Artista perfura corações com milhares de alfinetes para tratar de amor em exposição
Dee Lazzerini mostra em São Paulo conjunto de trabalhos sobre sua extensa pesquisa em torno deste pequeno objeto de costura
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São de 12 a 15 horas por dia colocando alfinetes em moldes de poliuretano, um trabalho totalmente obsessivo. Algumas das peças são pequenas, em formato de coração humano, mas outras têm a dimensão de uma perna ou um braço, por exemplo. Todas cravejadas de agulhas, até não haver mais espaço.
Tendo como guia de seu trabalho esta pequena ferramenta de costura, Dee Lazzerini leva ao Museu de Arte Brasileira da Faap, em São Paulo, uma mostra com dezenas de obras que capta a sua produção dos últimos anos, quando passou a se dedicar integralmente à arte depois de largar a odontologia.
O título da exposição, "Latência", se refere a quando as coisas estão em vias de acontecer. "Faço a analogia com o alfinete perfurando a pele, quando ele está bem pertinho da sua pele", diz o artista, acrescentando que os alfinetes têm uma certa ambiguidade. Por um lado, eles são objetos mínimos, frágeis e delicados, mas ao mesmo tempo podem ser uma arma.
Contudo, quando cravados aos montes sobre uma superfície, servem como uma membrana de proteção. É o caso, por exemplo, de uma instalação com 80 corações de espinho dispostos de cima a baixo numa parede. Cada um traz estampada a bandeira de um país —Brasil incluso—, tirado de uma lista que compila as nações mais felizes do mundo.
O coração é um elemento que se repete na mostra. Para outra obra, o artista e seu marido literalmente deram o sangue, os dois ao mesmo tempo —o fluido viajava do braço de ambos por uma canaleta e preenchia um pequeno coração de resina, exposto no museu dentro de uma caixinha transparente, assim como o vídeo da feitura da obra.
A fixação pelo órgão responsável por bombear o sangue é tanta que o artista tem um coração humano tatuado no meio do peito, desenho que fez questão de deixar à mostra no coquetel de abertura da exposição, ao vestir uma camisa com um amplo decote.
"É amor, não tem outra palavra para resumir o meu trabalho", diz Lazzerini. "A gente não leva nada daqui e a gente não percebe isso. De repente morreu e acabou. Se uma pessoa não ajudar a outra, nada acontece."
Natural de Belo Horizonte, Lazzerini trabalhou por mais de 20 anos como dentista até abandonar a profissão para se dedicar integralmente às artes plásticas, que antes eram uma atividade paralela. Não é um acaso, portanto, as referências ao corpo humano e às ciências biológicas espalhadas por suas obras.
Na série "Entomologia", ele finca reproduções de insetos em alfinetes banhados a ouro. Então, preenche os cupins, besouros e joaninhas com purpurina, serragem, água e seu próprio sangue, que colocou dentro de um pernilongo. É uma tentativa de "fossilizar a natureza", afirma.
Em outra série, o artista decompõe o alfinete nas suas formas básicas —a linha da agulha, o ponto da cabeça e o cone da ponta— e as recombina de diversas formas, criando assim delicadas esculturas abstratas em miniatura, prontas para serem reproduzidas em maior escala.
Lazzerini conta que teve "uma infância feminina", tendo mais contato com a mãe do que com o pai e com a irmã do que com o irmão. As mulheres de sua família faziam tricô e crochê, e ele relata passar tardes com a avó, que usava uma daquelas almofadinhas de cravar alfinete para costurar.
Se de sua criação decorre o aspecto afetivo de seu trabalho, ele transformou o universo da costura em arte. "O alfinete é a minha tinta."
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