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Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

Descrição de chapéu China

Há um fosso entre novos bilionários e ex-pobres na China

Desigualdade não é algo novo, mas atacá-la tornou-se urgente para Pequim

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Se os 400 bilionários da China continental formassem um país, ele seria a 8ª economia do mundo. Seu PIB seria maior que o do Brasil. Sim, são 400 pessoas com a riqueza superior a de 210 milhões de brasileiros.

Em 2020, esses bilionários viram sua fortuna crescer US$ 750 bilhões (R$ 4 trilhões), um aumento espantoso de 60% em relação a 2019, segundo a Forbes. De longe, a China foi o país onde os ricos se tornaram ainda mais ricos.

Hoje, às vésperas do feriado do Ano-Novo chinês, as filas em frente às lojas de luxo em Pequim são apenas o sinal mais visível desse fenômeno.

Pessoas passam por loja da marca de luxo Gucci em complexo comercial em Pequim - Tingshu Wang - 19.set.2020/Reuters

​O contraste é também de espantar. Com uma população de 1,4 bilhão de habitantes, a China tem 600 milhões de pessoas vivendo com até US$ 150 (R$ 815) por mês, como lembrou o primeiro-ministro Li Keqian no ano passado.

De fato, se o crescimento na China foi acelerado, o aumento da distância entre a base e o topo da pirâmide também o foi.

Em 2017, o economista francês Thomas Piketty notou que, no passado, o nível de desigualdade na China era próximo ao dos países nórdicos. Claro, os chineses eram, digamos, igualmente pobres.

A questão é que, com o tempo, a desigualdade foi se aproximando do nível dos EUA. Segundo Piketty, os 10% do topo da pirâmide tinham 41% da riqueza nacional em 2015, mas detinham apenas 27% em 1978. (No Brasil, os 10% possuíam 42,5% em 2018, segundo o Banco Mundial.)

Pelas contas de Pequim, a pobreza não é exatamente um problema na China desde o fim de 2020. Com isso, atacar a desigualdade e expandir a classe média ganharão importância entre as prioridades nacionais.

​No ano passado, Xi Jinping falou claramente na necessidade de distribuir os frutos do crescimento de forma mais justa. Na semana passada, voltou a falar sobre disparidade de renda e diferença entre campo e cidade, possivelmente o maior desafio na distribuição de riqueza no país.

​A desigualdade não é algo novo, mas atacá-la tornou-se urgente para a China porque diminuir a brecha da riqueza tornou-se um imperativo econômico. Pelo novo plano quinquenal, o governo pretende estimular o crescimento da economia por meio de consumo doméstico. No entanto, a concentração excessiva de renda limita a expansão do mercado de consumo.

Como em outras partes do mundo, a pandemia agravou a desigualdade. Trabalhadores migrantes foram especialmente prejudicados. A recuperação econômica foi rápida mas não balanceada. Os bilionários, como indica a Forbes, saíram muito à frente.

​“Devemos deixar que alguns fiquem ricos primeiro”, é uma frase de Deng Xiaoping citada com frequência. Deng completou: "para que todos atinjam a prosperidade depois” —mas essa parte nem sempre é lembrada.

De fato, a China não teria chegado aonde chegou se quisesse fazer subir igualmente todos os barcos ao mesmo tempo. No entanto, como lembrava Deng, ricos e super-ricos deveriam servir de alavanca para a renda dos demais.

Não pega bem para um país que se diz socialista, comandado por um partido comunista, deter o título de uma das sociedades mais desiguais do mundo. Além de constituir um imperativo ético e uma necessidade econômica, o combate à desigualdade é uma questão de legitimidade para o modelo político chinês.

​Desigualdade receberá mais atenção agora que os pobres são ex-pobres. E os bilionários, mais bilionários que nunca.

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