal, dali saíra, em 1922, a 1ª edição do "Ulysses" de James Joyce, não?

Cheguei mais perto e, em meio à babel, ouvi falas de Nova York, Tóquio, São Paulo. Pensei escutar os nomes de Ezra Pound, T. S. Eliot, Ernest Hemingway e Scott Fitzgerald, figuras carimbadas da livraria na época, ditos com naturalidade. Um turista recitava os "Cantos", de Pound. Outro contava como Gertrude Stein, depois de anos escrevendo que uma rosa era uma rosa era uma rosa, virou uma onça quando Joyce ficou mais famoso do que ela em Paris. E, claro, não faltavam referências à americana Sylvia Beach, fundadora da livraria e responsável pela edição do "Ulysses" e por juntar aqueles gênios.

Mas que nada, era tudo imaginação minha. Ninguém no grupo parecia saber que aquela Shakespeare & Company não era a livraria original de Sylvia Beach, e que, esta, sim, na rue de l’Odéon, nº 12, é que era o point vanguardista na Paris dos Anos Loucos. Sylvia manteve sua loja até 1941, quando teve de fechá-la. Em 1964, outro americano, bem esperto, viu a marca dando sopa e pespegou-a à sua livraria na rue de la Bûcherie. As pessoas acreditaram e até hoje pensam que foi ali que se imprimiu o "Ulysses".

Mas de que interessa isso aos turistas? Eles entram por uma porta, olham as prateleiras por cinco minutos e saem pela outra sem sequer comprar um livro —nem mesmo o "Ulysses". Cultura também é turismo.

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