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Cinema

Contraste entre imigrante e burgueses é o encanto de 'Synonymes'

O Festival de Berlim deixou de lado sua tradição de premiações acadêmicas e deu o Urso de Ouro a este filme tão forte, estranho e original

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Avaliação: Ótimo
  • Quando: Estreia nesta quinta (12)
  • Elenco: Tom Mercier, Quentin Dolmaire e Louise Chevillotte
  • Produção: França/Israel/Alemanha, 2019
  • Direção: Nadav Lapid

Sentindo-se decepcionado com seu país, o jovem israelense Yoav decide lhe dar as costas. Após a decisão radical, busca refúgio na França: eis o princípio bem simples de “Synonymes”.

Mas só o princípio é simples nesse longa fartamente autobiográfico de Nadav Lapid. Para Yoav, trata-se de encontrar no novo país o mito do lugar receptivo, acolhedor dos dissidentes, e esquecer Israel.

Este é um filme estranho já a partir de seu nome. Depois, é estranho em suas primeiras imagens: as de Yoav, mochila nas costas, que a câmera na mão ora segue, ora adota o ponto de vista do personagem e foca o chão.

O chão de Paris. Logo na chegada, no entanto, ele verá que a França não é um lugar tão acolhedor quanto imagina. No apartamento onde passa sua primeira noite, é roubado até da roupa do corpo enquanto toma banho. Depois de andar pelado pelo edifício, é socorrido por dois gentis vizinhos, Émile e Caroline, que o salvam de morrer congelado e que se tornarão, praticamente, seus únicos amigos e pontos de referência em Paris.

Quase tão importante quanto sobreviver é a compra de um bom dicionário. Como conhece pouco a língua do novo país, precisa inteirar-se dela.

Em suas conversas com os novos amigos, eles notarão como é estranho o seu francês. Sim, pois quem fala uma língua estrangeira nunca fala como o nativo do lugar. Pode ser mais rebuscado ou formal, mas nunca é a mesma coisa —assim como os sinônimos trazem correspondências, mas significam sempre algo ligeiramente diferente.

Yoav busca “o coração da cidade”, que não encontra. Émile lhe diz que talvez esse coração não exista: “Tudo é podre e banal, como em qualquer lugar”. Yoav não se deixa intimidar. Israel morrerá antes dele, diz ao amigo: “Eu vou ser francês”. Belas e enérgicas palavras, embora a realidade se mostre mais complexa.

Talvez Yoav não tenha se dado conta, mas, assim como Nadav Lapid, traz um quê um tanto áspero, bárbaro e vital, a essa civilização europeia acomodada em si mesma. É o que faz em grande medida o encanto do filme: esse contraste entre o jovem recém-chegado e os amigos, burgueses, bem sedimentados no lugar, mas que de algum modo transmitem a sensação de falência, de impossibilidade.

Talvez se possa dizer o mesmo do filme: há algo de urgente, de profundamente inquieto na forma que dá a seu filme. Como se o corpo de seu personagem fosse um lugar a que falta algo, algo que ele busca, mas nunca encontra.

Pois “Synonymes” é em grande medida esse encontro de um outro no mesmo corpo. É ser exterior ao lugar que adotou para viver e ao mesmo tempo não ser: uma quase esquizofrenia. O que pode levá-lo desde um casamento arranjado até a fazer um escândalo diante dos músicos da orquestra em que toca Caroline, dizendo aos berros que pretende salvar “essa República que está afundando”.

Isso durante outra cena notável, pela ousadia, pela beleza, pelo desespero e que faz entender por que o Festival de Berlim deixou de lado sua tradição de premiações acadêmicas e deu o Urso de Ouro a este filme tão forte, estranho e original.

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