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Mariana Cotta

A volta da Uber ao Supremo Tribunal Federal

Se o século 20 foi a 'era dos extremos', o 21 pode vir a ser a 'era sem extremos'

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Mariana Cotta

Pós-graduanda em direito penal pela Escola Paulista de Direito e em segurança pública e investigação criminal pela Escola Mineira de Direito

A Uber regressou ao Supremo Tribunal Federal (STF) para pleitear a suspensão de processos em outras instâncias do Judiciário que discutem a existência de vínculo empregatício entre motoristas e entregadores com as plataformas de transporte.

O pleito foi feito pelos advogados que representam a empresa no final de junho, em um recurso extraordinário que está sob a relatoria do ministro Edson Fachin. A Uber pleiteia que Fachin suspenda os demais processos envolvendo análise de vínculo de trabalho com aplicativos enquanto se aguarda o desfecho do caso principal na corte.

Motoristas protestam em Nova York contra aplicativos de transporte - AFP

A compreensão de que o indivíduo se converte em empreendedor, trabalhando por sua conta e risco e sem direitos trabalhistas —estes apontados como causadores de desemprego— foi flexibilizada, sob uma perspectiva autodenominada de liberal. E o tema chegou além-mar.

Meses após promulgarmos a nossa reforma trabalhista, a França promulgou a sua, para desregulamentar o mercado de trabalho. Ultrapassado o fordismo, em que o sistema de trabalho se tornou metódico e especializado, chegamos à fase da uberização, em que o trabalhador se converteu em empreendedor, com o direito de se associar a algum aplicativo e dirigir seu veículo por 10 ou 16 horas, sem férias ou outras garantias.

A normatização legal cede espaço a negociações entre as partes, já que a ideia de Estado tem se tornado demodê. São os novos tempos.

Como o mercado de trabalho tem se tornado cada vez mais global, a flexibilização de um impõe a flexibilização dos demais. Já que as empresas concorrem entre si sem limites territoriais, a ausência de normas trabalhistas impõe concorrência desequilibrada a quem ainda as possui.

A própria Organização Internacional do Trabalho já reconhece, no preâmbulo de sua constituição, esse fenômeno: "A falha de qualquer nação em adotar um sistema de trabalho verdadeiramente humano dificulta os esforços de outras nações que desejam melhorar o destino dos trabalhadores em seus próprios países".

Se o século 20, com suas crises e guerras, foi alcunhado de a "era dos extremos" por Eric Hobsbawm, caminhamos para definir o século 21 como a "era sem extremos", em que o terceiro mundo passou a ser modelo para o primeiro, igualando-o em nossa miséria.

Em 2022, o jornal The Guardian publicou que um ex-funcionário da Uber revelou ter participado de um sistema de lobby voltado à erosão de direitos trabalhistas e manipulação da opinião pública em diversos países. A investigação, levada a cabo pelo jornal britânico conjuntamente ao Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), analisou mais de 124 mil documentos, culminando com as declarações de Mark MacGann, que admitiu que "a abordagem da empresa nesses lugares era essencialmente quebrar a lei, mostrar o quão incrível era o serviço da Uber e depois mudar a lei. Meu trabalho era construir relações com o mais alto nível do governo e negociar".

Diversos países foram objeto desse lobby. Há documentos apontando a relação com funcionários do governo Barack Obama, com o Partido Conservador do Reino Unido, com a Comissão Europeia, além de um diálogo com o então ministro e atual presidente francês, Emmanuel Macron.

Coincidência ou não, à época da atuação de MacGann diversas reformas trabalhistas eclodiram mundo afora.

A lei 13.429/2017, conhecida por Lei da Terceirização, ao lado de atualizações normativas importantes, inaugurou, em terra brasilis, essa nova compreensão, em que o indivíduo se converte em empreendedor, estando por sua conta e risco.

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