Mortes: Dona do próprio tempo, viveu o sonho de ser professora
Luzia Bispo da Silva formou-se em geografia após 50 anos de idade
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Era impossível não notar a presença marcante da professora Luzia Bispo da Silva. A neta, a jornalista Aline Luiza Alves Pardos, 38, conta que sua entrada em casa acontecia de forma triunfal e espalhafatosa: “cheia de sacolas, falando alto e fazendo barulho”.
A alegria dava lugar ao mau humor quando alguém lhe perguntava a idade. O segredo, guardado a sete chaves, morreu com ela, no dia 29 de novembro.
Segundo familiares, ao chegar a São Paulo, Luzia providenciou novos documentos e alterou o ano de nascimento para 1938.
Natural de Jaguaquara, interior da Bahia, Luzia não conheceu o pai e perdeu a mãe muito cedo. Passou parte da vida nos municípios baianos Ibicuí e Vitória da Conquista —lá casou-se com Adriano Bispo da Silva e teve a primeira filha. As demais nasceram no interior paulista.
O sonho de ser professora a acompanhava desde cedo, pois enquanto morava na roça ensinava o pouco que sabia na fazenda onde trabalhava.
A partir dos anos 1960, quando chegou a São Paulo, fez de tudo um pouco: foi de costureira a exímia cozinheira.
Após 50 anos de idade, formou-se em geografia e realizou o sonho de ser professora.
Em muitos momentos ao longo da vida, venceu preconceitos por ser negra, mulher, da periferia e nordestina.
Luzia tinha “rodinhas nos pés”. Inquieta, circulava pela capital, pelo interior e outros estados em visitas aos parentes e amigos. Por onde passava, fazia amizade fácil e conquistava todos.
Já em idade avançada, tirou carteira de motorista e deixou a família de “cabelo em pé”.
Há alguns anos foi diagnosticada com Mal de Alzheimer, mas surpreendia nas conversas lúcidas e nos comentários sobre qualquer tema.
Seu nome foi uma homenagem a Santa Luzia por ter nascido no mesmo dia, 13 de dezembro.
Aos 82 anos, complicações de uma pancreatite colocaram um ponto final na história de sonhos e batalhas de Luzia. Viúva, ela deixa quatro filhas, 11 netos e 12 bisnetos.
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