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China tenta domar inflação que pode ter impacto global

Custos em alta nas fábricas do país podem afetar a da economia do planeta

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Keith Bradsher
Xangai | The New York Times

Os preços estão em alta nos Estados Unidos e no restante do mundo, o que gera alertas cada vez mais graves quando a uma onda de inflação que poderia ameaçar a economia mundial, caso persista.

A China não está esperando para ver.

Pequim está agindo com rapidez para proteger as fábricas e locais de trabalho do país contra a alta de custos. Desencorajou as siderúrgicas e produtores de carvão de aumentar preços. Prometeu investigar aumentos indevidos de preços e acúmulos especulativos de estoques. E autorizou que a moeda do país flutue de um modo que não se via há anos, o que oferece às autoridades um recurso valioso e forte para adquirir fora do país cereais, carne, petróleo, minerais e outro produtos essenciais.

A alta dos preços na China, que é por grande vantagem o maior polo industrial e exportador do planeta, poderia influenciar o mundo inteiro. A agência oficial de estatísticas chinesa anunciou na manhã de quarta-feira que os preços cobrados pelas fábricas, produtores rurais e outros subiram em 9% em maio, ante o mesmo mês em2020, quando a pandemia ajudava a segurar os custos. Foi a maior alta desde setembro de 2008.

Pessoas caminham na Nanjing Pedestrian Road, área comercial, em Xangai, na China - Aly Song - 5.mai.21/Reuters

A Annabelle New York, importadora e distribuidora sediada em Manhattan que vende parcas acolchoadas e outras vestimentas de alto preço a lojas de departamentos e outros grupos de varejo, já aumentou seus preços em 10% neste trimestre. Mas os custos dos produtos que ela compra na China subiram em 20%, disse Bennett Model, presidente-executivo da empresa.

Os produtos químicos usados para produzir revestimentos sintéticos de casacos tornaram-se mais caros, com a alta mundial do petróleo. O material usado para acolchoar os agasalhos, do qual a China é a maior produtora mundial, encareceu. Já os custos de frete através do Pacífico triplicaram para alguns embarques, porque as companhias de carga marítima e aérea estão enfrentando dificuldades para satisfazer a demanda.

Apenas o medo de perder clientes impediu Model de repassar esses custos mais elevados às lojas americanas. Ele optou por aceitar margens de lucro mais baixas.

“Se eu quisesse realmente cobrir todos os aumentos, o preço seria proibitivo, no momento”, afirmou.

Está longe de claro que o surto atual de inflação mundial vá durar. Muitos economistas acreditam que os aumentos de preços se moderarão assim que as companhias eliminarem os gargalos de suprimento causados por fechamentos de fábricas e outras medidas adotadas durante a pandemia do coronavírus.

Mas a China tem motivos claros para temer a inflação. Seu crescimento econômico vertiginoso nas últimas décadas veio acompanhado periodicamente por altas nos preços que causaram ira em todo o país. Uma alta de preços contribuiu para as manifestações na Praça Tiananmen em 1989, em Pequim.

As autoridades há muito recorrem a controles informais de preços e a subsídios a fim e impedir que a alta de custos se faça sentir nos supermercados chineses e nas mesas de jantar das famílias do país.

Para alguns bens, os preços estão de fato subindo. Os fabricantes de papel aumentaram os preços de atacado de produtos como guardanapos e papel higiênico quatro vezes, neste trimestre. A soja usada para produzir tofu está subindo de preço.

Mas por enquanto, a indústria chinesa é que está sentindo os aumentos, e não os consumidores. O aumento do preço do minério de ferro australiano e do milho dos Estados Unidos responde por boa parte da alta.

O gabinete chinês anunciou subsídios para pequenas empresas, uma semana atrás, a fim de ajudá-las a arcar com a disparada dos custos das commodities. Novos limites foram impostos às operações de commodities para entrega futura, a fim de conter a especulação. Impostos de exportação foram aumentados sobre certas variedades de aço, a fim de manter mais metal no mercado da China.

Em uma reunião de gabinete em 19 de maio, o primeiro-ministro Li Keqiang ordenou que as autoridades “reprimam resolutamente o monopólio e o acúmulo especulativo de estoques, de acordo com nossas regras e regulamentos, e que intensifiquem a fiscalização do mercado”.

As medidas do governo têm a capacidade de desacelerar mas não de deter os aumentos de preços no atacado. Empresas que têm de arcar com alta de custo nas matérias-primas terminam por encontrar maneiras de aumentar preços, ou suspendem a produção.

Os produtores de papéis, encurralados entre a disparada nos custos da celulose e uma variedade de pressões para que não aumentem os preços de seus produtos, preferiram paralisar as atividades de algumas de suas fábricas, invocando a necessidade de manutenção, neste trimestre.

Até agora, os aumentos de preços não parecem estar chegando aos consumidores chineses. O índice de preços ao consumidor da China subiu em apenas 1,3% em maio, ante o mesmo mês em 2020.

Um motivo para isso é que a economia doméstica chinesa ainda não se recuperou plenamente da pandemia. O consumo morno significa menos estímulo à alta de preços de produtos como costeletas de porco, que caíram um pouco de preço recentemente, e mesmo roupas de baixo masculinas, cujos preços não mudaram.

Os comerciantes em um mercado coberto em Xangai declararam, em uma tarde recente, que não viam sinal de alta nos preços dos alimentos. Os preços dos ovos e da carne bovina, por exemplo, pouco mudaram.

“O custo de vida não mudou muito, o preço das verduras é sempre” mais ou menos o mesmo, disse Yang Yuxia, que vende ovos de galinha, pombo e outras aves em uma barraca do mercado desde 1998.

Mas os comerciantes de alimentos que não fazem parte da dieta básica já estão acompanhando com cautela os aumentos de preços de seus fornecedores.

“É claro que me preocupo com uma alta de preços —se os preços subirem, terei menos fregueses”, disse Gao Hong, que vende enguias de água doce e camarões em uma loja localizada diante do mercado.

Os consumidores chineses também são protegidos pelo grande número de fábricas que produzem artigos essenciais, como roupas e produtos domésticos. O excesso de capacidade garante que os lojistas tenham muitos fabricantes concorrentes entre os quais escolher. Isso dificulta para os fabricantes repassar aumentos de custos aos consumidores.

“Ao longo da cadeia de suprimento, quem tem menos poder de negociação arca com mais custos”, disse Wang Dan, economista chefe do Hang Seng Bank China.

Na China, as empresas que ocupam as primeiras etapas da cadeia de suprimento tendem a ter menos poder de negociação que o varejo e os consumidores.

A alta de preços na China pode se espalhar ao exterior, porém. Os líderes do país estão tentando tratar da ameaça de inflação em parte ao permitir que a moeda suba de valor.

O yuan está perto de sua cotação mais alta diante dólar americano desde a metade de 2018. Um dólar agora compra 6,4 yuan, ante 7,1 yuan um ano atrás.

O yuan subiu em 2,2% diante do dólar desde o começo do ano, o que representa uma valorização modesta. Mas a China gasta muito dinheiro em mercadorias cujos preços são denominados em dólares —US$ 176,2 bilhões (R$ 892 bilhões) apenas na importação de petróleo cru no ano passado, por exemplo, e outros US$ 50,8 bilhões (R$ 257,1) na importação de cereais. E os centavos de alta logo se acumulam.

A moeda da China se tornou há muito tempo uma questão política contenciosa. Legisladores e membros do governo americanos acusam Pequim há anos de manter a moeda chinesa artificialmente baixa, para oferecer aos exportadores do país uma vantagem competitiva nos mercados estrangeiros.

Mas agora as autoridades chinesas simplesmente decidiram não agir e permitir que as forças mundiais elevem a cotação de sua moeda. Porque os Estados Unidos realizaram forte captação e gastos pesados nos últimos meses para combater os efeitos econômicos da pandemia, o dólar começou a cair diante de muitas moedas, entre as quais o yuan mas também o euro.

“A valorização do yuan é propelida pelo bom desempenho da economia chinesa”, disse Gary Liu, economista independente em Xangai. “Os Estados Unidos agora estão expandindo sua base monetária, e com isso o dólar perde força”.

Uma moeda forte tem seu lado negativo, porém, e as autoridades chinesas parecem estar interferindo para evitar mais valorização.

A moeda mais forte torna os produtos chineses menos atraentes em outros mercados. Por enquanto, o mundo parece satisfeito em continuar comprando produtos chineses, de qualquer modo. Mas o banco central chinês ainda assim alertou aos operadores de câmbio, em 27 de maio, que não pensassem que valorização adicional era uma aposta segura.

Enquanto isso, a força do yuan pode elevar os preços dos produtos chineses nos Estados Unidos, o que agrava as pressões de preço lá, ainda que em geral de modo moderado.

O índice do Serviço de Estatísticas do Trabalho americano sobre os preços médios de produtos importados da China mostra queda de preços de cerca de 2% da metade de 2018 até o início da pandemia, e depois disso eles se nivelaram. Posteriormente, subiram em 2%, do começo de novembro para cá.

“A China está exportando inflação?”, perguntou Louis Kuijs, especialista em questões chinesas na consultoria Oxford Economics. “Em termos de yuan, isso não fica tão evidente. Mas em termos do dólar americano, o efeito começa a ser perceptível”.

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