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A coluna é assinada pelo jornalista Mauro Zafalon, formado em jornalismo e ciências sociais, com MBA em derivativos na USP.

Coronavírus dá a chance à nova geração de saber como era na época de inflação elevada

Diferentemente de trinta anos atrás, indústria está produzindo e há oferta de produtos

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São Paulo

Março de 1990: 82,4%. Essa foi a variação recorde do IPCA há exatos 30 anos. O coronavírus poderá dar aos que nasceram nestas últimas três décadas uma noção do que ocorria no país no período de inflação explosiva, antes do Plano Real, em 1994.

Todo início de mês era uma corrida aos supermercados para a garantia de estoque de produtos básicos em casa. Foi a era dos frezeers domiciliares. Nos pontos de vendas, filas, correria e prateleiras sem mercadorias eram comuns naqueles tempos.

É o que começa a se desenhar em vários pontos de varejo atualmente. Nesta terça-feira (17), além das dificuldades nas compras, consumidores de um supermercado da Barra Funda, na capital paulista, viam uma funcionária apressadamente recolocando novas tarjetas de preços nas prateleiras.

Os motivos de hoje, porém, são bem diferentes dos de há três décadas. A indústria está produzindo, há oferta de produtos e a correria se dá por causa das incertezas trazidas pela Covid-19.

Naquela época, as antecipações de compras ocorriam devido ao derretimento do poder de compra do dinheiro e à necessidade de o consumidor ter um aproveitamento melhor de seu salário.

Em março de 1990, a inflação diária atingiu 2%. Isso significa que um bem que custasse NCz$ 1.000,00 no início do mês, estaria a NCz$ 1.882,40 no final do período. A moeda era o cruzado novo.

Com isso, as únicas maneiras de proteção eram as compras antecipadas ou aplicação do dinheiro imediatamente após o recebimento do salário.

Uma das formas de investimento para os de menor poder aquisitivo eram as cadernetas de poupança diárias. Alguns investidores chegavam a ter 28 delas, uma para cada dia do mês.

Outros apelavam para o dólar, uma ação disseminada e utilizada pela maioria da população. Paulo Guedes, ministro da Economia, ficaria surpreso porque até as domésticas trocavam parte de seu salário por dólares. Não iam à Disneylândia, mas garantiam uma renda melhor.

Em apenas cinco meses —de novembro de 1989 a março de 1990—, a inflação atingiu 1.103%. No acumulado do Plano Real — últimos 26 anos—, a evolução é de 523%.

Foi um período de congelamento de preços, controle e confisco de bois no pasto por helicóptero e negociações em açougues a portas fechadas para burlar o congelamento de preços.

Era difícil até mesmo para os índices de inflação, que não conseguiam coletar preços devido à ausência de produtos nas prateleiras.

Heron do Carmo, ex-coordenador do IPC da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) no período dessa inflação elevada, diz que o cenário atual é completamente diferente.

“Não há uma crise de abastecimento e um desestímulo à oferta, como no passado”. Haverá, segundo ele, problemas de curto prazo. As pessoas têm de ficar em isolamento e estão fazendo estoques para se precaver e não ir aos supermercados.

As indústrias estão com capacidade ociosa e esses estoques serão repostos, mas o poder de renda das pessoas está limitado. Com isso, segundo ele, essa nova corrida não vai gerar inflação.

Ao contrário, poderá trazer deflação, devido à redução de várias atividades da economia e ao isolamento das pessoas.

Isolado em casa e, como diz, "treinando para a aposentadoria", Heron, professor da FEA/USP e consultor da PontoMap, empresa que produz indicadores de impacto das mídias sociais, faz algumas ressalvas.

Essa situação é efeito da globalização das informações. As pessoas estão antecipando aqui o que os outros países já viveram após a chegada do coronavírus.

Se o setor de transporte for afetado, contudo, e não houver uma circulação normal de mercadorias, principalmente a de alimentos, o cenário será outro, segundo ele.

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