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Diretora do Instituto Gerar de Psicanálise, autora de “O Mal-estar na Maternidade” e "Criar Filhos no Século XXI". É doutora em psicologia pela USP.

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A última vez em que me senti tão assolada por um acontecimento foi na eleição do atual presidente —é duro usar um termo tão nobre para nomear esse senhor.

Lembro da desolação geral, da sensação de perigo iminente, da impotência diante da escolha que a maioria da população fazia, mas também do sentido de urgência para tentar se contrapor ao pior.

Bolsonaro prometeu em campanha desmontar o que mais se precisa construir neste país: inclusão social, igualdade de gênero, preservação ambiental, fortalecimento da saúde pública, investimento na educação.

As claras intenções de desmonte do serviço público foram justificadas pela virada econômica que nos
tiraria do buraco.

Parte de seus eleitores o elegeu por se identificar com sua agenda antidemocrática —pró torturadores, ditadura e horrores afins—, mas grande parte o apoiava em favor de uma certa agenda econômica que não pensa no bem comum —demonstração clara do histórico desapreço brasileiro pela coletividade.

Antonio Prata escancarou, em sua última e brilhante coluna, a escolha que se fez naquele momento: “levar os filhos num pediatra sabidamente pedófilo porque é um médico competente”.

Sem a desculpa, no entanto, de supor que ele seria competente. Afinal, são 30 anos de vida pública a provar o contrário.

Por fim, vivemos a combinação de uma presidência vexatória, de resultados pífios na economia e de uma pandemia.

Nas relações íntimas, essa combinação nos obriga a repensar o efeito psíquico da privação de alguns laços sociais e do excesso de outros.

Essa é a hora de rever nossa relação com familiares e com o espaço doméstico, que costuma ser terceirizado no Brasil.

Crianças e adolescentes precisam ser informados do que acontece de maneira a se engajarem na nova situação, fazendo sua parte e ajudando dentro de casa.

Prometo falar mais sobre isso oportunamente. No artigo de hoje, opto por pensar nas relações entre cidadãos, pois os acontecimentos obrigam a sociedade civil, as instituições democráticas e os políticos que fazem jus ao título assumirem protagonismos inéditos.

Algumas ameaças são incontornáveis: muitos morrerão, o sistema de saúde não dará conta de tratar a todos e a economia ficará profundamente abalada.

Mas temos a ameaça imprevisível, cuja probabilidade de ocorrer aumenta a cada gesto de sandice presidencial: o colapso social decorrente do absoluto desamparo a que está submetida a maior parte da nossa população.

É impossível falar em isolamento social e higiene das mãos para quem não tem espaço físico e saneamento básico; é impossível pedir que se aguente a fome até que dias melhores venham. Entre o inevitável e o provável, é hora de virar o jogo.

Gilson Rodrigues, líder comunitário de Paraisópolis, lembra que a palavra favela ainda não entrou na agenda dos governos.

Ele descreve a organização emergencial que está sendo criada pelos moradores desse bairro precarizado, que poderá servir de modelo a ser replicado.

As lideranças de Paraisópolis estão identificando 420 voluntários, que ficarão responsáveis por acompanhar as condições e necessidades de 50 casas, cobrindo 21 mil domicílios que abrigam 100 mil habitantes.

Sua missão é orientar as famílias, tentar prover o necessário, identificar quem precisa ser levado ao hospital e lutar por conseguir uma ambulância que os transporte. O nome desses líderes voluntários
é “presidente da rua”.

É em casos como esse que encontramos um uso a altura do termo.

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