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Giovana Madalosso

Botando o abusador no trombone

Um relato da violência sofrida e a necessidade de falar sobre isso

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Giovana Madalosso

Escritora, é autora de "Tudo Pode Ser Roubado" e "Suíte Tóquio" e colunista da plataforma de mudanças climáticas Fervura

Esses dias me dei conta de um fato estarrecedor: praticamente todas as mulheres com quem eu convivo intimamente sofreram algum tipo de violência, seja doméstica, abuso sexual, estupro ou pedofilia. A que sofreu violência doméstica sou eu.

Aconteceu repetidas vezes, há mais de uma década. Só hoje estou conseguindo escrever pela primeira vez a respeito. Quer dizer, até escrevi antes, mas em forma de ficção. No meu "Esmagar Plantas", que integra a coletânea "Contos de Axé", relato algumas situações que realmente vivi, como o dia em que fui pedir ajuda para um familiar.

Ao saber da agressão, desferiu: o que você fez para que ele perdesse a cabeça? Nem tive ânimo de responder (pobre agressor!), só catei meus hematomas e fui embora, rumo à delegacia da mulher. Lá a escrivã apontou para uma pilha de processos: "Todos esses estão na sua frente. Vai demorar pra gente fazer alguma coisa". E aproximando a cadeira de mim: "Posso te dar um conselho? Vai pra casa, reza bastante e perdoa ele".

Aprendi, apanhando, que o silêncio é a pior escolha. Calar é uma espécie de sinal que você dá para o abusador fazer de novo. E pode ter certeza: ele vai voltar, várias vezes, para morder seu quinhão de prazer com sabor de sadismo, até que seja constrangido, não pela vítima —essa ele não considera um sujeito, e sim um objeto—, mas pela luz flagra-covarde da sociedade e da Justiça.

Se eu, que gosto tanto de escrever, demorei anos para dividir um relato, imagine outras mulheres.
Quase toda família brasileira tem um abuso varrido para debaixo do tapete da sala de estar. Precisamos sacudir a lama dessa perversa tapeçaria patriarcal nos almoços de domingo, na vizinhança, nas redes sociais, na Justiça (hoje as delegacias da mulher prestam melhor atendimento e você ainda pode ligar para o 180) ou onde for.

Pôr para fora a dor que colocaram dentro da gente é um caminho para a cura. E um serviço pelas mulheres que virão depois.

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