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Conselho decide se tomba parte da Vila Mariana, em SP

Caso da Chácara das Jaboticabeiras será único tema de reunião extraordinária do Conpresp convocada para esta segunda (5)

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São Paulo

Na tarde desta segunda-feira (5), deve chegar ao fim um processo que mobiliza há mais de dois anos moradores de um pedaço da Vila Mariana, bairro da zona sul de São Paulo.

Em reunião extraordinária, o Conpresp (Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo) decidirá se tomba ou não o pedaço do bairro que ficou conhecido como Chácara das Jaboticabeiras.

A região, cujo nome deriva daquele dado ao loteamento original, iniciado em 1925 e batizado Villa Jaboticabeiras, é delimitada pelas ruas Domingos de Morais, Joaquim Távora, Humberto 1° e pela avenida Conselheiro Rodrigues Alves.

A proteção, que não abrange os imóveis, mas as características urbanísticas da área, está em análise desde setembro de 2019, quando o Conpresp decidiu pela abertura do processo de tombamento.

Na prática, a partir daí, são elaborados estudos pelo DPH (Departamento do Patrimônio Histórico) a fim de fixar, numa minuta, quais seriam as regras para o local, caso o conselho vote por tombá-lo.

As regras devem levar em conta aspectos que interferem na ambiência, como o gabarito —a altura máxima que podem ter as construções— e o remembramento de lotes —união de dois ou mais para dar lugar a novas edificações.

A possibilidade de que a minuta permita o remembramento com lotes externos ao perímetro é uma das principais preocupações do coletivo Chácara das Jaboticabeiras, que pediu o tombamento.

Como explicava o parecer do DPH anterior à abertura do processo de tombamento, a união de lotes de dentro da Chácara com outros em ruas do perímetro poderia gerar situações em que edifícios com endereço no lado “de fora” dessem as costas para a parte “de dentro".

Um grande muro de fundos, por exemplo, voltado para uma das ruazinhas, também descaracterizaria o espaço que os moradores querem preservar.

“É uma brecha que a lei abriria para desconfigurar a ambiência, a própria proteção”, diz a arquiteta Maria Albertina Jorge Carvalho, que coordenou a elaboração do pedido apresentado pelo coletivo ao Conpresp.

A reunião em que foi aberto o processo de tombamento não foi sem diferenças.

Enquanto o parecer do DPH foi favorável aos argumentos do extenso relatório enviado por Albertina, membros do conselho argumentaram contra o que o grupo pretendia. Vizinhos que moram na região e que se opõem ao tombamento também se manifestaram na ocasião.

Marcelo Manhães de Almeida, então representante da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) —o conselho foi renovado no ano passado—, votou contra a preservação, argumentando basicamente que o PDE (Plano Diretor Estratégico) de 2014 previa que a área fosse adensada.

A região encontra-se em uma ZEU, sigla que designa zonas sob influência de eixos de transporte —no caso, o largo Ana Rosa, com terminal de ônibus e estação de metrô—, as quais, pelo PDE, devem ser alvo de adensamento populacional.

De 2014 a 2020, foram licenciados 129 empreendimentos residenciais em eixos de estruturação e transformação urbana na subprefeitura da Vila Mariana, segundo dados da administração municipal. Fica atrás apenas da Penha, que teve 133, para compor o total de 741 imóveis licenciados em ZEUs no período.

O pedido de tombamento feito pelo grupo contemplava a hidrografia, a fauna e a flora locais, mas ressaltava em especial a qualidade do tecido social conformado nesse espaço de 109 lotes residenciais, dos quais somente 10 eram ocupados por edifícios.

O coletivo se organizou em 2018 para fazer frente ao assédio de incorporadoras motivado pela diretriz de adensamento em ZEU.

Segundo Maria Albertina Jorge Carvalho, nem a abertura do processo de tombamento reprimiu o interesse no bolsão verde com ruas de paralelepípedo —que, conforme revelou a pesquisa do grupo, foram traçadas por Francisco Prestes Maia antes de ele se tornar o autor do Plano de Avenidas, que redesenhou São Paulo e, mais tarde, prefeito da cidade.

Ela conta o caso de um vizinho que se mudou recentemente para a região e está recuperando uma casa antiga para morar. A pessoa da construtora que o procurou teria dito ter certeza de que não sai o tombamento.

No quintal dessa casa, aliás, há um elemento extra que os vizinhos elencam entre os argumentos pela preservação. Ali passa o córrego Guariba, que vai dar no lago do parque Ibirapuera e cujas nascentes estão no entorno de uma praça da Chácara das Jaboticabeiras. Sua água aflora entre as pedras do calçamento.

“As águas estão sempre desaparecidas nos nossos mapas; aparecem de repente nos dias de chuva”, diz Albertina. O coletivo contratou um engenheiro para fazer a inspeção das nascentes e demarcar o percurso do córrego.

Hoje a descoberta consta do GeoSampa, o mapa digital da cidade que traz informações como dados cadastrais, aspectos de infraestrutura urbana e dados físicos, como a hidrografia, entre outros.

Albertina diz que, ao longo desses dois anos, ficou ainda mais convicta do peso do fator ambiental na causa, em especial a questão do microclima que a região é capaz de favorecer, em meio ao paredão de prédios que a cerca.

“É um refúgio para os pássaros, para os insetos. E para o ser humano é muito importante. Você sai de uma área de tensão e vai para uma área de calmaria.”

O tombamento foi o meio encontrado pelo coletivo para preservar as características do local uma vez que, entre as definições do PDE, em 2014, e a definição da LPUOS (Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo), em 2016, não foi feito um plano de bairro para a Chácara das Jaboticabeiras.

Planos de bairro eram um dos instrumentos de planejamento previstos no PDE para que suas regras, que seguem uma visão macro da cidade, não passassem por cima de particularidades como as desse pedaço da Vila Mariana.

Pouco difundidos, eles deveriam ter sido propostos por subprefeituras e associações de moradores, a fim de que fossem incorporadas à LPUOS zonas de proteção para regiões de interesse histórico, cultural ou ambiental.

Mas, para Albertina, independentemente de planos de bairro ou da lei de zoneamento, o próprio PDE dá a chave para a preservação, no inciso II do artigo 23. O texto fala em “compatibilizar o adensamento com o respeito às características ambientais, geológico-geotécnicas e os bens e áreas de valor histórico, cultural, paisagístico e religioso”. Portanto, conclui a arquiteta, “tombar a Chácara é respeitar o Plano Diretor”.

A reunião acontece de forma remota às 14h30 de segunda e é pública, podendo ser acompanhada, ao vivo, no canal do Conpresp no YouTube.

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