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Bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA).

Descrição de chapéu Mente

Ou isto ou aquilo

Cabe a cada um de nós, donos de um cérebro e de um título de eleitor, escolher onde apostar nossos recursos escassos

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"Ou se tem chuva e não se tem sol, ou se tem sol e não se tem chuva", disse Cecília Meireles no poeminha que minha mãe me fez decorar quando criança. A mensagem ficou comigo, e eu a repasso às minhas crianças: ou guardo o dinheiro e não compro o doce, ou compro o doce e não guardo o dinheiro. Agora, após décadas de educação e com minha experiência de pesquisa sobre como se fazem cérebros diferentes, descubro que Ou Isto Ou Aquilo tem uma razão de ser biologicamente fundamental: decisões acontecem quando recursos são escassos.

Tempo e espaço são dois deles. Universos paralelos à parte ("multiversos" é o cacete, coisa da Marvel se apoderando do imaginário popular), nossa existência no mundo que percebemos é limitada a uma coisa em um lugar de cada vez: quem sobe nos ares não fica no chão, quem fica no chão não sobe nos ares.

Intersecção entre ruas - 13.mai.2022 - Anthony Wallace/AFP

Energia é o outro recurso eternamente em escassez para nós, animais. Não nos basta existir imersos em luz, ar e matéria, como as plantas; precisamos agir para obter energia para continuar agindo —e, no entanto, todo ato custa energia. Manter-se vivo requer se mexer para ficar em pé, correr para ficar no mesmo lugar.

E dinheiro, claro, é a moeda de troca que transforma tempo em espaço, trabalho em energia, energia em tempo. Dinheiro poderia ser recurso exatamente tão escasso quanto o tempo ou espaço ou trabalho ou energia que lhe dão origem, mas regras diferentes de conversão se aplicam de acordo com quem as faz. Isso, também, são decisões: atos alheios que ditam se o que acontece com nosso tempo e esforço é Isto ou Aquilo.

Como e para que tomamos decisões são outros quinhentos. Animais dotados de um cérebro capaz de representar passado e futuro, como nós, têm a capacidade de aprender com a própria experiência e usá-la para fazer previsões de estados possíveis e prováveis, e então agir de acordo, em prol do futuro que se deseja. Se essa capacidade é de fato posta em prática são mais outros quinhentos; a história mostra que seres humanos, e brasileiros em particular, são muito hábeis em desprezar o que poderiam ter sido lições do passado. Ainda assim, permanece o fato: decisões são tomadas conforme o cérebro compara estados futuros e age em prol de um, e não de outro.

E tudo isso para quê? Para a satisfação e contentamento do dono do cérebro, é o que aprendi com a neurociência. Soa ruim, mas esta é a boa notícia. O que torna uma decisão boa depende do cérebro que decide, que pode só pensar em seu próprio estado futuro, de bolsos cheios e conta bancária farta —mas também pode incluir em seu futuro desejado a saúde, educação e bem-estar dos outros.

Cabe a cada um de nós, donos de um cérebro e de um título de eleitor, escolher no que queremos apostar nossos recursos escassos. Eu, ao contrário de Cecília Meireles, já entendi perfeitamente que Aquilo é muito melhor do que Isto, no momento...

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