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Mudança de prazo para meta de inflação não assustaria mercado, dizem analistas

Adoção de horizonte móvel daria ao BC mais tempo para colocar a inflação na meta

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Fabrício de Castro
Reuters

A possibilidade de o Banco Central perseguir uma meta de inflação desvinculada do ano-calendário, ideia defendida explicitamente pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na semana passada, é vista com naturalidade pelo mercado e tende a gerar pouco impacto nos preços dos ativos se adotada, avaliaram profissionais ouvidos pela Reuters.

Enquanto uma elevação da meta geraria o risco de aumento nas expectativas para a inflação, dificultando a queda dos juros, o entendimento predominante é de que a adoção de um horizonte móvel para o seu cumprimento apenas oficializaria regra já adotada pelo BC na prática e já vigente nas grandes economias.

Em junho, o Conselho Monetário Nacional (CMN) vai definir a meta inflacionária de 2026 e a expectativa é de que possa aproveitar para aprovar também a alteração do prazo. A mudança daria ao BC mais tempo para colocar a inflação na meta, sem precisar necessariamente bater no alvo a cada um dos anos. Mais do que alongar o prazo, o colegiado transformaria a busca pela meta em um objetivo permanente.

Fachada do Banco Central, em Brasília - Gabriela Biló - 14.abr.2023/Folhapress

"É uma evolução natural para algo que já é adotado em outros países. Não enfraquece o sistema de metas e não teria por que gerar mal-estar no mercado. Além disso, a mudança não seria uma completa novidade para nós, porque o atual BC já vem agindo em linha com esta orientação", comentou Mauro Schneider, economista da MCM Consultores.

Em agosto do ano passado, o BC comandado por Roberto Campos Neto passou a dar ênfase em suas comunicações às projeções de inflação para 18 meses à frente e a citar a convergência da inflação à meta no horizonte relevante da política monetária —e não necessariamente no ano-calendário.

Alvo de duras críticas do governo Lula, que pressiona por uma redução da taxa de juros, Campos Neto ressaltou, no fim de março, que o BC já vinha "suavizando" o processo de controle de preços via Selic, atualmente em 13,75% ao ano. Segundo ele, para que a meta do ano corrente (3,25%) fosse cumprida, a taxa precisaria estar em 26,5% ao ano.

"Qualquer um de nós sabe que o BC estende o período de convergência 18 meses à frente. Na verdade, a instituição já olha para convergir a inflação à meta em algum momento de 2025. Me parece que ele não está perseguindo 2024, mas sim 2025", disse o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor de Assuntos Internacionais do BC.

Para Schwartsman, a possível mudança do prazo para o atingimento da meta não altera a dinâmica atual. "O horizonte vai ser mais ou menos onde a política monetária é mais operacional: nem curto demais, nem longo demais. Dezoito meses parece razoável."

Schneider, da MCM Consultores, nota que a mudança formal do horizonte para cumprimento da meta teria, a princípio, pouco efeito direto sobre a política monetária, mas pode abrir espaço para a queda da Selic se a mudança for entendida como o fim da possibilidade de ampliação do valor numérico das metas.

Em fevereiro, o encontro do CMN gerou apreensão no mercado financeiro em meio a especulações de que o colegiado —formado pelo presidente do BC, pelo ministro da Fazenda e pela ministra do Planejamento, Simone Tebet— poderia elevar as metas de inflação diante das pressões do governo por um corte dos juros.

Atualmente, o BC persegue a meta de inflação de 3,25% para 2023 e de 3,00% para 2024 e 2025, em todos os casos com uma margem de tolerância de 1,5 ponto percentual.

A ideia de alterar as metas foi deixada de lado no CMN de fevereiro, apesar de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva continuar a defendê-la, mas o estrago nos mercados já estava feito, com o dólar chegando a 5,2736 reais e a taxa do contrato futuro para janeiro de 2027 atingindo 13,129% no auge dos temores do mercado naquele mês.

Na última segunda-feira, o dólar já era cotado a R$ 5,015, enquanto o DI para janeiro de 2027 marcava 11,56%. Parte dessa descompressão se deu porque, aparentemente, o mercado entendeu que diminuíram as chances de o governo mudar a regra do jogo no meio do caminho, mexendo no valor das metas.

Mas Haddad defendeu na última sexta-feira que uma "meta contínua é muito melhor que a meta-calendário", alimentando a percepção de que o CMN possa promover esse ajuste. A expectativa foi reforçada com o anúncio, na segunda-feira, da indicação do secretário-executivo de Haddad, Gabriel Galípolo, para a diretoria de Política Monetária do BC.

Ainda que não esteja claro quando Galípolo poderá assumir —seu nome ainda precisa passar pela aprovação do Senado—, a nomeação do economista, que tem linha direta com o presidente Lula e é cotado para ser alçado à presidência do BC no futuro, tende a reforçar ventos de mudança na autarquia, que tem votado consensualmente nos últimos meses pela manutenção dos juros.

Na ata da mais recente reunião do Copom, divulgada nesta terça-feira, o BC manteve avaliação feita em março de que a desancoragem das expectativas de inflação reflete em parte o questionamento sobre uma possível alteração das metas.

ESTRESSE NOS MERCADOS

Gustavo Menezes, gestor da área de macro da AZ Quest, destaca que mudar a meta ou ampliar seu intervalo de tolerância seria pior para as expectativas do que formalizar um prazo maior para atingir o objetivo.

"A instituição já trabalha com um horizonte móvel, entre 12 e 18 meses. Se o prazo para cumprir a meta ficar em 18 meses, isso já significaria uma tolerância maior. Como o prazo se tornaria um período móvel, seria apenas preciso formalizar como será o procedimento de avaliação do cumprimento da meta", avaliou Menezes.

Alguns profissionais avaliam, no entanto, que a simples mudança na regra do jogo, ainda que o BC atual não considere o ano-calendário na sua política monetária, poderá estressar novamente os mercados.

"O problema não é fazer isso. O problema é fazer agora, quando as expectativas de inflação estão desancoradas", pontuou Rafael Pacheco, economista da Guide Investimentos.

Atualmente, a mediana das projeções do mercado, colhidas no relatório Focus, aponta inflação de 6,02% para 2023, 4,16% para 2024 e 4,00% para 2025 —todos os percentuais acima do centro das metas perseguidas pelo BC.

Para Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho, qualquer alteração na dinâmica atual pode prejudicar o controle da inflação.

"Qualquer mudança, seja de elevação da meta ou elevação do prazo, tende a ser visto como maior leniência do governo com a inflação, embora a elevação da meta tenda a ter impacto maior", disse. "Se o debate vier à tona, pode haver mais uma rodada de deterioração das expectativas."

Voz dissonante entre os analistas, o economista-chefe da Órama, Alexandre Espirito Santo, defende que o CMN mude a meta de inflação, e também o intervalo de tolerância e o prazo para cumpri-la.

"Minha opinião é de que se deveria fazer mudanças em conjunto: aumentar a meta de 3% para 4%, mas estreitar o intervalo de tolerância para 1 ponto percentual, além de sair do ano-calendário", afirmou.

Segundo ele, a ampliação da meta daria mais espaço para o BC reduzir a Selic, ao mesmo tempo em que o estreitamento do intervalo reduziria preocupações com uma possível tolerância à inflação.

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