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Paulo Sérgio Pinheiro

Severo Gomes, 100

Ex-ministro era o ímã que unia diversidade de opiniões e trajetórias

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Paulo Sérgio Pinheiro

Professor titular de ciência política da USP (aposentado), foi coordenador da Comissão Nacional da Verdade (2013) e ministro da Secretaria de Estado de Direitos Humanos (2001-02, governo FHC)

Cada década que passa desde seu desaparecimento, e de sua esposa, Anna Maria Henriqueta Marsiaj, as qualidades de Severo Gomes (1924-1992) no contraste com o presente se destacam ainda mais.

Logo depois de sua morte —no trágico acidente de helicóptero que vitimou também Ulysses Guimarães e sua esposa, dona Mora, em outubro de 1992—, Otto Lara Rezende escrevera nesta Folha sobre a diversidade dos focos de Severo: "Tinha esse dom o Severo: nele, os extremos se tocavam (...). Mário de Andrade, Oswald. Os dois Bastide. As Arcadas. A Bucha. A política estudantil (...). Do capim-gordura ao Dante. Nada ignora. Julga um zebu, uma pinga e o interesse nacional". Severo era o ímã que unia diversidade de opiniões e trajetórias.

O senador Severo Gomes (1924-1992) com yanomamis em 1986 - Divulgação

Ministro da Indústria e Comércio no governo Geisel, financia o Projeto Imagens e História da Industrialização em São Paulo, na Unicamp. O presidente queria entender por que aquele ministério apoiava tal pesquisa. "Mas general, como estudar a industrialização sem estudar os operários?" E lá se foi o projeto aprovado. Que consolidou ali o Arquivo de História Social Edgard Leuenroth, que comemora seus 50 anos. Dali saiu "Libertários", filme de Lauro Escorel, cuja primeira projeção foi no apartamento do ministro.

No dia em 1995 que Fernando Henrique Cardoso estabelecia a comissão especial sobre os mortos e desaparecidos políticos e as reparações de crimes perpetrados pela ditadura, Nelson Jobim, ministro da Justiça, celebrava o papel de Severo Gomes na construção do artigo 5 dos direitos e deveres individuais e coletivos da Constituição de 1988.

Severo foi um dos mais ativos artífices da democratização da democracia, marcada especialmente pela defesa dos direitos dos povos indígenas. Sua crítica do esbulho dos direitos desses povos ressoa no presente: "As leis mais antigas do Brasil, e as leis de hoje também, dizem que as terras são dos índios e os brancos não podem entrar nelas nem ficar donos dessas terras. No entanto, essas leis estão sendo desobedecidas. Os juízes julgam de acordo com os interesses dos fazendeiros ou dos garimpeiros". O verdadeiro memorial de Severo é o Parque Yanomami, criado por lei de sua iniciativa quando senador.

O senador Severo Gomes brinca com binóculo durante corrida de cavalo no GP de São Paulo, no Jóquei Clube de São Paulo, em 1985 - Renata Falzoni/Folhapress - Folhapress

Severo sempre se inquietou com a situação cruel das instituições fechadas e prisões no Brasil, causa desprezada pela maioria dos políticos. Em 1982, convida companheiros de diferentes conexões —Antonio Candido, seu antigo mestre, Fernando Millan, Hélio Bicudo, José Gregori e outros— para visitar o manicômio de Franco da Rocha (SP), onde pacientes foram massacrados pela Polícia Militar. Viria a ser a Comissão Teotônio Vilela, que sobreviveu 30 anos.

Era um entusiasta do diálogo Norte-Sul, preservada a capacidade autônoma do Brasil na comunidade internacional. O lugar do Brasil, dizia, é junto dos "países baleias", invocando seu amigo Ignacy Sachs, como Índia e China.

Severo Gomes sempre defendia a prevalência do direito internacional nas relações políticas e econômicas entre as nações, nos conflitos e na paz. Neste momento, as decisões dos órgãos multilaterais são sistematicamente desrespeitadas. Para lutar contra esse retrocesso, que falta o Severo faz neste dia em que completaria 100 anos.

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