Livro sobre a Heineken expõe dilemas de fazer negócios em países pobres
Autor analisa a atuação da cervejaria na África e aponta abusos de poder
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Em abril de 1994, um avião que transportava Juvénal Habyarimana, presidente de Ruanda, e Cyprien Ntaryamira, presidente do Burundi, foi derrubado perto de Kigali, a capital ruandesa. O assassinato deflagrou o genocídio que resultou em 1 milhão de mortes em Ruanda.
Há uma nota de pé de página macabra nessa história. De acordo com "Heineken in Africa", livro de Olivier van Beemen, os corpos dos dois presidentes terminaram armazenados nos freezers da fabricante de cerveja holandesa.
Em seus países, a Heineken operava salas refrigeradas, raras ali, que também serviam como necrotérios públicos.
A história ilustra o tema principal da obra --a disparidade de poder entre uma das fabricantes de cerveja mais lucrativas do planeta e os países africanos pobres nos quais ela realiza parte de seus lucros.
A desigualdade no relacionamento confere imensa influência a multinacionais que operam em países pobres.
A Heineken, em muitos casos, é um dos maiores contribuintes no país em que opera. Sua possível influência sobre a política de nações em que os controles institucionais são fracos pode ser muito grande.
A empresa teria de demonstrar diligência extraordinária para emergir de relacionamentos tão desproporcionais com sua integridade moral intacta. E van Beemen diz, com base em cinco anos de pesquisas, que isso não acontece.
As afirmações dele variam do esperado (publicidade e manobras tributárias agressivas, impacto sobre o alcoolismo) ao contencioso. A Heineken rejeita totalmente as acusações e contesta a precisão de partes do livro e a imparcialidade do autor.
Mas van Beemen ainda assim revela práticas questionáveis, bem como dilemas enfrentados por qualquer empresa que opere em país pobre.
O que fazer se grupos paramilitares no leste do Congo impuserem um "tributo" às entregas de cerveja? Se essas organizações faturam US$ 1 milhão ao ano com isso, como o livro afirma, a empresa é cúmplice de sua violência?
Quando o livro foi lançado originalmente, em holandês, em 2015, a seção mais controversa lidava com o uso de mulheres jovens pela Heineken para promover cervejas.
O problema começou no Camboja, onde mulheres que não trabalhavam diretamente para a companhia eram contratadas para promover cerveja nos bares.
ONGs acusaram a Heineken de usar profissionais do sexo, indiretamente, e de expô-las a assédio e a contaminação por HIV. Na Nigéria, as mulheres que promoviam as vendas da companhia se queixavam de assédio sexual constante.
Outra das afirmações de van Beemen envolve Ruanda. Ele afirma que, quando o genocídio da minoria tutsi começou, em 1994, a Heineken continuou a produzir cerveja apesar de a matança estar acontecendo em um frenesi estimulado pelo consumo de álcool.
Um dos problemas do livro é que uma companhia ficará exposta a críticas tanto pelo que faz quanto pelo que não faz.
Se a Heineken se recusasse a investir na África invocando as dificuldades do mercado local, poderia ser acusada de covardia ou de preconceito, por se recusar a operar em um dos mercados de bens de consumo em mais rápido crescimento do planeta.
Mas, ao investir, se expõe ao tipo de acusação que van Beemen parece adorar fazer.
Um ex-empregado da empresa pergunta ao autor por que a Heineken deve ser criticada por enfrentar guerras, pobreza e doenças a fim de levar cerveja aos seus clientes. "Será que o prazer deve ficar reservado apenas aos ocidentais brancos e ricos?", questiona.
A conclusão de van Beemen, em resumo, é que grandes empresas em busca de lucros e mercados com regulamentação fraca não combinam. O que fazer quanto a isso talvez seja uma conversa que merece ser regada por uma cerveja.
Tradução de Paulo Migliacci
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